> < Todos Julgados > EREsp 1.725.030-SP

STJ - Corte Especial

EREsp 1.725.030-SP

Embargos de Divergência em Recurso Especial

Relator: Raul Araújo

Julgamento: 14/12/2023

Publicação: 20/10/2023

STJ - Corte Especial

EREsp 1.725.030-SP

Tese Jurídica Simplificada

Aplica-se o regime prescricional típico da Fazenda Pública para as entidades da Administração Indireta com personalidade de direito privado que atuem na prestação de serviços públicos essenciais sem finalidade lucrativa e sem natureza concorrencial.

Vídeos

Nossos Comentários

Decreto nº 20.910/1932

O Decreto nº 20.910/1932 regula a prescrição quinquenal das dívidas passivas da Fazenda Pública:

Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.

Por entendimento jurisprudencial, o Decreto nº 20.910/1932 também deve ser aplicado para os créditos de natureza administrativa da Fazenda Pública, em razão dos princípios da simetria e igualdade:

PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO – COBRANÇA DE MULTA PELO ESTADO – PRESCRIÇÃO – RELAÇÃO DE DIREITO PÚBLICO – CRÉDITO DE NATUREZA ADMINISTRATIVA – INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO CIVIL E DO CTN – DECRETO 20.910/32 – PRINCÍPIO DA SIMETRIA. 1. Se a relação que deu origem ao crédito em cobrança tem assento no Direito Público, não tem aplicação a prescrição constante do Código Civil. 2. Uma vez que a exigência dos valores cobrados a título de multa tem nascedouro num vínculo de natureza administrativa, não representando, por isso, a exigência de crédito tributário, afasta-se do tratamento da matéria a disciplina jurídica do CTN. 3. Incidência, na espécie, do Decreto 20.910/32, porque à Administração Pública, na cobrança de seus créditos, deve-se impor a mesma restrição aplicada ao administrado no que se refere às dívidas passivas daquela. Aplicação do princípio da igualdade, corolário do princípio da simetria. 4. Recurso especial não provido. (RESP 1.015.256/PE, Relatora Ministra Eliana Calmon, julgado em 15/05/2008).
 

Decreto-Lei nº 4.597/42

Por sua vez, o Decreto-Lei nº 4.597/42 regula a prescrição prescrição das ações contra a Fazenda Pública: 

Art. 1º Salvo o caso do foro do contrato, compete à Justiça de cada Estado e à do Distrito Federal processar e julgar as causas em que for interessado, como autor, réu, assistente ou opoente, respectivamente, o mesmo Estado, ou seus Municípios, e o Distrito Federal.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica às causas já ajuizadas.

Art. 2º O Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que regula a prescrição qüinqüenal, abrange as dívidas passivas das autarquias, ou entidades e órgãos paraestatais, criados por lei e mantidos mediante impostos, taxas ou quaisquer contribuições, exigidas em virtude de lei federal, estadual ou municipal, bem como a todo e qualquer direito e ação contra os mesmos.

Art. 3º A prescrição das dívidas, direitos e ações a que se refere o Decreto nº 20.910, de 6 de janeiro de 1932, somente pode ser interrompida uma vez, e recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu, ou do último do processo para a interromper; consumar-se-á a prescrição no curso da lide sempre que a partir do último ato ou termo da mesma, inclusive da sentença nela proferida, embora passada em julgado, decorrer o prazo de dois anos e meio.

Conceito de Fazenda Pública

A expressão "Fazenda Pública" faz referência aos entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), suas autarquias e fundações públicas. 

Aplicabilidade do Decreto nº 20.910/1932 e do Decreto-Lei nº 4.597/1942 para as sociedades de economia mista e empresas públicas

As empresas estatais são pessoas jurídicas de Direito Público, autorizadas por lei, para realizarem a prestação de serviços públicos ou explorarem atividade econômica. 

Sobre as empresas estatais, a Constituição Federal prevê a existência de regime jurídico próprio, aplicando-se, em regra, o regime jurídico de Direito Privado com derrogações de Direito Público. 

 Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:       

I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;       

II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;       

III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública; 

IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários; 

V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores. 

§ 2º As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.

§ 3º A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade.

Em diversas oportunidades, os Tribunais Superiores discutem o regime jurídico aplicável às empresas estatais exclusivamente destinadas à prestação de serviços públicos essenciais e que, assim, se dediquem à atividade econômica sem finalidade lucrativa e sem natureza concorrencial. 

