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STF - Plenário

ARE 848.107-DF

Recurso Extraordinário com Agravo

Paradigma

Relator: Dias Toffoli

Julgamento: 30/06/2023

Publicação: 12/07/2023

STF - Plenário

ARE 848.107-DF

Tese Jurídica Simplificada

O prazo para a prescrição da execução da pena somente começa a correr do dia em que a sentença transita em julgado para ambas as partes.

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Contexto e Controvérsia

Em sentido amplo, ou seja, de forma genérica, existem duas espécies de prescrição penal: a prescrição da pretensão punitiva (PPP) e a prescrição da pretensão executória (PPE).

O direito de punir do Estado se divide em dois momentos, cada qual representativo de uma espécie de prescrição. Primeiramente, tem o Estado um prazo para decretar a sanção que o infrator irá receber, ou seja, o Estado tem um período para decretar a sua sentença penal condenatória. Depois que esta transita em julgado, passa a correr um novo período prescricional para o Estado: o prazo para aplicar a pena determinada no título judicial. 

Por exemplo, um sujeito comete um crime de roubo. Primeiramente, o Estado tem um prazo para aplicar a punição prevista na sentença, que, por exemplo, será de reclusão de 8 anos. Transcorrido esse prazo, tem o Estado novo prazo para aplicar a pena, ou seja, levar, no exemplo, o sujeito ao cárcere.

A prescrição quanto à decretação de uma sentença penal condenatória é a prescrição da pretensão punitiva (é a pretensão do Estado de punir o agente). A prescrição quanto à aplicação da pena é a prescrição da pretensão executória (é a pretensão do Estado de executar a pena imposta ao agente).

O recurso em questão discute se o prazo da PPE deve começar a contar do trânsito em julgado para a acusação (art. 112, I, do Código Penal), ou no momento em que a ação transitar em julgado para as duas partes (acusação e defesa).

Art. 112 - No caso do art. 110 deste Código, a prescrição começa a correr:

I - do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional;

Julgamento

No entendimento do Supremo, o prazo para a prescrição da execução da pena somente começa a correr do dia em que a sentença transita em julgado para ambas as partes, conforme interpretação dada pela Corte ao princípio da presunção de inocência nas ADC 43,44 e 54.

É incompatível com a atual ordem constitucional a aplicação meramente literal do disposto no art. 112, I, do CP. Nesse contexto, é necessário interpretá-lo sistemicamente, com a fixação do trânsito em julgado para ambas as partes (acusação e defesa) como marco inicial da PPE.

De acordo com a jurisprudência do STF, a prescrição da pretensão executória depende da inércia do titular do direito de punir (Estado). Desse modo, a única interpretação do inciso I do art. 112 do CP compatível com esse entendimento é a que desconsidera o termo "para a acusação" e define como marco inicial o trânsito em jugado para ambas as partes, dado que é nesse momento que surge o título penal passível de ser executado pelo Estado.

A aplicação literal do art. 112, I, do CP, além de contrariar a ordem jurídico-normativo, incentiva a interposição de recursos com fins meramente procrastinatórios, impedindo a efetividade da jurisdição penal.

Diante disso, o STF assentou o entendimento de que a locução "para a acusação", contida no art. 112, I, do CP, não foi recepcionada pela Constituição. Assim, a Corte conferiu-lhe interpretação conforme a Constituição no sentido de que a prescrição começa a correr do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para ambas as partes. Tal entendimento se aplica aos casos em que:

(i) a pena não foi declarada extinta pela prescrição; e

(ii) cujo trânsito em julgado para a acusação tenha ocorrido após 12/11/2020.

Tese Jurídica Oficial

O prazo para a prescrição da execução da pena concretamente aplicada somente começa a correr do dia em que a sentença condenatória transita em julgado para ambas as partes, momento em que nasce para o Estado a pretensão executória da pena, conforme interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal ao princípio da presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII, da Constituição Federal) nas ADC 43, 44 e 54.

Resumo Oficial

É incompatível com a atual ordem constitucional — à luz do postulado da presunção de inocência (CF/1988, art. 5º, LVII) e o atual entendimento do STF sobre ele — a aplicação meramente literal do disposto no art. 112, I, do Código Penal. Por isso, é necessário interpretá-lo sistemicamente, com a fixação do trânsito em julgado para ambas as partes (acusação e defesa) como marco inicial da prescrição da pretensão executória estatal pela pena concretamente aplicada em sentença condenatória.

Conforme jurisprudência firmada nesta Corte, o Estado não pode determinar a execução da pena contra condenado com base em título executivo não definitivo, dada a prevalência do princípio da não culpabilidade ou da presunção de inocência. Assim, a constituição definitiva do título judicial condenatório é condição de exercício da pretensão executória do Estado.

Nesse contexto, a prescrição da pretensão executória pressupõe a inércia do titular do direito de punir. Portanto, a única interpretação do inciso I do art. 112 do Código Penal compatível com esse entendimento é a que elimina do dispositivo a locução “para a acusação” e define como termo inicial o trânsito em julgado para ambas as partes, visto que é nesse momento que surge o título penal passível de ser executado pelo Estado.

Ademais, a aplicação da literalidade do dispositivo impugnado, além de contrária à ordem jurídico-normativa, apenas fomenta a interposição de recursos com fins meramente procrastinatórios, frustrando a efetividade da jurisdição penal. 

Com base nesse e outros entendimentos, o Plenário, por maioria, ao apreciar o Tema 788 de repercussão geral, negou provimento ao agravo em recurso extraordinário interposto pelo MPDFT e declarou a não recepção pela Constituição Federal da locução “para a acusação”, contida art. 112, inciso I (primeira parte), do Código Penal, conferindo-lhe interpretação conforme a Constituição no sentido de que a prescrição começa a correr do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para ambas as partes. Esse entendimento se aplica aos casos em que

(i) a pena não foi declarada extinta pela prescrição; e

(ii) cujo trânsito em julgado para a acusação tenha ocorrido após 12.11.2020.

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