STF - Plenário

ADI 6.476-DF

Ação Direta de Inconstitucionalidade

Relator: Luís Roberto Barroso

Julgamento: 03/09/2021

Publicação: 10/09/2021

Você não completou esse conteúdo
Marcar como completo
Favoritar
Imprimir em PDF

STF - Plenário

ADI 6.476-DF

Tese Jurídica Simplificada

Primeira Tese

Os candidatos com deficiência têm direito à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos.

Segunda Tese

A aplicação dos mesmos critérios para pessoas com e sem deficiência em provas físicas depende da demonstração de sua necessidade para o exercício do cargo.

Vídeos

Nossos Comentários

O decreto 9.546/2018 retirou a obrigatoriedade de adaptações no teste físico para os candidatos com deficiência (PCD) por parte dos editais de concursos públicos federais, conforme previsão do art. 3º:

Redação anterior  Redação atual

Art. 3º Para os fins do disposto neste Decreto, os editais dos concursos públicos e dos processos seletivos de que trata a Lei nº 8.745, de 1993 , indicarão:

III - a previsão de adaptação das provas escritas, físicas e práticas, do curso de formação, se houver, e do estágio probatório ou do período de experiência, estipuladas as condições de realização de cada evento e respeitados os impedimentos ou as limitações do candidato com deficiência;

IV - a exigência de apresentação pelo candidato com deficiência, no ato da inscrição, de comprovação da condição de deficiência nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 , sem prejuízo da adoção de critérios adicionais previstos em edital; e

V - a sistemática de convocação dos candidatos classificados, respeitado o disposto nos § 1º e § 2º do art. 1º.

Art. 3º Para os fins do disposto neste Decreto, os editais dos concursos públicos e dos processos seletivos de que trata a Lei nº 8.745, de 1993 , indicarão:

III - a previsão de adaptação das provas escritas e práticas, inclusive durante o curso de formação, se houver, e do estágio probatório ou do período de experiência, estipuladas as condições de realização de cada evento e respeitados os impedimentos ou as limitações do candidato com deficiência;

IV - a exigência de apresentação pelo candidato com deficiência, no ato da inscrição, de comprovação da condição de deficiência nos termos do disposto no § 1º do art. 2º da Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015 , sem prejuízo da adoção de critérios adicionais previstos em edital;

V - a sistemática de convocação dos candidatos classificados, respeitado o disposto nos § 1º e § 2º do art. 1º; e

VI - a previsão da possibilidade de uso, nas provas físicas, de tecnologias assistivas que o candidato com deficiência já utilize, sem a necessidade de adaptações adicionais, inclusive durante o curso de formação, se houver, e no estágio probatório ou no período de experiência.

Além disso, o art. 4º, §4º do mesmo diploma dispõe:

Art. 4º.

§ 4º Os critérios de aprovação nas provas físicas para os candidatos com deficiência, inclusive durante o curso de formação, se houver, e no estágio probatório ou no período de experiência, poderão ser os mesmos critérios aplicados aos demais candidatos, conforme previsto no edital.

No entendimento do STF, tais disposições violam o bloco de constitucionalidade composto pela CF e pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência - CDPD (Decreto Legislativo 186/2008), a qual foi incorporada à ordem jurídica brasileira com o status de emenda constitucional, o que a torna parâmetro para o controle de constitucionalidade.

Um instituto importante previsto no CDPD é o da adaptação razoável, que designa modificações e ajustes necessários para a inclusão de pessoas com deficiência que não importem em ônus desproporcional ou indevido (art. 2º). 

O artigo 27 do mesmo diploma assegura “o direito das pessoas com deficiência ao trabalho, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. Esse direito abrange o direito à oportunidade de se manter com um trabalho de sua livre escolha ou aceitação no mercado laboral, em ambiente de trabalho que seja aberto, inclusivo e acessível a pessoas com deficiência”.

Já o Estatuto da Pessoa com Deficiência prevê que as políticas públicas devem promover e garantir condições de acesso das pessoas com deficiência no mercado de trabalho (art. 35), punindo como crime impedir o "acesso de alguém a qualquer cargo ou emprego público em razão de sua deficiência" (art. 98).

Quanto ao art. 3º, inciso VI, do decreto em questão, a única interpretação constitucionalmente adequada do dispositivo é a de que o candidato com deficiência possui uma faculdade. Assim, por exemplo, um candidato surdo que usa aparelho auditivo e entende não ser necessário nenhum tipo de adaptação adicional pode, ele próprio, dispensar, por exemplo, a presença de um intérprete de LIBRAS.

Não se pretende admitir a pessoa que não esteja apta ao exercício da função pública, mas somente eliminar toda a barreira de acesso a cargos públicos às pessoas com deficiência que são capazes para tal, desconsiderando-se as adaptações que não sejam razoáveis ou proporcionais.

No entanto, a expressão "sem a necessidade de adaptação adicional" acaba por violar o referido bloco de constitucionalidade. Assim, prevalece a interpretação segundo a qual o candidato com deficiência possui a faculdade de fazer uso de suas próprias tecnologias assistivas e de adaptações adicionais, se assim preferir. 

Quanto ao art. 4º, §4º. a interpretação mais adequada é aquela em que a pessoa com deficiência só poderá ser submetida aos mesmos critérios de avaliação física em concursos públicos quando essa exigência for indispensável ao exercício das funções de um cargo público específico, não se aplicando indiscriminadamente a todo e qualquer processo seletivo.

Por exemplo, em editais em que há vagas para candidatos com deficiência ao cargo de perito na
área de ciências contábeis, não é razoável negar a adaptação de provas práticas que envolvem testes de flexão em barra ou abdominais, se tais aptidões não são indispensáveis para o regular exercício da função de perito contábil, por exemplo.

Desse modo, conclui-se que:

  • os candidatos com deficiência têm direito à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos;
  • a aplicação dos mesmos critérios para pessoas com e sem deficiência em provas físicas depende da demonstração de sua necessidade para o exercício do cargo.

Tese Jurídica Oficial

Primeira Tese

É inconstitucional a interpretação que exclui o direito de candidatos com deficiência à adaptação razoável em provas físicas de concursos públicos.

Segunda Tese

É inconstitucional a submissão genérica de candidatos com e sem deficiência aos mesmos critérios em provas físicas, sem a demonstração da sua necessidade para o exercício da função pública.

Resumo Oficial

A exclusão da previsão de adaptação das provas físicas para candidatos com deficiência viola o bloco de constitucionalidade composto pela Constituição Federal (CF) e pela Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência – CDPD (Decreto Legislativo 186/2008), incorporada à ordem jurídica brasileira com o “status” de Emenda Constitucional (EC), na forma do art. 5º, § 3º, da CF.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade, para fixar interpretação conforme a Constituição, no sentido de que: (i) o art. 3º, VI, do Decreto 9.508/2018 estabelece uma faculdade em favor do candidato com deficiência, que pode fazer uso de suas próprias tecnologias assistivas e de adaptações adicionais, se assim preferir; e (ii) o art. 4º, § 4º, do Decreto 9.508/2018 — que estabelece que os critérios de aprovação nas provas físicas poderão ser os mesmos para candidatos com e sem deficiência — somente é aplicável às hipóteses em que essa exigência for indispensável ao exercício das funções próprias de um cargo público específico.

Encontrou um erro?

Onde Aparece?