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STJ - Corte Especial

EREsp 1.265.625-SP

Embargos de Divergência em Recurso Especial

Relator: Francisco Falcão

Julgamento: 30/03/2022

Publicação: 04/04/2022

STJ - Corte Especial

EREsp 1.265.625-SP

Tese Jurídica Simplificada

Se a União ingressa em um processo na condição de assistente simples, como existe interesse jurídico, a competência para julgamento de embargos de declaração opostos contra acórdão proferido pela Justiça Estadual é da Justiça Federal (art. 109, I, da CF),

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Caso

O caso envolve ação declaratória de extinção contratual cumulada com pedido de indenização em face da Petrobras Distribuidora S/A (BR Distribuidora), que acabou sendo condenada pela Justiça estadual (TJSP) ao pagamento de indenização bilionária a uma rede de postos de combustíveis.

Nesse contexto, a BR Distribuidora opôs embargos de declaração, que foram rejeitados pelo TJSP. Diante disso, a empresa apresentou recurso especial perante o STJ alegando violação do art. 535 do CPC/73 (art. 1.022 do CPC/2015). Após a instauração da competência do STJ, a União manifestou interesse em figurar na causa como assistente simples. A Quarta Turma do STJ deu provimento ao recurso da Petrobras e determinou o retorno dos autos ao TJSP.

Diante disso, a União opôs embargos de declaração pedindo o deslocamento do processo para o TRF3, considerando a competência absoluta da Justiça Federal em razão de sua intervenção no processo. A Quarta Turma negou provimento aos embargos aplicando o art. 43 do CPC/2015, segundo o qual:

Art. 43. Determina-se a competência no momento do registro ou da distribuição da petição inicial, sendo irrelevantes as modificações do estado de fato ou de direito ocorridas posteriormente, salvo quando suprimirem órgão judiciário ou alterarem a competência absoluta.

A Turma entendeu que se as decisões de mérito foram proferidas pela Justiça estadual, não seria possível uma revisão por parte da Justiça Federal.

Inconformada, a União apresentou embargos de divergência sob o argumento de que a decisão da Quarta Turma divergiu de decisão proferida pela Segunda Turma, a qual, em situação parecida, determinou a remessa do processo à Justiça Federal por conta da admissão da União como assistente simples.

No âmbito do STJ, os embargos de divergência têm a finalidade de uniformizar a jurisprudência interna. É um recurso voltado a controvérsias jurídicas de mérito em que os colegiados do tribunal, ao tratarem sobre o mesmo assunto e aplicarem a mesma legislação federal, tenham decidido de formas diferentes. 

Sendo assim, surge a seguinte controvérsia: com o ingresso da União no processo como assistente simples, a competência passa a ser da Justiça Federal ou continua sendo da Justiça estadual?

Competência

As diferentes interpretações dadas pela Quarta Turma e pela Segunda Turma do STJ podem ser assim resumidas:

Quarta Turma Segunda Turma
É aplicável o art. 43 do CPC (regra da perpetuatio jurisdictionis) em favor do TJSP, a fim de evitar deslocamentos indesejáveis de foro. Ainda, como as decisões de mérito foram proferidas pela Justiça Estadual, tanto no 1º como no 2º grau de jurisdição, não existe a possibilidade de revisão pela Justiça Federal. Havendo intervenção da União na demanda, bem como o provimento do recurso por ofensa ao art. 535 do CPC, os autos devem ser remetidos não ao Tribunal de origem, mas sim ao Tribunal Regional Federal da circunscrição, respeitando o disposto no art. 109, I, da CF, sob pena de nulidade de qualquer ato decisório praticado em relação à União no foro estadual.

No caso em questão, a Corte Especial entendeu que deve prevalecer o entendimento da Segunda Turma. 

Segundo o art. 5º, parágrafo único, da Lei 9.469/1997:

Art. 5º A União poderá intervir nas causas em que figurarem, como autoras ou rés, autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas federais.

Parágrafo único. As pessoas jurídicas de direito público poderão, nas causas cuja decisão possa ter reflexos, ainda que indiretos, de natureza econômica, intervir, independentemente da demonstração de interesse jurídico, para esclarecer questões de fato e de direito, podendo juntar documentos e memoriais reputados úteis ao exame da matéria e, se for o caso, recorrer, hipótese em que, para fins de deslocamento de competência, serão consideradas partes.

