REsp 1.944.228-SP

STJ Terceira Turma

Recurso Especial

Relator: Ricardo Villas Bôas Cueva

Julgamento: 18/10/2022

Publicação: 07/11/2022

Tese Jurídica Simplificada

Primeira Tese: Encerrado o estado de comunhão dos bens, aplica-se o prazo prescricional trienal à pretensão de que o ex-companheiro arque com gastos de animais de estimação adquiridos durante a união estável.

Segunda Tese: Não é possível aplicar por analogia disposições acerca da pensão alimentícia aos animais de estimação adquiridos durante união estável.

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Tese Jurídica Oficial

Primeira Tese: Encerrado o estado de mancomunhão, aplica-se o prazo prescricional trienal à pretensão de que o ex-companheiro arque com gastos de animais de estimação adquiridos durante a união estável.

Segunda Tese: Não é possível aplicar por analogia as disposições acerca da pensão alimentícia, baseada na filiação e regida pelo Direito de Família, aos animais de estimação adquiridos durante união estável.

Primeira Tese: Encerrado o estado de mancomunhão, aplica-se o prazo prescricional trienal à pretensão de que o ex-companheiro arque com gastos de animais de estimação adquiridos durante a união estável.

Cinge-se a controvérsia a determinar o prazo prescricional aplicável à pretensão de que ex-companheiro arque com gastos de animais de estimação adquiridos durante a união estável, na proporção de metade.

De todo imprópria a aplicação analógica do prazo prescricional bienal - que cuida da pretensão afeta à pensão alimentícia - à obrigação de custeio das despesas de animais de estimação após a dissolução da união estável.

De acordo com o art. 206, § 3º, do Código Civil, prescreve em 3 (três) a pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa.

Enquanto perdurar o estado de mancomunhão, o coproprietário que assumir sozinho as despesas do bem pertencente em condomínio, tem o prazo de 3 (três) anos, contados de cada parcela/mensalidade paga, para obter a reparação dos prejuízos gerados pelo locupletamento sem causa do outro proprietário (na proporção de metade).

Independentemente do modo como a pretensão é veiculada pela parte, este é o fundamento do pedido, consoante o ordenamento jurídico posto.

Segunda Tese: Não é possível aplicar por analogia as disposições acerca da pensão alimentícia, baseada na filiação e regida pelo Direito de Família, aos animais de estimação adquiridos durante união estável.

Cinge-se a controvérsia a determinar a possibilidade de se aplicar, por analogia, as disposições acerca da pensão alimentícia, baseada na filiação e regida pelo Direito de Família, aos animais de estimação adquiridos durante união estável.

A discussão travada nestes autos, ao contrário daquela discutida no leading case, julgado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.173.167/SP), diz respeito não a direitos, mas, sim, aos deveres de arcar com os custos de subsistência dos animais de estimação, adquiridos durante a união estável, após a dissolução desta.

A solução de questões que envolvem a ruptura da entidade familiar e o seu animal de estimação não pode desconsiderar o ordenamento jurídico posto - o qual, sem prejuízo de vindouro e oportuno aperfeiçoamento legislativo, não apresenta lacuna e dá respostas aceitáveis a tais demandas -, devendo, todavia, o julgador, ao aplicá-lo, tomar como indispensável balizamento o aspecto afetivo que envolve a relação das pessoas com o seu animal de estimação, além da proteção à incolumidade física e à segurança do pet, concebido como ser dotado de sensibilidade e protegido de qualquer forma de crueldade.

A relação entre o dono e o seu animal de estimação encontra-se inserida no direito de propriedade e no direito das coisas, com o correspondente reflexo nas normas que definem o regime de bens da união estável. A aplicação de tais regramentos, contudo, submete-se a um filtro de compatibilidade de seus termos com a natureza particular dos animais de estimação, seres que são dotados de sensibilidade, com ênfase na proteção do afeto humano para com os animais.

