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STJ - Quarta Turma

REsp 2.095.475-SP

Recurso Especial

Relator: Antonio Carlos Ferreira

Julgamento: 09/04/2024

STJ - Quarta Turma

REsp 2.095.475-SP

Tese Jurídica Simplificada

O vício de voto, na hipótese de acionista votar em assembleia-geral de sociedade anônima para aprovar suas próprias contas como administrador, conduz à anulabilidade da operação autorizada, porém, para responsabilização do administrador, é necessária a prévia desconstituição da assembleia que autorizou a operação.

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Tese Jurídica Oficial

O vício de voto, na hipótese de acionista votar nas deliberações de assembleia-geral de sociedade anônima relativa à aprovação de suas próprias contas como administrador, conduz a sanção de anulabilidade, sendo necessária a prévia desconstituição da assembleia para que se autorize a responsabilização do sócio administrador.

Resumo Oficial

Ação de responsabilidade proposta por acionistas minoritários em que pleiteiam a condenação dos administradores a indenizar a companhia pelos prejuízos decorrentes de venda de imóvel em montante substancialmente inferior ao seu efetivo potencial econômico.

Realizada a assembleia de aprovação das contas com participação do sócio administrador por intermédio de pessoa jurídica à qual havia transferido a totalidade de sua participação societária às vésperas do conclave, violou-seo a proibição prevista no art. 115, § 1º, da Lei n. 6.404/1976.

Acerca do regime das invalidades das deliberações assembleares, há significativa divergência sobre a aplicabilidade estrita das normas societárias, a incidência do regime civil das invalidades ou sua regência por um regime especial, em que se complementam ambas as disciplinas, sendo que o CC/02 estabelece, em seu art. 1.089, que sociedade anônima rege-se por lei especial, aplicando-se-lhe, nos casos omissos, as disposições do estatuto civil.

A partir do disposto no art. 286 da LSA, infere-se que há um regime especial de invalidades aplicado à companhia, partindo da regulação setorial, que estabelece a sanção de anulabilidade às invalidades, mas coexiste com a sistematização civil, a depender do interesse violado, vale dizer, a determinação do regime a ser aplicado dependerá dos interesses jurídicos tutelados ou dos interesses em jogo. Considerando a diversidade de relações jurídicas que decorrem do exercício da atividade da sociedade por ações, a melhor exegese consiste em restringir, em princípio, a aplicação da legislação setorial apenas às relações intrassocietárias - relações entre os sócios ou, ainda, relações entre os sócios e a própria sociedade -, remanescendo a disciplina geral estabelecida pela lei civil tão somente àquelas hipóteses em que os efeitos das deliberações alcancem a esfera jurídica de terceiros.

A aplicação eventual e residual do regime civil de invalidades à seara empresarial deve sofrer adaptações, como a (i) não aplicabilidade do princípio de que o ato tido por nulo não produz nenhum efeito, de molde a preservar os interesses de terceiros, (ii) a existência de prazos de invalidação mais exíguos, em virtude da necessidade premente de estabilização das relações societárias, e (iii) a ampla possibilidade de sanação dos atos ou negócios jurídicos.

Os interesses relacionados à aprovação assemblear das contas do administrador circunscrevem-se aos acionistas e à própria companhia, vale dizer, traduzem interesse econômico dos acionistas e da companhia na alienação de bem imóvel por valor superior ao que fora efetivamente praticado e que teria, por isso, lhes causado significativo prejuízo e, caso seja procedente a demanda ressarcitória, o decreto apenas os aproveitará. Inexistem, pois, interesses de coletividade ou de terceiros tutelados pelas normas em questão.

Considerando que o regime especial de invalidades das deliberações assembleares tem por referência fundamental o interesse violado, é possível inferir que a hipótese em questão se trata, em verdade, de anulabilidade da deliberação.

Cuidando-se de vício de voto - quando são os próprios votos proferidos na assembleia eivados de vícios que podem conduzir à invalidade -, somente os votos eivados serão invalidados, estendendo-se à deliberação específica para a qual o voto concorreu tão somente se o resultado não teria sido obtido sem sua conjunção.

O sócio administrador transferiu a totalidade de sua participação acionária às vésperas da assembleia para sociedade empresária da qual, juntamente com sua cônjuge, era detentor de 100% (cem por cento) do capital social, e que votou de maneira determinante para a aprovação das contas.

A personalidade jurídica da sociedade empresária tem o efeito de lhe conferir autonomia e independência em relação aos seus sócios e seu patrimônio. Contudo, o contexto fático demonstra não ter existido as necessárias independência e isenção na apreciação das contas do administrador por intermédio de holding familiar.

Hipótese em que o fato relevante para a configuração da fraude ao comando legal reside muito mais na proximidade entre a data da transferência da participação acionária e a assembleia de aprovação das contas do que na data da criação da sociedade empresária para quem as quotas foram transferidas. A sociedade existia há várias décadas, mas a transferência das ações deu-se em ocasião vizinha à data da assembleia. Portanto, o elemento temporal, de significativa importância para a configuração da fraude, aponta no sentido de que a transferência foi realizada com a finalidade de possibilitar a participação do próprio administrador no conclave.

Sendo reservada ao vício de voto a sanção de anulabilidade, não poderia ter sido reconhecida de ofício, tal como o fez o Tribunal de origem, o qual afastou também o prazo decadencial para sua decretação. Exige-se, de acordo com a jurisprudência do STJ, a prévia desconstituição da assembleia, nos termos do art. 134, § 3º, da LSA.

O dispositivo de lei exonera de responsabilidade os administradores da companhia, se suas demonstrações financeiras e contas forem aprovadas sem ressalvas. Isso significa que a assembleia confere um quitus aos administradores ao apreciar a regularidade de sua gestão, que, por constituir uma presunção juris tantum de legitimidade, exige sua desconstituição para tornar possível a responsabilização.

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