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STF - Plenário

ADI 3.454-DF

Ação Direta de Inconstitucionalidade

Relator: Dias Toffoli

Julgamento: 20/06/2022

Publicação: 24/06/2022

STF - Plenário

ADI 3.454-DF

Tese Jurídica Simplificada

É inconstitucional a requisição administrativa de bens (art. 15, XIII, Lei 8.080/1990) de um ente federativo por outro.

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Requisição administrativa de bens

O art. 15, XIII, da Lei Orgânica do Sistema único de Saúde (Lei 8.080/1990) dispõe que:

Art. 15. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições:

XIII - para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera administrativa correspondente poderá requisitar bens e serviços, tanto de pessoas naturais como de jurídicas, sendo-lhes assegurada justa indenização;

A ADI em questão foi apresentada pelo partido Democratas (DEM) sob o fundamento de que o dispositivo acima teria embasado a intervenção decretada pelo governo federal em hospitais do Rio de Janeiro em 2005. No entendimento do autor, a norma abre margem para interpretação sobre quais pessoas jurídicas ficam sujeitas à requisição, em oposição à CF, que só permite, em caso de perigo iminente, a requisição de bens de propriedade particular, e não públicos, como ocorreu na intervenção no Rio.

Qual é a correta interpretação do dispositivo?

A norma em questão cuida da possibilidade de requisição no contexto das atribuições do SUS e, portanto, de competência comum entre os entes. Tal hipótese depende da existência de uma situação de necessidade coletiva, urgente e transitória, que afetará todos os níveis de entes federativos, sendo necessária a coordenação horizontal entre eles.

A permissão constitucional para a requisição administrativa de bens particulares, em caso de iminente perigo público, tem aplicação nas relações entre Poder Público e patrimônio privado, não sendo possível estender essa hipótese às relações entre os entes federativos.

Art. 5º

XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;

De acordo com a jurisprudência do Supremo, a requisição de bens e serviços de um ente federado por outro ofende o princípio federativo. Excepcionalmente, somente a União poderia fazê-lo durante a vigência de estado defesa (art. 136, §1º. II, CF) e estado de sítio (art. 139, VII, CF).

Tal entendimento se mantém mesmo no contexto extraordinário de pandemia de covid-19. No julgamento da ACO 3.463, o Plenário do Supremo referendou medida cautelar para impedir que a União fizesse requisição de insumos para a fabricação de vacina contra o coronavírus adquiridos pelo Estado de São Paulo, sob pena de violação da autonomia do ente. 

Os entes federativos devem receber tratamento isonômico, não havendo entre eles hierarquia, exceto determinadas distinções constantes na CF. Nesse contexto, como as relações entre eles se caracterizam pela cooperação e horizontalidade, tal requisição, ainda que voltada para resolver situação de extrema necessidade, viola a autonomia do ente cujos bens ou serviços públicos são requisitados.

Diante disso, a ação foi julgada procedente para dar interpretação conforme a Constituição ao art. 15, XIII, da Lei 8.080/1990, excluindo a possibilidade de requisição administrativa de bens e serviços públicos de titularidade de outros entes federativos.

Em resumo, é inconstitucional a requisição administrativa de bens (art. 15, XIII, Lei 8.080/1990) de um ente federativo por outro.

Tese Jurídica Oficial

A requisição administrativa “para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de irrupção de epidemias” — prevista na Lei Orgânica do Sistema Único de Saúde (Lei 8.080/1990) — não recai sobre bens e/ou serviços públicos de outro ente federativo.

Resumo Oficial

O permissivo constitucional para a requisição administrativa de bens particulares, em caso de iminente perigo público, tem aplicação nas relações entre Poder Público e patrimônio privado, não sendo possível estender a hipótese às relações entre as unidades da Federação.

Nos termos da jurisprudência desta Corte, ofende o princípio federativo a requisição de bens e serviços de um ente federado por outro, o que somente se admitiria excepcionalmente à União durante a vigência de estado de defesa (CF/1988, art. 136, § 1º, II) e estado de sítio (CF/1988, art. 139, VII).

Entre os entes federados não há hierarquia, sendo-lhes assegurado tratamento isonômico, ressalvadas apenas as distinções porventura constantes na própria CF/1988. Portanto, como as relações entre eles se caracterizam pela cooperação e horizontalidade, tal requisição, ainda que a pretexto de acudir situação fática de extrema necessidade, importa ferimento da autonomia daquele cujos bens ou serviços públicos são requisitados, acarretando-lhe incontestável desorganização.

Com base nesse entendimento, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para atribuir interpretação conforme a Constituição ao art. 15, XIII, da Lei 8.080/1990, excluindo a possibilidade de requisição administrativa de bens e serviços públicos de titularidade de outros entes federativos.

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