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STJ - Primeira Seção

REsp 1.894.741-RS

Recurso Especial

Repetitivo

Relator: Mauro Campbell Marques

Julgamento: 27/04/2022

Publicação: 02/05/2022

STJ - Primeira Seção

REsp 1.894.741-RS

Tese Jurídica

Primeira Tese

É vedada a constituição de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS sobre os componentes do custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica (arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003).

Segunda Tese

O benefício instituído no art. 17, da Lei 11.033/2004, não se restringe somente às empresas que se encontram inseridas no regime específico de tributação denominado REPORTO.

Terceira Tese

O art. 17, da Lei 11.033/2004, diz respeito apenas à manutenção de créditos cuja constituição não foi vedada pela legislação em vigor, portanto não permite a constituição de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS sobre o custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica, já que vedada pelos arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003.

Quarta Tese

Apesar de não constituir créditos, a incidência monofásica da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não é incompatível com a técnica do creditamento, visto que se prende aos bens e não à pessoa jurídica que os comercializa que pode adquirir e revender conjuntamente bens sujeitos à não cumulatividade em incidência plurifásica, os quais podem lhe gerar créditos.

Quinta Tese

O art. 17, da Lei 11.033/2004, apenas autoriza que os créditos gerados na aquisição de bens sujeitos à não cumulatividade (incidência plurifásica) não sejam estornados (sejam mantidos) quando as respectivas vendas forem efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, não autorizando a constituição de créditos sobre o custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica.

Nossos Comentários

Reporto

O Regime Tributário para Incentivo à Modernização e à Ampliação da Estrutura Portuária (Reporto) foi regulamentado pela Instrução Normativa nº 1.370/2013 da Receita Federal.

Segundo o portal eletrônico do Governo Federal esse regime:

"[...] permite ao setor adquirir no mercado interno ou importar, com suspensão de tributos, máquinas, equipamentos, peças de reposição e outros bens para execução de serviços de carga, descarga, armazenagem e movimentação de mercadorias e produtos; sistemas suplementares de apoio operacional; proteção ambiental; sistemas de segurança e monitoramento de fluxo de pessoas, mercadorias, produtos, veículos e embarcações; dragagem; treinamento e formação de trabalhadores".

No caso de aquisições no mercado interno, ficam suspensos os pagamentos do IPI, da contribuição ao PIS/PASEP e da Cofins.

Para as importações ficam suspensos, somente a máquinas e equipamentos e outros bens que não possuam similar nacional, o IPI vinculado à importação, o PIS/PASEP-importação e o Cofins-importação.

A Lei do Reporto (Lei 11.033/2004) prevê em seu art. 17 o seguinte benefício:

Art. 17. As vendas efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não impedem a manutenção, pelo vendedor, dos créditos vinculados a essas operações.

O julgamento em questão trata sobre a extensão desse benefício, levando em conta os seguintes pontos:

(i) o benefício é aplicável somente às empresas inseridas no Reporto?

(ii) o art. 17 da Lei 11.033/2004 autoriza o cálculo de créditos dentro da sistemática da tributação monofásica do PIS e da Cofins?

(iii) o regime monofásico é compatível com a técnica de creditamento?

Conceitos importantes:

Regime monofásico do PIS e da Cofins: atribui-se a determinado contribuinte a responsabilidade pelo pagamento do tributo em toda cadeia produtiva, ou seja, o recolhimento do PIS e da Cofins é concentrado em uma etapa da cadeia somente. Nas outras etapas, os produtos ficam sujeitos à alíquota zero. Essa sistemática é usada em operações envolvendo medicamentos, produtos de higiene pessoal e cosméticos.

Créditos do PIS e da Cofins: no regime tributário conhecido como PIS e Cofins não cumulativos, a lei confere ao contribuinte o direito de descontar dos débitos apurados de cada contribuição os respectivos créditos que incidem sobre determinados bens, insumos, custos e despesas. Essa técnica do creditamento serve para os casos em que há incidências múltiplas de determinado tributo ao longo da cadeia econômica.

Por exemplo: 

  • dívida de PIS: R$ 15.000,00
  • créditos do PIS apurados nas aquisições de insumos: R$ 5.000,00
  • PIS devido: R$ 10.000,00

Julgamento

Segundo jurisprudência pacífica do STF, o princípio da não cumulatividade não se aplica a situações em que não existe dupla ou múltipla tributação, como por exemplo no regime monofásico e na substituição tributária.

