REsp 2.111.839-RS

STJ Quarta Turma

Recurso Especial

Relator: Antonio Carlos Ferreira

Julgamento: 06/05/2025

Tese Jurídica Simplificada

A transmissão hereditária, por si só, não descaracteriza o bem de família, desde que preservadas as condições de imóvel residencial da entidade familiar.

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Tese Jurídica Oficial

A transmissão hereditária, por si, não tem a capacidade de desconfigurar ou afastar a natureza de bem de família, se mantidas as características de imóvel residencial próprio da entidade familiar.

Cinge-se a controvérsia em definir se o imóvel residencial pertencente ao espólio, no qual residem herdeiros do falecido, pode ser objeto de constrição judicial para garantir dívida contraída pelo autor da herança, ou se o bem está protegido pela impenhorabilidade do bem de família.

A impenhorabilidade do bem de família representa instituto jurídico de extrema relevância no ordenamento brasileiro, funcionando como instrumento de salvaguarda de valores constitucionais essenciais. Esta proteção legal transcende a mera garantia patrimonial para materializar princípios fundamentais da ordem constitucional.

Segundo dispõem os arts. 1º, 3º e 5º da Lei n. 8.009/1990, a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, desde que seja o único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente.

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que o benefício conferido pela Lei n. 8.009/1990 constitui norma cogente, que contém princípio de ordem pública, e sua incidência somente é afastada nas hipóteses taxativamente descritas no art. 3º da mesma lei. Isso porque as exceções à impenhorabilidade devem ser interpretadas restritivamente, em consonância com a proteção constitucional ao direito de moradia.

Quanto à responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas do falecido, conforme previsto no art. 1.997 do Código Civil, "a herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido; mas, feita a partilha, só respondem os herdeiros, cada qual em proporção da parte que na herança lhe coube".

Entretanto, essa regra não tem o efeito de afastar a proteção conferida pela Lei n. 8.009/1990 ao bem de família. Assim como o bem de família estaria protegido se o falecido estivesse vivo, também está protegido se transmitido aos herdeiros, desde que mantidos os requisitos estabelecidos nos arts. 1º, 3º e 5º da referida lei.

Imprescindível destacar que, por força do princípio da saisine, previsto no art. 1.784 do Código Civil, "aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários". Este princípio estabelece uma ficção jurídica, segundo a qual os herdeiros substituem o de cujus na titularidade do patrimônio hereditário, assumindo-o na mesma condição jurídica que o autor da herança detinha.

Dessa forma, se os herdeiros se sub-rogam na posição jurídica do falecido, naturalmente também recebem as proteções legais que amparavam o autor da herança, entre elas a impenhorabilidade do bem de família.

Desse modo, não subsiste o principal fundamento da Corte de origem para negar a proteção do bem de família, consistente na alegação de que a ausência de partilha formal e a permanência do registro do imóvel em nome do de cujus impediria invocar a proteção do bem de família aos sucessores. Isso porque a transmissão hereditária, por si, não tem a capacidade de desconfigurar ou afastar a natureza de bem de família, se mantidas as características de imóvel residencial próprio da entidade familiar.

A caracterização do bem de família decorre das circunstâncias fáticas de sua utilização como residência familiar, e não de aspectos formais registrais ou da realização de partilha. Logo, a mera ausência de averbação da partilha na matrícula imobiliária não tem o efeito de desnaturar a proteção conferida ao bem.

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