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STJ - Quinta Turma

AgRg no HC 804.741-MS

Agravo Regimental no Habeas Corpus

Relator: Reynaldo Soares da Fonseca

Julgamento: 14/03/2023

Publicação: 17/03/2023

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STJ - Quinta Turma

AgRg no HC 804.741-MS

Tese Jurídica

Não se admite o distinguishing realizado no julgamento do AgRg no REsp 1.919.722/SP - caso de dois jovens namorados, cujo relacionamento foi aprovado pelos pais da vítima, sobrevindo um filho e a efetiva constituição de núcleo familiar - nas hipóteses em que não há consentimento dos responsáveis legais somado ao fato do acusado possuir gritante diferença de idade da vítima - o que invalida qualquer relativização da presunção de vulnerabilidade do menor de 14 anos no crime de estupro de vulnerável.

Nossos Comentários

O crime de estupro de vulnerável é um crime sexual previsto no Código Penal, no artigo 217-A.

Art. 217-A.  Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos:     

Pena - reclusão, de 8 a 15 anos.

§ 1º  Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.           

(...)

§ 5º  As penas previstas no caput e nos §§ 1º, 3º e 4º deste artigo aplicam-se independentemente do consentimento da vítima ou do fato de ela ter mantido relações sexuais anteriormente ao crime.

Podemos portanto resumir os tipos de vulnerabilidade que permitem a aplicação desse tipo penal nas seguintes:

  • Menor de 14 anos, independente de consentimento;
  • Pessoas com deficiência cognitiva, ou com diença que não permite que expressem sua vontade;
  • Pessoa que não consegue oferecer resistência ao ato.

Quando a pessoa menor de 14 anos se relaciona sexualmente com alguém, não se analisa o consentimento, uma vez que há presunção de que a pessoa, pela imaturidade advinda da tenra idade, não é capaz de consentir.

Quer dizer que toda e qualquer relação sexual envolvendo menor de 14 anos é necessariamente enquadrada como estupro de vulnerável? A jurisprudência tem atenuado isso. Há alguns casos específicos que os Tribunais vêm considerando a não incidência desse tipo, mesmo envolvendo relação com menor de 14 anos. No AgRg no REsp 1.919.722-SP, o STJ entendeu que não houve estupro de vulnerável na relação de dois jovens namorados, cujo relacionamento foi aprovado pelos pais da vítima, sobrevindo um filho e a efetiva constituição de núcleo familiar.

No caso em questão, contudo, o Tribunal entendeu que o fato foi típico, pelos seguintes fatos:

  • A vítima não teve consentimento dos pais (aliás, os mais nem sabiam da relação)
  • O agente é 36 anos mais velho do que a vítima e todas as relações que mantiveram foi em local desvigiado, às escondidas, em sua propriedade rural;
  • A vítima, depois de relacionar-se com o agente, demonstrou comportamento agressivo, diferente do que sempre apresentava.

Por isso, o STJ entendeu que não há, no caso, possibilidade de relativização da presunção de vulnerabilidade da vítima.

Resumo Oficial

De início, reitera-se que, nos termos da Súmula n. 593/STJ, o consentimento da vítima menor de 14 anos e o seu namoro com o acusado não afastam a existência do delito de estupro de vulnerável.

Nessa linha de intelecção, a jurisprudência deste Tribunal Superior tem sistematicamente rejeitado a tese de que a presunção de violência - termo que nem é mais utilizado na atual redação do CP - no estupro de vulnerável pode ser relativizada à luz do caso concreto (AgRg no REsp 1.934.812-TO, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 14/9/2021, DJe de 20/9/2021).

Na hipótese, conforme fundamentadamente apontado pela Corte local, o caso não se amolda ao distinguishing realizado no julgamento do AgRg no REsp 1.919.722-SP, de minha relatoria - caso de dois jovens namorados, cujo relacionamento foi aprovado pelos pais da vítima, sobrevindo um filho e a efetiva constituição de núcleo familiar - tendo em vista que a relação amorosa não foi consentida pela genitora da vítima, tanto que, ao tomar conhecimento de que sua filha estava se relacionando com o paciente, acionou o Conselho Tutelar e registrou os fatos na Delegacia de Polícia.

Ademais, a genitora da menor relatou que sua filha, após se relacionar com o acusado, apresentou comportamento agressivo, além de reprovar de ano na escola, tendo de ser submetida a tratamento psicológico. Somado a isso, conforme foi consignado pelo magistrado de primeiro grau, que se encontra mais próximo dos fatos, a vítima e o acusado tinham a gritante diferença de 36 (trinta e seis) anos. Apontou que a própria vítima e a sua genitora mencionaram espontaneamente que as relações aconteciam na chácara do acusado, localizada em área rural. Assim, mesmo ciente da tenra idade da vítima e do não consentimento de sua responsável legal, o acusado manteve relação sexual com a menor.

São, portanto, plenamente válidas a Súmula n. 593 do Superior Tribunal de Justiça e a tese do REsp repetitivo 1.480.881/PI (Tema 1121) sobre a impossibilidade de relativização da presunção de vulnerabilidade da vítima.

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