Embora não configure o crime de abuso de autoridade, mesmo que realizada a diligência depois das 5h e antes das 21h, continua sendo ilegal e sujeito à sanção de nulidade cumprir mandado de busca e apreensão domiciliar se for noite.
A controvérsia gira em torno de saber se, depois do advento do art. 22, III, da Lei n. 13.869/2019 (Lei de Abuso de Autoridade), passou a ser válido o cumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar no período compreendido entre 5h e 21h.
De acordo com o disposto no art. 5º, XI, da Constituição, "a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial".
O art. 245, caput, do CPP, no mesmo sentido, estabelece que "As buscas domiciliares serão executadas de dia, salvo se o morador consentir que se realizem à noite, e, antes de penetrarem na casa, os executores mostrarão e lerão o mandado ao morador, ou a quem o represente, intimando-o, em seguida, a abrir a porta".
A interpretação desses dispositivos sempre gerou intensa celeuma no que concerne à definição dos conceitos de "dia" e de "noite" para fins de cumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar (critérios cronológico, físico-astronômico e misto).
O advento do art. 22, III, da Lei n. 13.869/2019 deu origem a uma nova corrente, no sentido de que, ao tipificar como crime de abuso de autoridade o cumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar entre 21h e 5h, o legislador haveria implicitamente regulamentado o art. 5º, XI, da Constituição e o art. 245 do CPP, para definir como "dia" o período entre 5h e 21h.
Todavia, o art. 22, III, da Lei n. 13.869/2019 não definiu os conceitos de "dia" e de "noite" para fins de cumprimento do mandado de busca e apreensão domiciliar. O que ocorreu foi apenas a criminalização de uma conduta que representa violação tão significativa da proteção constitucional do domicílio a ponto de justificar a incidência excepcional do direito penal contra aqueles que a praticarem. É dizer, o fato de que o cumprimento de mandado de busca domiciliar entre 21h e 5h foi criminalizado não significa que a realização da diligência em qualquer outro horário seja plenamente lícita e válida para todos os fins.
Assim, mesmo que realizada a diligência depois das 5h e antes das 21h, continua sendo ilegal e sujeito à sanção de nulidade cumprir mandado de busca e apreensão domiciliar se for noite, embora não configure o crime de abuso de autoridade previsto no art. 22, III, da Lei n. 13.869/2019.
Vale mencionar, ainda, a reforçar essa interpretação, recente e importante decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Valencia Campos y otros v. Bolívia, julgado em 18 de outubro de 2022, em que o tema da temeridade do ingresso domiciliar em período noturno foi abordado com especial destaque.
Em voto concorrente para a condenação do Estado boliviano por violação da Convenção Americana de Direitos Humanos, o Juiz Rodrigo Mudrovitsch e a Juíza Nancy Hernández López pontuaram que, "as invasões policiais noturnas se afiguram incompatíveis com a Convenção e com os standards desta Corte, sendo admissíveis tão somente em situações absolutamente excepcionais e, acima de tudo, previstas de forma clara e taxativa na Constituição ou na Lei, e requerendo motivação reforçada que justifique as razões pelas quais não se pode realizar a diligência no horário diurno. Em outras palavras, não podem ser encaradas pelos Estados como procedimentos corriqueiros da atividade de persecução penal, à livre disposição dos operadores da justiça, e sim como instrumentos que configuram uma das mais graves intervenções na esfera de direitos dos indivíduos. Por essa razão, as invasões noturnas só são justificáveis mediante a mais rigorosa observância cumulativa dos ditames da legalidade e da proporcionalidade em todas as suas dimensões".
A controvérsia gira em torno de saber se, depois do advento do art. 22, III, da Lei n. 13.869/2019 (Lei de Abuso de Autoridade), passou a ser válido o cumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar no período compreendido entre 5h e 21h.
De acordo com o disposto no art. 5º, XI, da Constituição, "a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial".
O art. 245, caput, do CPP, no mesmo sentido, estabelece que "As buscas domiciliares serão executadas de dia, salvo se o morador consentir que se realizem à noite, e, antes de penetrarem na casa, os executores mostrarão e lerão o mandado ao morador, ou a quem o represente, intimando-o, em seguida, a abrir a porta".
A interpretação desses dispositivos sempre gerou intensa celeuma no que concerne à definição dos conceitos de "dia" e de "noite" para fins de cumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar (critérios cronológico, físico-astronômico e misto).
O advento do art. 22, III, da Lei n. 13.869/2019 deu origem a uma nova corrente, no sentido de que, ao tipificar como crime de abuso de autoridade o cumprimento de mandado de busca e apreensão domiciliar entre 21h e 5h, o legislador haveria implicitamente regulamentado o art. 5º, XI, da Constituição e o art. 245 do CPP, para definir como "dia" o período entre 5h e 21h.
Todavia, o art. 22, III, da Lei n. 13.869/2019 não definiu os conceitos de "dia" e de "noite" para fins de cumprimento do mandado de busca e apreensão domiciliar. O que ocorreu foi apenas a criminalização de uma conduta que representa violação tão significativa da proteção constitucional do domicílio a ponto de justificar a incidência excepcional do direito penal contra aqueles que a praticarem. É dizer, o fato de que o cumprimento de mandado de busca domiciliar entre 21h e 5h foi criminalizado não significa que a realização da diligência em qualquer outro horário seja plenamente lícita e válida para todos os fins.
Assim, mesmo que realizada a diligência depois das 5h e antes das 21h, continua sendo ilegal e sujeito à sanção de nulidade cumprir mandado de busca e apreensão domiciliar se for noite, embora não configure o crime de abuso de autoridade previsto no art. 22, III, da Lei n. 13.869/2019.
Vale mencionar, ainda, a reforçar essa interpretação, recente e importante decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Valencia Campos y otros v. Bolívia, julgado em 18 de outubro de 2022, em que o tema da temeridade do ingresso domiciliar em período noturno foi abordado com especial destaque.
Em voto concorrente para a condenação do Estado boliviano por violação da Convenção Americana de Direitos Humanos, o Juiz Rodrigo Mudrovitsch e a Juíza Nancy Hernández López pontuaram que, "as invasões policiais noturnas se afiguram incompatíveis com a Convenção e com os standards desta Corte, sendo admissíveis tão somente em situações absolutamente excepcionais e, acima de tudo, previstas de forma clara e taxativa na Constituição ou na Lei, e requerendo motivação reforçada que justifique as razões pelas quais não se pode realizar a diligência no horário diurno. Em outras palavras, não podem ser encaradas pelos Estados como procedimentos corriqueiros da atividade de persecução penal, à livre disposição dos operadores da justiça, e sim como instrumentos que configuram uma das mais graves intervenções na esfera de direitos dos indivíduos. Por essa razão, as invasões noturnas só são justificáveis mediante a mais rigorosa observância cumulativa dos ditames da legalidade e da proporcionalidade em todas as suas dimensões".