REsp 1.993.981-PE

STJ Segunda Turma

Recurso Especial

Relator: Marco Aurélio Bellizze

Julgamento: 05/08/2025

Publicação: 12/08/2025

Tese Jurídica Simplificada

É ilegal negar a isenção do IPI na compra de veículo automotor por pessoa com Transtorno do Espectro Autista sob o fundamento de que o beneficiário já recebe o Benefício de Prestação Continuada (BPC).

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Tese Jurídica Oficial

Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Aquisição de veículo automotor. Indeferimento de pedido de isenção de IPI. Alegada incompatibilidade com o recebimento de Benefício de Prestação Continuada (BPC). Ilegalidade.

Cinge-se a controvérsia em saber se a concessão de isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros por pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) é condicionada, ou não, à circunstância de que esta não receba, concomitante à pretendida isenção, o Benefício de Prestação Continuada - BPC, previsto na Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS.

No caso, a despeito do preenchimento dos requisitos legais à concessão da isenção de IPI na aquisição de veículo automotor, por pessoa com Transtorno do Espectro Autista (apresentação de laudo, com especificação do diagnóstico médico e comprovação de disponibilidade financeira ou patrimonial compatível com o valor do veículo a ser adquirido), a administração fazendária erigiu, como condição negativa à obtenção do benefício fiscal, a circunstância - não estabelecida na lei isentiva de regência - de que o requerente não fizesse jus, simultaneamente, à percepção do Benefício de Prestação Continuada - BPC, invocando, para tanto, o disposto no art. 20, § 4º da Lei n. 8.742/1993, cujos contornos, todavia, não conferem respaldo algum a essa conclusão.

Dos termos do § 4º do art. 20 da Lei n. 8.742/1993, ressai evidenciado que o Benefício de Prestação Continuada não pode ser cumulado com nenhum outro benefício no âmbito da seguridade social (como o são o seguro-desemprego, a aposentadoria, pensão por morte, v.g.) ou de outro regime - aqui, leia-se, regime previdenciário -, ressalvadas assistência médica, pensão especial de natureza indenizatória (como a regulada na Lei n. 7.070/1982); e transferências de renda oriunda da chamada "renda básica de cidadania", mencionada no art. 6º, parágrafo único, da Constituição Federal e no art. 1º, § 1º, da Lei n. 10.835/2004 (no que se insere o "bolsa família", benefício concebido como etapa do processo gradual e progressivo da universalização da renda básica de cidadania - art. 1º, § 1º, da Lei n. 14.601/2023).

Justifica-se a impossibilidade de acumulação, a considerar que o BPC tem por finalidade precípua justamente prover o mínimo existencial do beneficiário (pessoa idosa ou portadora de deficiência ou com Transtorno do Espectro Autista), o que já seria alcançado pela concessão de outros benefícios previdenciários e assistenciais, circunstância, por evidente, que não se aplica, nem sequer reflexamente, aos benefícios fiscais. Por tal razão, não se poderia conferir à norma de caráter indiscutivelmente restritiva (por restringir o direito à percepção do BPC) interpretação ampliativa para fazer incluir na vedação ali prevista os benefícios de ordem fiscal, que não guardam, como visto, nenhum paralelo com a justificação contida na norma proibitiva.

A interpretação conferida pela autoridade coatora, ao reputar vedado ao beneficiário do BPC - pessoa com deficiência e idoso com 65 anos ou mais, sem condições de prover sua própria subsistência - fazer jus à obtenção de um benefício fiscal, vulnera substancialmente os princípios da capacidade econômica do contribuinte, bem como da isonomia (que viabiliza, em certos casos, discriminações legais que se afiguram justas e razoáveis a fim de alcançar a igualdade material entre os contribuintes), o que não se concebe.

O benefício fiscal em questão dirige-se, no que importa ao caso, às pessoas com Transtorno do Espectro Autista em relação às quais não se exige a comprovação de hipossuficiência financeira. De modo diverso, a lei isentiva do IPI exige destas a demonstração a respeito da disponibilidade financeira ou patrimonial compatível com o valor do veículo a ser adquirido.

Este requisito - hipossuficiência financeira -, nos exatos termos em que especificado na Lei de Organização de Assistência Social, relaciona-se à concessão do Benefício Prestação Continuada, apresentando-se à administração fazendária como questão absolutamente irrelevante para fins de concessão ou não do benefício fiscal em exame, mostrando-se, por isso, indevida qualquer consideração a esse respeito.

Ademais, o reconhecimento de suposta ou eventual capacidade financeira do núcleo familiar do impetrante poderia, em tese, ser fundamento para revogação do benefício assistencial - garantido ao beneficiário, em todo caso, o exercício do contraditório e da ampla defesa -, e não o indeferimento de isenção de IPI sobre o veículo.

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