STF - Plenário

ADI 3.433-PA

Ação Direta de Inconstitucionalidade

Relator: Dias Toffoli

Julgamento: 01/10/2021

Publicação: 11/10/2021

STF - Plenário

ADI 3.433-PA

Tese Jurídica Simplificada

As varas especializadas em matéria agrária poderão julgar outras matérias que envolvem os conflitos agrários, podendo ser de natureza cível ou penal.

Vídeos

Nossos Comentários

Contexto

Em 2005, o Procurador-Geral da República ajuizou a ADI em questão contra dispositivos da Lei Complementar nº 14/93 do estado do Pará que tratam sobre a criação e a competência das varas privativas na área de direito agrário, minerário e ambiental no estado:

Art. 3º – Aos juízes agrários, minerários e ambientais, além da competência geral, para os juízes de Direito, ressalvada a privativa da Justiça Federal, compete processar e julgar as causas relativas: (…)

e) aos delitos cuja motivação for predominantemente agrária, minerária, fundiária e ambiental.

§ 1º – Também competirão aos juízes, a que se refere este Artigo, as matérias que sejam de competência da Justiça Federal, não estando a mesma instalada nas respectivas áreas de jurisdição, nos termos do Artigo 15 da Lei Federal nº 5.010 de 30 de maio de 1966 ou de qualquer outra lei permissiva, conforme o Artigo 109, § 3º da Constituição Federal.

§ 2º – Cessa a competência dos juízes agrários para processarem e julgarem as matérias elencadas neste Artigo, quando, nas regiões agrárias ou comarcas onde estiverem lotados, forem instaladas seções judiciárias federais.

Argumentou-se violação ao artigo 126 da CF, segundo o qual:

 Art. 126. Para dirimir conflitos fundiários, o Tribunal de Justiça proporá a criação de varas especializadas, com competência exclusiva para questões agrárias. 

Seria, então, inconstitucional atribuir aos juízes agrários a competência geral dada aos juízes de direito (art; 3º, caput), e a competência para julgar delitos (art. 3º, "e") e matérias ligadas à Justiça Federal (art. 3º, §§1º e 2º).

Julgamento

Para o STF, a interpretação correta a ser dada ao art. 126 da CF é a de que essas varas especializadas em matéria agrária não possuem, necessariamente, competência restrita apenas à matéria de sua especialização.

Isso porque o intuito constitucional não é que varas especializadas em direito agrário julguem somente essa matéria (e nenhuma outra mais). Em muitos casos é até conveniente que o conflito agrário seja compreendido em sua complexidade, o que implica o exame de outros aspectos envolvidos, como são os de natureza ambiental e minerária.

Segundo dispõe o art. 125, §1º, da CF, a lei de organização judiciária, que é de iniciativa do respectivo tribunal de justiça, trata sobre a especialização das varas em razão da máteria, tornando mais eficiente a prestação do serviço jurisdicional na esfera do ente federativo.

Nesse sentido, também não ofende a CF atribuir aos juízes agrários, ambientais e minerários a competência para julgar os delitos cometidos em razão de motivação predominantemente agrária, minerária, fundiária e ambiental.

O art. 126 da CF adotou as expressões genéricas "conflitos fundiários" e "questões agrárias", não restringindo a competência das varas somente a questões de natureza cível.

Em razão da complexidade dos conflitos agrários, a lei de organização judiciária está autorizada a criar varas especializadas, com competência definida em lei, para resolver conflitos de natureza tanto civil quanto penal.

Por fim, quanto aos dispositivos da lei paraense que atribuem a juizes estaduais a competência para julgar matérias de competência da justiça federal (art. 3º, §§1º e 2º), o STF entendeu pela sua inconstitucionalidade, por tratar-se de atribuição do Congresso Nacional a edição de lei que autorize que causas de competência da justiça federal também possam ser julgadas pela justiça estadual (art. 109, §3º, CF). Além disso, o tema já está regulamentado no art. 15 da Lei 5.010/1966.

Essencialmente, ficou decidido que:

As varas especializadas em matéria agrária poderão julgar outras matérias que envolvem os conflitos agrários, podendo ser de natureza cível ou penal. 

Tese Jurídica Oficial

Primeira Tese

As varas especializadas em matéria agrária [Constituição Federal (CF), art. 126] não possuem, necessariamente, competência restrita apenas à matéria de sua especialização.

Segunda Tese

Não ofende a CF a legislação estadual que atribui competência aos juízes agrários, ambientais e minerários para a apreciação de causas penais, cujos delitos tenham sido cometidos em razão de motivação predominantemente agrária, minerária, fundiária e ambiental.

Terceira Tese

É inconstitucional dispositivo de lei estadual que atribui competência a juízes estaduais para julgar matérias de competência da justiça federal.

Resumo Oficial

As varas especializadas em matéria agrária [Constituição Federal (CF), art. 126] não possuem, necessariamente, competência restrita apenas à matéria de sua especialização.

O intuito constitucional não é que varas especializadas em direito agrário julguem exclusivamente essa matéria (e nenhuma outra mais). Em muitos casos, aliás, faz-se de todo conveniente que o conflito agrário seja compreendido em sua complexidade inerente, o que implica o exame de outros aspectos envolvidos, como são os de natureza ambiental e minerária.

Nos termos do art. 125, § 1º, da CF, incumbe à lei de organização judiciária, cuja iniciativa pertence ao respectivo tribunal de justiça, especializar varas em razão da matéria, de modo a tornar mais eficiente a prestação do serviço jurisdicional na esfera do ente federativo.

Não ofende a CF a legislação estadual que atribui competência aos juízes agrários, ambientais e minerários para a apreciação de causas penais, cujos delitos tenham sido cometidos em razão de motivação predominantemente agrária, minerária, fundiária e ambiental.

A Constituição Federal (art. 126) adotou as expressões genéricas “conflitos fundiários” e “questões agrárias”, não restringindo a competência das varas especializadas a questões somente de natureza cível.

Assim, diante da complexidade dos conflitos agrários, a legislação de organização judiciária estadual pode criar varas especializadas, com competência definida em lei, para dirimir conflitos agrários tanto de natureza civil quanto penal.

É inconstitucional dispositivo de lei estadual que atribui competência a juízes estaduais para julgar matérias de competência da justiça federal.

É atribuição do Congresso Nacional a edição da lei que autorize que causas de competência da justiça federal também possam ser processadas e julgadas pela justiça estadual (CF, art. 109, § 3º). Sobre o tema, há regulamentação específica no âmbito infraconstitucional, consagrada no art. 15 da Lei 5.010/1966, recepcionada pela ordem constitucional vigente.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ação direta para declarar a inconstitucionalidade dos §§ 1º e 2º do art. 3º da Lei Complementar (LC) 14/1993 do Estado do Pará; incidentalmente, declarou também a inconstitucionalidade do § 2º do art. 167 da Constituição do Estado do Pará; e modulou os efeitos da declaração de inconstitucionalidade (Lei 9.868/1999, art. 27), para dar efeitos prospectivos à decisão, de modo que somente produza seus efeitos a partir de seis meses da data de encerramento do julgamento desta ação, tempo hábil para que a Justiça do Pará adote as medidas necessárias ao cumprimento da decisão, nos termos do voto do relator. O ministro Gilmar Mendes acompanhou o relator com ressalvas.

Encontrou um erro?

Onde Aparece?