STF - Plenário

ADPF 976 MC-Ref-DF

Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

Relator: Alexandre de Moraes

Julgamento: 21/08/2023

Publicação: 21/09/2023

Você não completou esse conteúdo
Marcar como completo
Favoritar
Imprimir em PDF

STF - Plenário

ADPF 976 MC-Ref-DF

Tese Jurídica

Estão presentes os pressupostos necessários para a concessão da medida cautelar (fumaça do bom direito e perigo da demora na efetivação de uma decisão judicial), eis que: (i) a discussão acerca das condições precárias de vida da população em situação de rua no Brasil demanda uma reestruturação institucional que decorre de um quadro grave e urgente de desrespeito a direitos humanos fundamentais; e (ii) a violação maciça de direitos humanos — a indicar um potencial estado de coisas inconstitucional — impele o Poder Judiciário a intervir, mediar e promover esforços para estabelecer uma estrutura adequada de enfrentamento.

Vídeos

Ops...

Esse vídeo está disponível apenas para assinantes!

Assine Agora!

Nossos Comentários

Ops...

Os comentários estão disponíveis apenas para assinantes!

Assine Agora!

Resumo Oficial

Estão presentes os pressupostos necessários para a concessão da medida cautelar (fumaça do bom direito e perigo da demora na efetivação de uma decisão judicial), eis que: (i) a discussão acerca das condições precárias de vida da população em situação de rua no Brasil demanda uma reestruturação institucional que decorre de um quadro grave e urgente de desrespeito a direitos humanos fundamentais; e (ii) a violação maciça de direitos humanos — a indicar um potencial estado de coisas inconstitucional — impele o Poder Judiciário a intervir, mediar e promover esforços para estabelecer uma estrutura adequada de enfrentamento.

A atenção à população em situação de rua deve ser realizada com o intuito de: (i) evitar a entrada nas ruas; (ii) garantir direitos enquanto o indivíduo está em situação de rua; e (iii) promover condições para a saída das ruas.

No âmbito da medida cautelar em análise, também se consideraram, entre outros fatores: (i) os desafios do retorno da população em situação de rua à educação escolar, que vão além da falta de acesso a programas; (ii) os obstáculos relacionados à reinserção no mercado de trabalho; (iii) a “aporofobia”, entendida como violadora dos objetivos fundamentais, em especial o relacionado ao combate a todas as formas de discriminação (CF/1988, art. 3º, IV); (iv) o direito à identidade além do mero registro; (v) o acolhimento institucional e o direito fundamental à moradia; (vi) a presença de atos comissivos e omissivos, imputados a agentes públicos e pessoas privadas, que atentam flagrantemente contra a dignidade dessa população; (vii) a necessidade de medidas paliativas que impulsionem a construção de respostas estatais duradouras; e (viii) a necessidade de elaboração de um estudo capaz de delinear todas as nuances que permeiam o problema crônico social em debate, para evitar políticas desassociadas do espaço e do tempo de aplicação.

Nesse contexto, os estados, o Distrito Federal e os municípios devem, de modo imediato, observar, obrigatoriamente e independentemente de adesão formal, as diretrizes contidas no Decreto federal 7.053/2009, que institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua, em conjunto e nos moldes das determinações estabelecidas na parte dispositiva da decisão desta Corte.

O mencionado decreto deve ser interpretado como pormenorização efetiva de comandos constitucionais, a ser aplicado de forma a atingir todos os entes subnacionais. Essa aplicação nacional também promove preceitos constitucionais conformadores da assistência social que asseguram ao ente federal as competências de coordenar ações governamentais e estabelecer normas gerais, atribuições reproduzidas na Lei 8.742/1993.

Além disso, visando à construção de uma solução robusta e duradoura, é necessário mobilizar os demais Poderes, mais afeitos às especificidades das políticas públicas.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, referendou a cautelar anteriormente concedida para o fim de tornar obrigatória a observância, pelos estados, Distrito Federal e municípios, imediata e independentemente de adesão formal, das diretrizes contidas no Decreto federal 7.053/2009, que institui a Política Nacional para a População em Situação de Rua, bem como determinar:

(I) A formulação pelo Poder Executivo federal, no prazo de 120 dias, do Plano de Ação e Monitoramento para a Efetiva Implementação da Política Nacional para a População em Situação de Rua, com a participação, dentre outros órgãos, do Comitê intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Política Nacional para População em Situação de Rua (CIAMP-Rua), do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), da Defensoria Pública da União (DPU) e do Movimento Nacional da População em Situação de Rua. O plano deverá, no mínimo, conter os seguintes tópicos: 

