STJ - Quinta Turma
REsp 1.963.590-SP
Recurso Especial
Relator: Laurita Vaz
Julgamento: 20/09/2022
Publicação: 29/09/2022
STJ - Quinta Turma
REsp 1.963.590-SP
Tese Jurídica Simplificada
O delito de favorecimento à exploração sexual de adolescente é crime instantâneo que não exige habitualidade, configurando-se pela obtenção de anuência da criança/adolescente para práticas sexuais.
Nossos Comentários
Tese Jurídica Oficial
O delito de favorecimento à exploração sexual de adolescente não exige habitualidade. Trata-se de crime instantâneo, que se consuma no momento em que o agente obtém a anuência para práticas sexuais com a vítima menor de idade, mediante artifícios como a oferta de dinheiro ou outra vantagem, ainda que o ato libidinoso não seja efetivamente praticado.
Resumo Oficial
As normas penais que tutelam a dignidade sexual de crianças e adolescentes devem ser interpretadas à luz das obrigações internacionais assumidas pelo Brasil quanto à proteção da pessoa humana em desenvolvimento contra todas as formas de exploração sexual e das disposições constitucionais que impõem o paradigma da proteção integral.
De fato, ao ratificar a Convenção sobre os Direitos da Criança (Decreto n. 99.710/1990), o Brasil se comprometeu a adotar todas as medidas necessárias para proteger pessoas com idade inferior a 18 (dezoito) anos contra todas as formas de violência física ou mental, abuso ou tratamento negligente, maus tratos ou exploração, inclusive abuso sexual (arts. 19 e 34 da Convenção). Este compromisso internacional está em consonância com a norma constitucional que confere absoluta prioridade à proteção dos direitos da criança e do adolescente, determinando que a lei deve punir severamente o abuso, a violência e a exploração sexual contra elas praticado (art. 227, caput e § 4.º, da CF).
Nesse contexto, é inadmissível a interpretação de que o delito previsto no art. 218-B do Código Penal exija a presença de habitualidade. De fato, o simples oferecimento de vantagem pecuniária à criança ou adolescente em troca de atos sexuais configura, por si só, induzimento a situação de exploração sexual apta a justificar a tipificação da conduta.
Conforme a compreensão já consagrada pela Terceira Seção desta Corte Superior, "[q]uem, se aproveitando da idade da vítima, oferece-lhe dinheiro em troca de favores sexuais está a explorá-la sexualmente, pois se utiliza da sexualidade de pessoa ainda em formação como mercancia." (EREsp 1.530.637/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Terceira Seção, DJe 17/09/2021). Por essa razão, enquadra-se na situação de exploração sexual qualquer tipo de oferta econômica a criança ou adolescente em troca da prática de atos sexuais, mesmo que objetivando a obtenção de um único ato libidinoso ou que não haja intermediação de terceiros.
O delito de favorecimento à exploração sexual de criança ou adolescente, portanto, não exige habitualidade, tratando-se de crime instantâneo, que se consuma no momento em que o agente obtém a anuência para práticas sexuais com a vítima menor de idade, mediante artifícios como a oferta de dinheiro ou outra vantagem, ainda que o ato libidinoso não seja efetivamente praticado.
Esta interpretação da norma do art. 218-B, caput, do Código Penal é a única capaz de cumprir com a exigência de proteção integral da pessoa em desenvolvimento contra todas as formas de exploração sexual.
O Código Penal traz, no rol de crimes contra a liberdade sexual, o crime de favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável, no artigo 218-B. Trata-se de um crime classificado como hediondo pela Lei 8.072 (art. 1º, VIII).
Vejamos:
Esse crime exige, para a consumação, o contato sexual com a criança, adolescente ou vulnerável? Não. Trata-se de crime instantâneo, que se consuma quando agente simplesmente oferece à vítima dinheiro em troca de favores sexuais, obtendo sua anuência. Isso, por si só, já configura exploração sexual, mesmo que não haja o contato efetivo do autor com a vítima. Dessa forma, não é preciso que a conduta seja reiterada, habitual, para que haja configuração desse tipo penal. Uma única conduta é capaz de configurar o crime do artigo 218-B.
Essas interpretações todas, favoráveis à criança e que punem mais severamente o agente, decorrem do compromisso firmado pelo Estado Brasileiro para com o fim do abuso e exploração de crianças e adolescentes, constantes da Convenção sobre os Direitos da Criança, incorporada ao ordenamento brasileiro através do Decreto n. 99.710/1990, na qual o Brasil se comprometeu a adotar todas as medidas necessárias para proteger pessoas com idade inferior a 18 anos contra todas as formas de violência física ou mental, abuso ou tratamento negligente, maus tratos ou exploração, inclusive abuso sexual (arts. 19 e 34 da Convenção).