A aplicação de tais regramentos tem o condão justamente de preservar a relação afetiva e os cuidados estabelecidos entre a demandante e os seus animais de estimação, sem que se possa admitir a interferência, de qualquer índole ou extensão, de quem não mais é, há muito, dono dos pets e não nutre nenhuma relação afetiva com eles.

Se, em virtude do fim da união, as partes, ainda que verbalmente ou até implicitamente, convencionarem, de comum acordo, que o animal de estimação ficará com um deles, este passará a ser seu único dono, que terá o bônus de desfrutar de sua companhia, arcando, por outro lado, sozinho, com as correlatas despesas.

Não se poderia conceber em tal hipótese - em que, extinta a união estável, com inequívoca definição a respeito de quem, doravante, passaria a ser o dono do animal de estimação -, pudesse o outro ex-companheiro, por exemplo, passado algum tempo e sem guardar nenhum vínculo de afetividade com o animal, reivindicar algum direito inerente à propriedade deste.

O fato de o animal de estimação ter sido adquirido na constância da união estável não pode representar a consolidação de um vínculo obrigacional indissolúvel entre os companheiros (com infindáveis litígios) ou entre um deles e o pet, sendo conferido às partes promover a acomodação da titularidade dos animais de estimação, da forma como melhor lhes for conveniente. A partir do fim da união estável, os bens hauridos durante a convivência são regidos pelo correlato regime de bens que, na ausência de contrato escrito entre os companheiros, como é o caso dos autos, segue o da comunhão parcial de bens (art. 1.725 do CC).

Eventual impasse entre os companheiros sobre quem deve ficar com o animal de estimação, adquirido durante a união estável, por evidente, não poderia ser resolvido, simplesmente, por meio da determinação da venda dos pets e posterior partilha, entre eles, da quantia levantada, como se dá usualmente com outros bens móveis, já que, como assentado, não se pode ignorar o afeto humano para com os animais de estimação, tampouco a sua natureza de ser dotado de sensibilidade.

Durante o exercício simultâneo e conjunto da propriedade pelos ex-companheiros (ou ex-cônjuges) em relação aos bens do casal, enquanto não operada a partilha, mancomunhão, caso um bem (integrante dessa unidade patrimonial fechada) esteja na posse exclusiva de um deles, é possível que o outro exija daquele a correspondente indenização pela privação da fruição da coisa, abatida, proporcionalmente, das despesas que, de igual modo, a ambos competem. Essa compreensão é extraída da conjugação dos arts. 1.315 e 1.319 do Código Civil.

Não se pode ignorar que a imputação, ao demandado, do dever de arcar com as despesas dos animais (que não mais pertencem a ele), para que a demandante, exclusivamente, usufrua da companhia dos pets, também não atende ao preceito de equidade. Isso porque somente pode alienar o bem, naturalmente, aquele que tem a sua titularidade. O demandado não é proprietário dos animais, não usufrui da companhia dos animais, mas, como se vê, foi obrigado a arcar com as correlatas despesas até a morte ou até a alienação dos cães.

Ou seja, a prevalecer essa lógica, o demandado somente se desobrigará de tal encargo, excluído o evento morte, se a proprietária, ao seu alvedrio, quiser vender ou doá-los. À proprietária é dada a possibilidade de dispor dos animais. Ao demandado que, desde o início, assumiu essa condição de disposição dos animais, não levada a efeito pela providência da demandante, impõe-se obrigação de custeio das despesas de subsistência. Trata-se, a toda evidência, de uma obrigação potestativa imposta ao ex-companheiro, sem nenhum respaldo no ordenamento jurídico posto.

Com base em tais fundamentos, conclui-se que a obrigação de custear as despesas de subsistência dos animais de estimação tem regramento próprio e deve ser regido segundo o direito de propriedade (direito das coisas), com a repercussão no regime de bens regente do caso, atentando-se, em sua aplicação, ao afeto humano e à natureza particular dos animais, como seres dotados de sensibilidade.

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