AgInt no AREsp 1.585.959-MT

STJ Quarta Turma

Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial

Relator: Luis Felipe Salomão

Julgamento: 08/08/2022

Publicação: 15/08/2022

Tese Jurídica Simplificada

O reembolso das despesas médico-hospitalares do beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada, limita-se a hipóteses excepcionais, e os direitos dos usuários do plano de saúde, principalmente relativos a questões com a rede credenciada, devem ser examinados à luz da relação contratual firmada em cada plano, individualmente.

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Tese Jurídica Oficial

Para o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada, além da observância de se limitar a hipóteses excepcionais, os direitos dos usuários do plano de saúde, mormente a questão da rede credenciada, devem ser examinados à luz de cada plano de saúde específico, isto é, da respectiva relação contratual.

O fato de o hospital de escolha, na hipótese, alegadamente fazer parte da rede credenciada de planos de saúde da "Unimed Paulistana", não significa que é da rede credenciada de todos os planos de Saúde mesmo daquela Unimed, tampouco do plano de saúde específico da agravante (da Unimed de Cuiabá).

Conforme o princípio da função social do contrato, insculpido no art. 421 do CC, não se pode descuidar de que o modelo se baseia no conceito de mutualismo, que vem da área de seguros: um grupo de pessoas se junta, cotiza-se e gera-se uma receita por meio do pagamento individual da mensalidade, sendo o valor total arrecadado usado para pagar as despesas decorrentes do atendimento à saúde de integrantes desse grupo. Como são várias pessoas, os custos se diluem, o preço do plano se reduz, e elas podem ter acesso a serviços que teriam dificuldade de custear individualmente.

O art. 421, parágrafo único, do CC, com a redação conferida pela Lei n. 13.784/2019, passou a estabelecer que a liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.

Com efeito, o art. 113 do Código Civil dispõe que os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração, e o bem invocado no art. 422 do CC estabelece que os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. Por um lado, a boa-fé objetiva restringe o exercício abusivo de direitos, impondo que as partes colaborem mutuamente para a consecução dos fins comuns perseguidos com o contrato - que não é um mero instrumento formal de registro das intenções -, e também encontra a sua vinculação e limitação na função econômica e social do contrato, visando a fazer com que os legítimos interesses da outra parte, relativos à relação econômica nos moldes pretendidos pelos contratantes, sejam salvaguardados.

Por outro lado, se ocorrem motivos que justifiquem a intervenção judicial em lei permitida, há de realizar-se para a decretação da nulidade ou da resolução do contrato, nunca para a modificação do seu conteúdo - o que se justifica, ademais, como decorrência do próprio princípio da autonomia da vontade, uma vez que a possibilidade de intervenção do juiz na economia do contrato atingiria o poder de obrigar-se, ferindo a liberdade de contratar.

De fato, cumpre à operadora velar os interesses da coletividade de beneficiários dos planos que administram, e o art. 24 da Lei n. 9.656/1998 estabelece que sempre que detectadas nas operadoras sujeitas à disciplina desta Lei anormalidades administrativas graves que coloquem em risco a continuidade dos planos de saúde, a ANS poderá determinar a alienação da carteira, o regime de direção fiscal ou técnica, por prazo não superior a trezentos e sessenta e cinco dias, ou a liquidação extrajudicial, conforme a gravidade do caso.

Isso porque, eventuais decisões administrativas ou judiciais à margem da lei "escapam das previsões pretéritas" e têm o condão de agravar "a delicada situação financeira de inúmeras operadoras de planos de saúde, que, seguida de intervenções, liquidações ou aquisições de carteiras de clientes, fere em última análise a própria confiança e expectativa dos consumidores, razão maior da contratação" do plano ou seguro de saúde. "O problema deixa de ser da operadora e passa a atingir toda a sociedade".

As diretrizes da socialibilidade e eticidade foram alçadas pelo CC/2002 a postulados fundamentais. Nesse passo, os contratos passam a ser concebidos em termos econômicos e sociais, consoante propugna a teoria preceptiva.

Nesse passo, o pedido exordial vai de encontro aos princípios da eticidade, da boa-fé objetiva e da função social do contrato, não havendo interesse jurídico-social na tutela da situação objetivamente gerada por unilateral escolha da parte autora que não se valeu da rede credenciada (sendo bem de ver, a título de mero registro, que a operadora do plano de saúde repisa em contrarrazões recursais que a prova pericial apontou que o tratamento de câncer poderia ter sido feito na rede credenciada), inclusive em vista das consequências econômicas e sociais deletérias de uma jurisprudência permissiva.

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