Um exemplo bastante significativo é a aplicação da imunidade recíproca para essas entidades. Como exemplo, a Tese 1.140 de Repercussão Geral julgada pelo STF.

A exemplo das discussões existentes, o STJ julgou o EREsp 1.725.030-SP para decidir se os prazos previstos nos Decreto nº 20.910/1932 e no Decreto-Lei nº 4.597/1942 seriam aplicáveis às estatais exclusivamente destinadas à prestação de serviços públicos essenciais, sem finalidade lucrativa e natureza concorrencial. 

No mesmo sentido da orientação que já tem sido adotada em julgados anteriores, o STJ concluiu que é possível aplicar os Decretos a essas pessoas jurídicas. 

Em síntese, o Tribunal entende que embora sejam pessoas jurídicas de direito privado, quando essas empresas - quando prestam serviços públicos essenciais sem finalidade lucrativa e sem natureza concorrencial -  atuam como verdadeiras autarquias, razão pela qual devem receber tratamento semelhante ao da Fazenda Pública, delegatária e originariamente responsável pela prestação do serviço público essencial delegado.

Tese Jurídica Oficial

Aplica-se o regime normativo prescricional das pessoas jurídicas de direito público, previsto no Decreto n. 20.910/1932 e no Decreto-Lei n. 4.597/1942, às entidades da Administração Indireta com personalidade de direito privado que atuem na prestação de serviços públicos essenciais sem finalidade lucrativa e sem natureza concorrencial.

Resumo Oficial

A controvérsia consiste em definir se o prazo prescricional quinquenal, previsto no Decreto n. 20.910/1932, é aplicável às pessoas jurídicas de direito privado da Administração Indireta (sociedades de economia mista e empresas públicas), quando estas exercerem atividades destinadas à prestação de serviço público essencial, não dedicadas à exploração de atividade econômica com finalidade lucrativa e natureza concorrencial. Ou se, contrariamente, por se tratarem de pessoas jurídicas de direito privado, nas pretensões em que fizerem parte, devem incidir os prazos prescricionais estabelecidos no Código Civil.

Nesta Corte Superior, durante bastante tempo, prevaleceu orientação de que o prazo de prescrição quinquenal, previsto no Decreto n. 20.910/1932 e no Decreto-Lei n. 4.597/1942, aplicava-se apenas às pessoas jurídicas de direito público (União, Estados, Municípios, Distrito Federal, autarquias e fundações públicas), excluindo-se, portanto, as pessoas jurídicas de direito privado da Administração Pública Indireta (sociedades de economia mista, empresas públicas e fundações) (REsp n. 1.270.671/RS, Relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe de 5/3/2012). Entendia-se que às pessoas jurídicas de direito privado da Administração Pública Indireta deveriam ser aplicados tão somente os prazos prescricionais estabelecidos no Código Civil.

Mais recentemente, contudo, este Tribunal Superior tem apresentado entendimento diferenciado, delineando ser plenamente aplicável, por equiparação, a prescrição quinquenal do Decreto-Lei n. 20.910/1932, quando se tratar de empresas estatais destinadas, exclusivamente, à prestação de serviços públicos essenciais e que, assim, se dediquem à atividade econômica sem finalidade lucrativa e sem natureza concorrencial. Isso, porque, conquanto dotadas de personalidade jurídica de direito privado, as empresas estatais fazem as vezes de ente autárquico, estreitamente ligados ao ente político ao qual se vinculam e, por conseguinte, devem, em certa medida, receber tratamento assemelhado ao da Fazenda Pública, inclusive relativamente a prazos prescricionais.

Nesse contexto, às entidades da Administração Indireta com personalidade de direito privado, que atuam na prestação de serviços públicos essenciais, sem finalidade lucrativa e sem natureza concorrencial, é possível estender-se o mesmo regime normativo acerca da prescrição aplicável às pessoas jurídicas de direito público (Decreto n. 20.910/1932 e Decreto-Lei n. 4.597/1942), visando até mesmo dar equilíbrio às pretensões de natureza eminentemente pública a serem exercidas contra as empresas estatais. Assim, concedendo-lhes igualdade de condições em relação à Fazenda Pública, delegatária e originariamente responsável pela prestação do serviço público essencial delegado.

Encontrou um erro?

Onde Aparece?