STJ - Primeira Seção
HC 666.247-DF
Habeas Corpus
Relator: Sérgio Kukina
Julgamento: 10/11/2021
Publicação: 18/11/2021
STJ - Primeira Seção
HC 666.247-DF
Tese Jurídica Simplificada
Não é possível a expulsão de estrangeiro do território nacional quando este tiver filhos brasileiros sob sua dependência socioafetiva.
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Tese Jurídica Oficial
É inviável a expulsão de estrangeiro visitante ou migrante do território nacional quando comprovado tratar-se de pai de criança brasileira que se encontre sob sua dependência socioafetiva.
Resumo Oficial
No julgamento do RE 608.898, com repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal firmou-se a tese no sentido de ser irrelevante a data da concepção da prole brasileira como fator exclusivo de impedimento à expulsão, desde que demonstrado existir dependência econômica e convivência socioafetiva entre o estrangeiro e sua prole.
Há de se ponderar, entretanto, que a presença de um único desses requisitos já se mostra suficiente para o reconhecimento do direito do estrangeiro a permanecer em território nacional, haja vista que a lei expressamente os elenca de forma autônoma, ao utilizar a expressão "dependência econômica ou socioafetiva".
A propósito, nesse sentido já se manifestou a Primeira Turma que "A dependência socioafetiva também constitui fator autônomo e suficiente apto a impedir a expulsão de estrangeiros que tenham filhos brasileiros". (RHC 123.891-AgR, Rel. Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 4/5/2021).
De se ver, portanto, que o art. 55, II, "a", da Lei de Migração expressamente vedou o processo expulsório na hipótese de o estrangeiro ter filho brasileiro "sob sua guarda ou dependência econômica ou socioafetiva".
No caso, no que tange à dependência econômica e à convivência socioafetiva, a única prova trazida limita-se a uma declaração fornecida pela genitora da criança, pela qual dá conta de que o pai, em vias de ser expulso do Brasil, sempre assistiu, afetiva e materialmente, o infante.
Referida declaração não autoriza a compreensão de que o requisito da dependência econômica esteja preenchido, ante a inexistência de qualquer outro elemento probatório mínimo capaz de efetivamente demonstrar a forma como o paciente teria se desincumbido de assistir materialmente seu filho, mormente considerando-se seu encarceramento há mais de 3 (três) anos.
Entretanto, sendo incontroverso que o paciente se encontra encarcerado desde 28/8/2018, quando seu filho - nascido em 6/4/2016 - contava com pouco mais de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de vida, exigir do paciente a produção de outras provas acerca do vínculo socioafetivo entre ele e seu filho - que, como se extrai do próprio termo em tela, é de natureza afetiva, sentimental, portanto - seria praticamente impor-lhe a produção de uma prova impossível.
Nessa linha a declaração fornecida pela mãe no sentido de que remanesce viva a relação socioafetiva entre pai e filho reveste-se da necessária juridicidade para comprovação de tal requisito legal.
Ademais disso, a permanência do paciente em território nacional é medida que prestigia o texto constitucional de 1988, no passo em que confere absoluta prioridade no atendimento dos interesses fundamentais da criança e do adolescente (art. 227 da CF), dentre os quais se destaca o direito à "convivência familiar", tudo isso devidamente regulamentado no âmbito do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/1990) e, portanto, em conformidade com a universal doutrina da proteção integral da infância e da juventude (art. 1º do ECA).
Expulsão
Existem algumas situações em que o estrangeiro pode ser coagido a deixar o território do Estado que o recebe. No Brasil, isso pode ocorrer por deportação, expulsão, extradição e repartição.
A expulsão é uma forma de exclusão do estrangeiro por iniciativa das autoridades locais, sendo que seus critérios são mais rígidos, resultando, inclusive na proibição de retorno do estrangeiro ao país por tempo determinado (esse tempo não poderá exceder o dobro da pena aplicada ao expulso).
Para ser expulso, o indivíduo precisa ser condenado, em sentença transitada em julgado, pela prática de crime de genocídio, contra humanidade, de guerra ou de agressão nos termos definidos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional, ou por crime comum doloso passível de pena privativa de liberdade, consideradas a gravidade e possibilidade de ressocialização em território nacional, do estrangeiro.
A Lei de Migração prevê, nesses casos, procedimento administrativo e observância do contraditório, bem como direito de o estrangeiro deixar, voluntariamente o país, com assessoria dada pela Defensoria Pública da União em todo processo de expulsão.
Caso e Julgamento
Um homem foi preso por infração ao art. 33 da Lei da Drogas, tendo sido condenado provisoriamente a pena de 5 anos de reclusão em regime inicial fechado. Diante disso, o Departamento de Estrangeiros do Ministério da Justiça expediu decreto expulsória em face do réu, o qual foi anexado aos autos da execução criminal. Assim, o juízo da execução criminal liberou o sentenciado para fins de expulsão independente do cumprimento da pena.
Ocorre que o homem possui filho brasileiro, fruto de uma união estável com uma brasileira. Segundo documentação dos autos, o indivíduo sempre esteve presente na vida do filho e de sua companheira, ajudando-os financeiramente com o dinheiro que consegue trabalhando dentro da unidade prisional que se encontra.
Nesse caso, pode-se determinar a expulsão?
Segundo o STJ, não é possível a expulsão de estrangeiro visitante ou migrante do território nacional quando este tiver filhos brasileiros sob sua dependência socioafetiva.
De acordo com o art. 55 da Lei 13.445/2017 (Lei de Migração):
O STF já fixou entendimento no sentido de que o estrangeiro não será expulso desde que demonstre a existência de dependência econômica e convivência socioafetiva entre ele e seus filhos, não importando quando estes foram concebidos.
A presença de um único desses requisitos já é suficiente para o reconhecimento do direito do estrangeiro de permanecer em território nacional, considerando que a lei expressamente os elenca de forma autônoma, ao utilizar a expressão "dependência econômica ou socioafetiva".
A Primeira Turma já se manifestou nesse sentido ao afirmar que "a dependência socioafetiva também constitui fator autônomo e suficiente apto a impedir a expulsão de estrangeiros que tenham filhos brasileiros".
No caso concreto, a única prova quanto à dependência econômica e à convivência socioafetiva se limita a uma declaração fornecida pela mãe da criança, a qual não é suficiente para preencher o requisito da dependência econômica, por não haver qualquer outro elemento probatório mínimo capaz de efetivamente demonstrar a forma como o pai tem assistido materialmente seu filho, principalmente considerando que já está preso há mais de 3 anos.
No entanto, considerando que o pai está encarcerado desde 2018, quando seu filho contava com pouco mais de 2 anos de vida, exigir a produção de outras provas acerca do vínculo socioafetivo entre ele e seu filho seria praticamente impor-lhe a produção de uma prova impossível, pois tal vínculo é de natureza afetiva, sentimental.
Por isso, a declaração da mãe confirmando a existência de relação socioafetiva entre e pai e filho é suficiente para comprovar tal requisito legal.
Além disso, a permanência do indivíduo em território nacional está em conformidade com os preceitos constitucionais, na medida em que dá absoluta prioridade no atendimento dos interesses fundamentais da criança e do adolescente (art. 227 da CF), dentre os quais se destaca o direito à "convivência familiar", tudo isso regulamentado no ECA (lei 8.069/90), e, portanto, em harmonia com a doutrina da proteção integral da infância e da juventude (art. 1º ECA).