Súmula Vinculante 58/STF. "Inexiste direito a crédito presumido de IPI relativamente à entrada de insumos isentos, sujeitos à alíquota zero ou não tributáveis, o que não contraria o princípio da não cumulatividade"

Tema 844 da Repercussão Geral. "O princípio da não cumulatividade não assegura direito de crédito presumido de IPI para o contribuinte adquirente de insumos não tributados, isentos ou sujeitos à alíquota zero".

O art. 17 da Lei 11.033/2004 não autoriza a constituição de créditos de PIS/PASEP e Cofins sobre o custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica, contudo permite a manutenção de créditos constituídos por outro modo, ou seja, créditos cuja constituição não tenha sido obstada pelas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003. Isso porque essas normas proíbem a tomada de créditos no regime monofásico.

Embora a Lei 11.033/2004 seja posterior às Leis 10.637/2002 e 10.833/2003, os dispositivos que tratam sobre o assunto em questão nas leis de 2002 e 2003 não foram revogados pelo art. 17 da Lei de 2004, por impossibilidade cronológica, e em razão do critério da especialidade. 

A Primeira Seção do STJ já pacificou o entendimento de que não é possível a constituição de créditos sobre o custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica. O objetivo dessa espécie de tributação não é desonerar a cadeia, mas concentrar em apenas um elo a tributação que seria recolhida de toda a cadeia caso fosse não cumulativa, evitando os pagamentos fracionados. Essa dinâmica ocorre exclusivamente por motivos de política fiscal.

Em todos as hipóteses analisadas no julgamento em questão (cadeia de bebidas, setor farmacêutico, setor de autopeças), a autorização para a constituição de créditos sobre o custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica, além de comprometer a arrecadação da cadeia, colocaria a Administração Tributária e o fabricante trabalhando quase que exclusivamente para financiar o revendedor, contrariando o disposto no art. 37, caput, da CF - princípio da eficiência da administração pública - e também o objetivo de neutralidade econômica que é o componente principal do princípio da não cumulatividade. Ou seja, é justamente o creditamento que violaria o princípio da não cumulatividade.

Importante também lembrar que as contribuições ao PIS/PASEP e COFINS possuem destinação própria para o financiamento da Seguridade Social, recursos estes que em um momento de crise estariam sendo suprimidos do SUS e do Programa Seguro Desemprego para serem direcionadas a uma redistribuição de renda individualizada do fabricante para o revendedor, em detrimento de toda a coletividade. 

Sendo assim, ficou decidido que:

(i) o benefício é aplicável somente às empresas inseridas no Reporto? 

Resposta: Não, o benefício do art. 17 da Lei 11.033/2004 não se restringe somente às empresas inseridas no Reporto.

(ii) o art. 17 da Lei 11.033/2004 autoriza o cálculo de créditos dentro da sistemática da tributação monofásica do PIS e da Cofins?

Resposta: Não, pois o dispositivo em questão possibilitou apenas a manutenção de créditos cuja constituição não foi vedada pela legislação em vigor.

(iii) o regime monofásico é compatível com a técnica de creditamento?

Resposta: Sim. Apesar de não constituir créditos, a incidência monofásica da contribuição para o PIS/PASEP e da Cofins não é incompatível com a técnica de créditamento, pois se prende aos bens e não à pessoa jurídica que os comercializa. Essa pessoa jurídica pode adquirir e revender conjuntamente bens sujeitos à não cumulatividade em incidência plurifásica (em mais de uma fase da cadeia econômica), os quais podem lhe gerar créditos.

Resumo Oficial

Há pacífica jurisprudência no âmbito do Supremo Tribunal Federal, sumulada e em sede de repercussão geral, no sentido de que o princípio da não cumulatividade não se aplica a situações em que não existe dupla ou múltipla tributação (v.g. casos de monofasia e substituição tributária), a saber: Súmula Vinculante 58/STF: "Inexiste direito a crédito presumido de IPI relativamente à entrada de insumos isentos, sujeitos à alíquota zero ou não tributáveis, o que não contraria o princípio da não cumulatividade"; Repercussão Geral Tema 844: "O princípio da não cumulatividade não assegura direito de crédito presumido de IPI para o contribuinte adquirente de insumos não tributados, isentos ou sujeitos à alíquota zero".

