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STJ - Quinta Turma

AgRg no REsp 2.016.905-SP

Agravo Regimental no Recurso Especial

Relator: Messod Azulay Neto

Julgamento: 07/03/2023

Publicação: 14/04/2023

STJ - Quinta Turma

AgRg no REsp 2.016.905-SP

Tese Jurídica

Nos casos em que houver a modificação do quadro fático-jurídico, e, ainda, em situações em que houver a desclassificação do delito - seja por emendatio ou mutatio libelli -, uma vez preenchidos os requisitos legais exigidos para o Acordo de Não Persecução Penal, torna-se cabível o instituto negocial.

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Nossos Comentários

Acordo de Não Persecução Penal

O acordo de não persecução penal (ANPP) é um instituto processual inserido no CPP pela Lei Anticrime (Lei 13.964/19). Trata-se de um instrumento celebrado entre o Ministério Público e o investigado, no qual a acusação abre mão da pretensão punitiva mediante o cumprimento de algumas exigências por parte do acusado. Trata-se de um negócio jurídico pré-processual entre a acusação e o investigado.

Para que seja possível celebrar esse acordo, devem estar presentes os seguintes requisitos:

  1. O inquérito policial não pode apresentar hipótese de arquivamento;
  2. Deve existir confissão formal e circunstanciada da prática do crime pelo investigado;
  3. A infração penal em questão não pode ter violência ou grave ameaça; e
  4. A pena mínima legal deve ser inferior a 4 anos.

Segundo o CPP, a reincidência ou a conduta criminosa habitural, reiterada ou profissional, afasta a possibilidade de acordo.

Presentes as referidas circunstâncias, o MP pode propor o acordo, caso constate a necessidade e a suficiência desse instrumento para reprimir e prevenir o crime. Observa-se, portanto, que existe uma certa discricionariedade na decisão do MP sobre a proposição do acordo de não persecução penal (ANPP).

Segue a previsão legal desse instrumento:

CPP

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:

I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);

IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

No caso em questão, à época do inquérito não fora ofertado o ANPP em razão da pena mínima ultrapassar 4 anos. O agente estava sendo acusado de vários crimes independentes de falsidade ideológica (art. 299, CP), em cúmulo material. No entanto, em sede de apelação, foi reconhecida a continuidade delitiva entre os crimes de falsidade ideológica (CP, art. 299), de modo que a pena passou pelo sistema da exasperação, e não mais do cúmulo material.

Esse reconhecimento, segundo o STJ, torna viável a realização do ANPP, em razão do novo patamar de apenamento, já que a pena mínima cominada foi inferior a 4 anos segundo essa nova regra de contagem revista pelo Tribunal no recurso.

Resumo Oficial

No caso, houve uma relevante alteração do quadro fático-jurídico, tornando-se potencialmente cabível o instituto negocial do Acordo de Não Persecução Penal - ANPP. Afinal, o Tribunal a quo, ao julgar o recurso de apelação interposto pela defesa, deu-lhe parcial provimento, a fim de reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de falsidade ideológica (CP, art. 299), tornando, assim, objetivamente viável a realização do referido acordo, em razão do novo patamar de apenamento - pena mínima cominada inferior a 4 (quatro) anos.

Trata-se, mutatis mutandis, de raciocínio similar àquele constante da Súmula n. 337 desta Corte Superior, a saber: "É cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e na procedência parcial da pretensão punitiva".

De fato, ao longo da ação penal até a prolação da sentença condenatória, o ANPP não era cabível, seja porque a Lei n. 13.964/2019 (Pacote Anticrime) entrou em vigor em 23/1/2020, após o oferecimento da denúncia (26/4/2019), seja porque o crime imputado - falsidade ideológica, por sete vezes, em concurso material - não tornava viável o referido acordo, tendo em vista que a pena mínima cominada era superior a 4 (quatro) anos, em razão do concurso material de crimes.

Ocorre que o Tribunal de origem, já na vigência da Lei n. 13.964/2019, deu parcial provimento ao recurso de apelação interposto pela defesa para reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de falsidade ideológica, afastando, assim, o concurso material.

Essa modificação do quadro fático-jurídico não somente resultou numa considerável redução da pena, mas também tornou objetivamente cabível a formulação de acordo de não persecução penal, ao menos sob o aspecto referente ao requisito da pena mínima cominada ser inferior a 4 (quatro) anos, conforme previsto no art. 28-A do CPP.

Assim, nos casos em que houver a modificação do quadro fático-jurídico, como no caso em questão, e ainda em situações em que houver a desclassificação do delito - seja por emendatio ou mutatio libelli -, uma vez preenchidos os requisitos legais exigidos para o ANPP, torna-se cabível o instituto negocial.

Cabe salientar, ainda, que, no caso, não se faz necessária a discussão acerca da questão da retroatividade do ANPP, mas, sim, unicamente a circunstância de que a alteração do quadro fático-jurídico tornou potencialmente cabível o instituto negocial, de maneira que o entendimento externado na presente decisão não entra em confronto com a jurisprudência desta Corte Superior.

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