STJ - Primeira Turma
AREsp 2.272.508-RN
Agravo em Recurso Especial
Relator: Gurgel de Faria
Julgamento: 06/02/2024
Publicação: 21/03/2024
STJ - Primeira Turma
AREsp 2.272.508-RN
Tese Jurídica Simplificada
A concessão da cautelar de indisponibilidade de bens, prevista no artigo 16 da Lei de Improbidade Administrativa, após as alterações da Lei nº 14.230/2021, depende da comprovação da urgência, requisito que é exigido imediatamente aos processos em curso em razão da natureza processual da norma.
Vídeos
Nossos Comentários
Tese Jurídica Oficial
A demonstração do requisito da urgência para a indisponibilidade de bens, prevista no art. 16 da Lei de Improbidade Administrativa (com a redação dada pela Lei n. 14.230/2021), tem aplicação imediata ao processo em curso dado o caráter processual da medida.
Resumo Oficial
No caso, a discussão versa sobre a presença ou não dos requisitos para a concessão da medida cautelar de indisponibilidade de bens, no bojo de ação de improbidade administrativa.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.366.721/BA, DJe 19/9/2014, submetido ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973, correspondente ao art. 1.036 e seguintes do CPC de 2015, havia assentado a orientação de que, havendo indícios da prática de atos de improbidade, seria possível o deferimento da medida cautelar de indisponibilidade, sendo presumido o requisito do periculum in mora.
Por sua vez, o Tribunal de Origem, ao confirmar a decisão do juízo de primeiro grau, que indeferiu o pedido de indisponibilidade de bens diante da não demonstração do risco de ineficácia de eventual tutela ressarcitória, passou ao largo da jurisprudência pacificada nesta Corte, que dispensava o exame do requisito da urgência para o deferimento da medida cautelar, porquanto presumido.
Contudo, a nova redação sobre a matéria na Lei n. 8.429/1992, dada pela Lei n. 14.230/2021, o art. 16, caput e § 3º, da Lei 8.429/1992, advinda supervenientemente ao julgamento da Corte de origem, passou a exigir, além da plausibilidade do direito invocado, a demonstração do requisito da urgência para o deferimento da indisponibilidade de bens, em ação de improbidade administrativa, nos seguintes termos de seu § 3º: "O pedido de indisponibilidade de bens a que se refere o caput deste artigo apenas será deferido mediante a demonstração no caso concreto de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo, desde que o juiz se convença da probabilidade da ocorrência dos atos descritos na petição inicial [...]".
Dessa forma, por possuir natureza de tutela provisória de urgência cautelar, podendo ser revogada ou modificada a qualquer tempo, a decisão de indisponibilidade de bens reveste-se de caráter processual, de modo que, por força do art. 14 do CPC/2015, a norma mencionada deve ter aplicação imediata ao processo em curso. Nesse passo, é de rigor a manutenção da decisão recorrida por motivação diversa, nada vedando que novo pleito cautelar seja formulado nas instâncias ordinárias.
Tutelas no processo de improbidade administrativa
O processo de improbidade administrativa prevê duas tutelas cautelares específicas que podem ser aplicadas se presentes os requisitos legais:
Essas duas medidas têm natureza cautelar porque buscam assegurar e/ou conservar o direito até o final do processo, prevenindo o dano e garantindo o resultado útil do processo.
Com as alterações realizadas pela Lei 14.230/2021 na Lei de Improbidade Administrativa (LIA), a indisponibilidade de bens do acusado tornou-se mais difícil. As alterações buscaram evitar o que a doutrina denominava de “morte civil” do acusado, pois a medida era amplamente deferida pelos juízes e acabava causando prejuízos excessivos aos acusados por improbidade.
Atualmente, os requisitos para concessão da cautelar estão previstos no artigo 16, § 3º da LIA:
Os requisitos para concessão são:
Antes das alterações da LIA, o STJ entendia que o requisito do "periculum in mora", nos casos de improbidade, era presumido para concessão da indisponibilidade de bens do acusado. Assim, o requisito não precisava estar demonstrado, pois era presumível que o acusado buscaria se desfazer de seus bens para evitar a responsabilização por ato de improbidade ao final do processo.
Contexto
No caso concreto analisado, o autor da ação de improbidade pediu a indisponibilidade de bens dos acusado. O juiz de primeiro grau indeferiu o pedido diante da não demonstração da urgência ou do "periculum in mora". Em recurso, o Tribunal de origem manteve a decisão do juiz.
Inconformado, o autor da ação recorreu ao STJ sustentando que a decisão é contrária ao entendimento da Corte, pois nos casos de improbidade o STJ entende que a urgência da indisponibilidade de bens é presumida. Além disso, o autor alegou que as alterações na LIA não deveriam ter aplicação imediata aos processos em curso.
O que entendeu o STJ?
O STJ entendeu que, diante das alterações legislativas e expressa modificação do artigo 16, § 3º da LIA, o requisito da urgência não mais poderia ser presumido, devendo ser comprovado em cada caso concreto.
Ademais, como a medida de indisponibilidade de bens tem natureza de tutela cautelar, a natureza processual da norma é evidente. Nesse contexto, por força do artigo 14 do CPC e da Teoria do Isolamento dos Atos Processuais, a nova lei processual aplica-se imediatamente aos processos em curso, preservados os atos já concluídos sob a vigência da lei anterior.
Por isso, o STJ entendeu que a concessão da cautelar de indisponibilidade de bens, prevista no artigo 16 da Lei de Improbidade Administrativa, após as alterações da Lei nº 14.230/2021, depende da comprovação da urgência, requisito que é exigido imediatamente em razão da natureza processual da norma.