O art. 17, da Lei n. 11.033/2004, muito embora seja norma posterior aos arts. 3º, § 2º, II, das Leis ns. 10.637/2002 e 10.833/2003, não autoriza a constituição de créditos de PIS/PASEP e COFINS sobre o custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/1977) de bens sujeitos à tributação monofásica, contudo permite a manutenção de créditos por outro modo constituídos, ou seja, créditos cuja constituição não restou obstada pelas Leis ns. 10.637/2002 e 10.833/2003.

Isto porque a vedação para a constituição de créditos sobre o custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica (creditamento), além de ser norma específica contida em outros dispositivos legais - arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003 (critério da especialidade), foi republicada posteriormente com o advento dos arts. 4º e 5º, da Lei n. 11.787/2008 (critério cronológico) e foi referenciada pelo art. 24, §3º, da Lei n. 11.787/2008 (critério sistemático).

Nesse sentido, inúmeros precedentes da Segunda Turma deste Superior Tribunal de Justiça que reconhecem a plena vigência dos arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003, dada a impossibilidade cronológica de sua revogação pelo art. 17, da Lei n. 11.033/2004.

Também a douta Primeira Turma se manifestava no mesmo sentido, antes da mudança de orientação ali promovida pelo AgRg no REsp 1.051.634/CE, (Primeira Turma, Rel. Min. Sérgio Kukina, Rel. p/acórdão Min. Regina Helena Costa, julgado em 28.03.2017).

O tema foi definitivamente pacificado com o julgamento dos EAREsp 1.109.354/SP e dos EREsp 1.768.224/RS (Primeira Seção, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgados em 14.04.2021) estabelecendo-se a negativa de constituição de créditos sobre o custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica (negativa de creditamento).

Consoante o art. 20, do Decreto-Lei n. 4.657/1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB): "[...] não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão". É preciso compreender que o objetivo da tributação monofásica não é desonerar a cadeia, mas concentrar em apenas um elo da cadeia a tributação que seria recolhida de toda ela caso fosse não cumulativa, evitando os pagamentos fracionados (dupla tributação e plurifasia). Tal se dá exclusivamente por motivos de política fiscal.

Em todos os casos analisados (cadeia de bebidas, setor farmacêutico, setor de autopeças), a autorização para a constituição de créditos sobre o custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica, além de comprometer a arrecadação da cadeia, colocaria a Administração Tributária e o fabricante trabalhando quase que exclusivamente para financiar o revendedor, contrariando o art. 37, caput, da CF/1988 - princípio da eficiência da administração pública - e também o objetivo de neutralidade econômica que é o componente principal do princípio da não cumulatividade. Ou seja, é justamente o creditamento que violaria o princípio da não cumulatividade.

No contexto atual de pandemia causada pela COVID - 19, nunca é demais lembrar que as contribuições ao PIS/PASEP e COFINS possuem destinação própria para o financiamento da Seguridade Social (arts. 195, I, "b" e 239, da CF/1988), atendendo ao princípio da solidariedade, recursos estes que em um momento de crise estariam sendo suprimidos do Sistema Único de Saúde - SUS e do Programa Seguro Desemprego para serem direcionados a uma redistribuição de renda individualizada do fabricante para o revendedor, em detrimento de toda a coletividade. A função social da empresa também se realiza através do pagamento dos tributos devidos, mormente quando vinculados a uma destinação social.

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1. É vedada a constituição de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS sobre os componentes do custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica (arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003).
2. O benefício instituído no art. 17, da Lei 11.033/2004, não se restringe somente às empresas que se encontram inseridas no regime específico de tributação denominado REPORTO.
3. O art. 17, da Lei 11.033/2004, diz respeito apenas à manutenção de créditos cuja constituição não foi vedada pela legislação em vigor, portanto não permite a constituição de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS sobre o custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica, já que vedada pelos arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003.
4. Apesar de não constituir créditos, a incidência monofásica da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não é incompatível com a técnica do creditamento, visto que se prende aos bens e não à pessoa jurídica que os comercializa que pode adquirir e revender conjuntamente bens sujeitos à não cumulatividade em incidência plurifásica, os quais podemlhe gerar créditos.
5. O art. 17, da Lei 11.033/2004, apenas autoriza que os créditos gerados na aquisição de bens sujeitos à não cumulatividade (incidência plurifásica) não sejam estornados (sejam mantidos ) quando as respectivas vendas forem efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, não autorizando a constituição de créditos sobre o custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica.

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