Esse dispositivo traz uma modalidade da intervenção anômala, pois possibilita que as pessoas jurídicas de direito público que figurarem como parte em uma demanda, intervenham de maneira ampla, sem a necessidade de demonstrar interesse jurídico, bastando que os atos realizados no processo possam lhes gerar algum reflexo, ainda que meramente econômico.

Segundo entendimento do STJ, a intervenção anômala da União não é causa para o deslocamento da competência para a Justiça Federal.

Segundo o CPC/2015 (arts. 119 a 123), o assistente simples deve atuar como auxiliar da parte principal, exercendo os mesmos poderes e sujeitando-se aos mesmos ônus processuais que o assistido. O art. 119 traz os pressupostos de admissibilidade da assistência, quais sejam:

(i) a existência de uma relação jurídica entre uma das partes do processo e o terceiro;

(ii) a possibilidade de a sentença influenciar na relação jurídica.

Assim, na assistência simples, o terceiro interessado precisa ter interesse jurídico na causa, diferentemente da intervenção anômala, na qual basta somente o interesse de natureza econômica.

No caso em questão, a União foi admitida no processo na qualidade de assistente simples e em decisão que não foi objeto de recurso. Nesses casos de intervenção, o interesse jurídico na causa deve estar presente e assim foi reconhecido.

O interesse jurídico da União está presente, considerando que reflete em evidente interesse público demonstrado - que é o abastecimento nacional de combustíveis, considerado de utilidade pública (art. 1º, §1º, da Lei 9.847/99), uma vez que, com a condenação da BR Distribuidora (assistida), poderá ser afetada a continuidade de suas atividades e, consequentemente, a atividade de distribuição de combustíveis no âmbito nacional.

O art. 109, I, da CF dispõe que:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

Conforme o dispositivo, existindo interesse da União no feito, na condição de assistente simples, a competência é da Justiça Federal, motivo pelo qual devem ser acolhidos os embargos de declaração opostos pela União para determinar a baixa não mais ao Tribunal de origem (TJSP), mas ao Tribunal Regional Federal competente para a análise do feito. Não é importante o fato de que o acórdão a ser integrado foi proferido pelo Juízo estadual, uma vez que se trata de matéria de competência absoluta, não se sujeitando à perpetuatio jurisdictionis, conforme expresso no art. 43 do CPC, parte final. 

Sendo assim, deve prevalecer o entendimento da Segunda Turma do STJ, a fim de reconhecer a competência da Justiça Federal, sendo o TRF competente para o novo julgamento dos embargos de declaração.

Em resumo, se a União ingressa em um processo na condição de assistente simples, como existe interesse jurídico, a competência para julgamento de embargos de declaração opostos contra acórdão proferido pela Justiça Estadual é da Justiça Federal (art. 109, I, da CF).

Tese Jurídica Oficial

Existindo interesse jurídico da União no feito, na condição de assistente simples, a competência afigura-se da Justiça Federal, conforme prevê o art. 109, I, da Constituição da República, motivo pelo qual compete ao Tribunal Regional Federal o julgamento de embargos de declaração opostos contra acórdão proferido pela Justiça Estadual.

Resumo Oficial

Trata-se de embargos de divergência que visam a compor o antagonismo de interpretações dadas quanto à necessidade ou não de seguimento do feito na Justiça Federal ante a intervenção da União na demanda, na qualidade de assistente simples pela Quarta e Segunda Turmas do Superior Tribunal de Justiça.

No caso, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do agravo interno deu provimento ao recurso especial, acolhendo a alegação de violação do art. 535 do CPC/1973 (atual art. 1.022 do CPC/2015), determinando o retorno dos autos ao Tribunal de origem - Tribunal de Justiça do Estado.

A União ingressou no processo na qualidade de assistente, logo após a interposição de agravo interno pela assistida, interpôs embargos de declaração objetivando reparo de ordem processual no que tange à determinação de retorno dos autos ao Tribunal de origem, uma vez que, ao reconhecer a União como assistente simples, a remessa dos autos deveria ser determinada ao Tribunal Regional Federal.

À luz da interpretação dada pela Quarta Turma, no caso em comento seria aplicável o art. 43 do CPC, que estabelece a regra da perpetuatio jurisdictionis em favor do Tribunal de Justiça, para se evitar deslocamentos indesejáveis do foro, consignando ainda que, tendo as decisões de mérito sido proferidas pela Justiça Estadual, tanto no 1º como no 2º grau de jurisdição, não há que se falar em possibilidade revisional pela Justiça Federal.