(a) Elaboração de um diagnóstico atual da população em situação de rua, com identificação do perfil, da procedência e de suas principais necessidades, entre outros elementos a amparar a construção de políticas públicas voltadas ao segmento;
(b) Criação de instrumentos de diagnóstico permanente da população em situação de rua;
(c) Desenvolvimento de mecanismos para mapear a população em situação de rua no censo realizado pelo IBGE;
(d) Estabelecimento de meios de fiscalização de processos de despejo e de reintegração de posse no País, e seu impacto no tamanho da população em situação de rua;
(e) Elaboração de diretrizes para a intervenção do Poder Público, pautadas no tratamento humanizado e não violento da população em situação de rua, englobando, entre outros, a formação e o treinamento de agentes públicos, bem como as formas de abordagens específicas aos “hiperhipossuficientes”;
(f) Elaboração de programas de capacitação e de sensibilização de agentes públicos das áreas da saúde, assistência social, educação, segurança pública, justiça, entre outras, para atuarem junto à população em situação de rua;
(g) Incorporação, na Política Nacional de Habitação, das demandas da população em situação de rua; 
(h) Análise de programas de transferência de renda e sua capilaridade em relação à população em situação de rua;
(i) Previsão de um canal direto de denúncias contra violência;
(j) Elaboração de medidas para garantir padrões mínimos de qualidade nos centros de acolhimento, resguardando a higiene e a segurança dos locais;
(l) Desenvolvimento de programas de prevenção de suicídio junto à população em situação de rua;
(m) Elaboração de programas educacionais e de conscientização pública sobre a aporofobia e sobre a população em situação de rua;
(n) Formulação de políticas para fomentar a saída da rua através de programas de emprego e de formação para o mercado de trabalho;
(o) Elaboração de medidas para o fortalecimento de políticas públicas voltadas a moradia, trabalho, renda, educação e cultura de pessoas em situação de rua;
(p) Indicação de possíveis incentivos fiscais para a contratação de trabalhadores em situação de rua. 
(II) Aos Poderes Executivos municipais e distrital, bem como onde houver atuação, aos Poderes Executivos federal e estaduais que, no âmbito de suas zeladorias urbanas e nos abrigos de suas respectivas responsabilidades:
(a) Efetivem medidas que garantam a segurança pessoal e dos bens das pessoas em situação de rua dentro dos abrigos institucionais existentes;
(b) Disponibilizem o apoio das vigilâncias sanitárias para garantir abrigo aos animais de pessoas em situação de rua;
(c) Proíbam o recolhimento forçado de bens e pertences, assim como a remoção e o transporte compulsório de pessoas em situação de rua;
(d) Vedem o emprego de técnicas de arquitetura hostil contra as populações em situação de rua, bem como efetivem o levantamento das barreiras e equipamentos que dificultam o acesso a políticas e serviços públicos, assim como mecanismos para superá-las;
(e) No âmbito das zeladorias urbanas:
(e1) Divulguem previamente o dia, o horário e o local das ações de zeladoria urbana nos seus respectivos sites, nos abrigos, e outros meios em atendimento ao princípio da transparência dos atos da Administração Pública, permitindo assim que a pessoa em situação de rua recolha seus pertences e que haja a limpeza do espaço sem conflitos;
(e2) Prestem informações claras sobre a destinação de bens porventura apreendidos, o local de armazenamento dos itens e o procedimento de recuperação do bem;
(e3) Promovam a capacitação dos agentes com vistas ao tratamento digno da população em situação de rua, informando-os sobre as instâncias de responsabilização penal e administrativa;
(e4) Garantam a existência de bagageiros para as pessoas em situação de rua guardarem seus pertences;
(e5) Determinem a participação de agentes de serviço social e saúde em ações de grande porte;
(e6) Disponibilizem bebedouros, banheiros públicos e lavanderias sociais de fácil acesso para população em situação de rua; 
(e7) Realizem inspeção periódica dos centros de acolhimento para garantir, entre outros, sua salubridade e sua segurança;
(f) Realização periódica de mutirões da cidadania para a regularização de documentação, inscrição em cadastros governamentais e inclusão em políticas públicas existentes;
(g) Criação de um programa de enfrentamento e prevenção à violência que atinge a população em situação de rua; 
(h) Formulação de um protocolo intersetorial de atendimento na rede pública de saúde para a população em situação de rua;
(i) Ampla disponibilização e divulgação de alertas meteorológicos, por parte das Defesas Civis de todos os entes federativos, para que se possam prever as ondas de frio com a máxima antecedência e prevenir os seus impactos na população em situação de rua;
(j) Disponibilização imediata: 
(j1) Pela defesa civil, de barracas para pessoas em situação de rua com estrutura mínima compatível com a dignidade da pessoa humana, nos locais nos quais não há número de vagas em número compatível com a necessidade;
(j2) A disponibilização de itens de higiene básica à população em situação de rua.
(III) Aos Poderes Executivos municipais e distrital, no prazo de 120 dias, a realização de diagnóstico pormenorizado da situação nos respectivos territórios, com a indicação do quantitativo de pessoas em situação de rua por área geográfica, quantidade e local das vagas de abrigo e de capacidade de fornecimento de alimentação. 

Encontrou um erro?

Onde Aparece?