Por outro lado, entende a Segunda Turma, no julgamento do AgRg na RCDESP no REsp n. 556.382/DF, sendo relator para o acórdão o Ministro Herman Benjamin, que, havendo a intervenção da União na demanda, bem como o provimento do recurso por ofensa ao art. 535 do CPC, a remessa dos autos deve ser feita não mais ao Tribunal de Origem, mas sim ao Tribunal Regional Federal da circunscrição, de modo a respeitar efetivamente o art. 109, I, da Constituição Federal, sob pena de nulidade de qualquer ato decisório praticado em relação à União no foro estadual.

No caso, deve prevalecer o entendimento da Segunda Turma.

O art. 5º, parágrafo único, da Lei n. 9.469/1997 traz em sua redação a previsão legal da modalidade da intervenção anômala. Referida norma legal possibilita que, nas demandas que figurarem como parte - na qualidade de autoras ou rés - autarquias, fundações públicas, sociedades de economia mista e empresas públicas, a União e demais pessoas jurídicas de direito público intervenham de maneira ampla, não sendo necessária a demonstração de interesse jurídico, bastando que os atos realizados no processo possam lhes gerar algum reflexo, ainda que meramente econômico.

Outrossim, no que diz respeito à competência por ocasião da ocorrência da intervenção anômala, conforme entendimento desta Corte Superior, a intervenção anômala da União no processo não é causa para o deslocamento da competência para a Justiça Federal.

A assistência simples, por seu turno, encontra previsão nos arts. 119 a 123 do Código de Processo Civil/2015. Nos termos do referido código, o assistente simples deve atuar como auxiliar da parte principal, na qual exercerá os mesmos poderes e sujeitar-se-á aos mesmos ônus processuais que o assistido, sendo ainda que do art. 119 extraem-se pressupostos de admissibilidade da assistência, quais sejam: i) a existência de uma relação jurídica entre uma das partes do processo e o terceiro e; ii) a possibilidade de a sentença influir na relação jurídica.

Dessa forma, verifica-se que, na assistência simples, pela própria dicção do Código de Processo Civil, o terceiro interessado necessita ter interesse jurídico na causa, diferentemente do que ocorre na intervenção anômala, na qual basta, tão somente, o interesse meramente de natureza econômica.

No caso em análise, no momento da admissão da habilitação da União na demanda, esta foi realizada na qualidade de assistente simples e em decisão que passou irrecorrida, sendo que, conforme anteriormente citado, nesses casos de intervenção, o interesse jurídico na causa deve estar presente e assim o fora reconhecido.

O interesse jurídico específico da União a ser tutelado encontra-se presente, tendo em conta que reflete em evidente interesse público demonstrado - consubstanciado no abastecimento nacional de combustíveis, considerado de utilidade pública, conforme § 1º do art. 1º da Lei n. 9.847/1999, uma vez que, com a condenação da assistida, poderá ser afetada a continuidade das atividades desta e, consequentemente a atividade de distribuição de combustíveis no âmbito nacional, sendo que a alienação de participação societária noticiada não tem o condão de desconstituir tal interesse.

Com efeito, o art. 109, I, da Constituição Federal dispõe que compete à Justiça Federal processar e julgar as causas em que a União for interessada na condição de autora, ré, assistente ou oponente, fato que implicaria a remessa dos autos ao Juízo federal. Assim, existindo o interesse da União no feito, na condição de assistente simples, a competência afigura-se como da Justiça Federal, conforme prevê o art. 109, I, da Constituição Federal, motivo pelo qual devem ser acolhidos os embargos de declaração opostos pela União para determinar a baixa não mais ao Tribunal de origem, mas ao Tribunal Regional Federal competente para a análise do feito, para o que desinfluente o fato de que o acórdão a ser integrado fora proferido no Juízo estadual, uma vez que se trata de matéria atinente à competência absoluta, não sujeita à perpetuatio jurisdictionis, consoante expresso no art. 43 do CPC, parte final, tudo nos termos do paradigma.

Dessa forma, deve prevalecer o entendimento dado pela Segunda Turma do STJ, reconhecer a competência da Justiça Federal, sendo o Tribunal Regional Federal competente para novo julgamento dos embargos de declaração.

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