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STJ - Terceira Seção

REsp 1.775.341-SP

Recurso Especial

Relator: Sebastião Reis Júnior

Julgamento: 12/04/2023

Publicação: 14/04/2023

STJ - Terceira Seção

REsp 1.775.341-SP

Tese Jurídica

Independentemente da extinção de punibilidade do autor, a vítima de violência doméstica deve ser ouvida para que se verifique a necessidade de prorrogação/concessão das medidas protetivas.

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Lei Maria da Penha

OBJETIVOS

A Lei Maria da Penha (L. 11.340/06) visa à criação de mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher.

O QUE É VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER?

Segundo a lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial à mulher, em três ambientes:

  • Na unidade doméstica: ou seja, no espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;
  • Na unidade familiar: ou seja, naquele espaço de indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;
  • Em qualquer relação íntima de afeto: Ou seja, nas situações em que o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Ou seja, não é qualquer agressão à mulher que será sujeita à LMP, mas somente aquelas perpetradas em razão do gênero, que lhe cause algum tipo de lesão ou abalo, na unidade familiar, doméstica ou em relação íntima de afeto. 

SUJEITOS

É sujeito ativo, segundo a Lei Maria da Penha, qualquer pessoa que perpetra violência contra mulher, nos ambientes descritos acima. Ou seja, é considerado agressor, e por isso passível de reprimenda pela LMP, qualquer pessoa (homem ou mulher), que cometa violência contra mulheres na unidade familiar, doméstica ou em relação íntima de afeto. 

Por sua vez, são sujeitos passivos, podendo acionar os mecanismos dessa lei, MULHERES. Isso porque a lei surgiu para proteger mulheres da violência sistêmica perpetrada contra elas em seu ambiente doméstico, familiar ou afetivo. Segundo o STJ, dentro do termo "mulheres" também devem ser abarcadas as mulheres trans, também submetidas a essas violências.

MEDIDAS PROTETIVAS

As medidas protetivas são medidas de urgência, previstas nos artigos 22 e 23 da Lei Maria da Penha. Essas medidas são previstas como meio de proteger a mulher em situação de violência doméstica ou familiar em face de quem perpetra as agressões ou faz ameaças a sua integridade física, psíquica ou moral. 

Vejamos algumas características principais:

Qual a natureza do rol dos artigos 22 e 23? O rol é exemplificativo. 

Quem pede? A ofendida ou o Ministério Público, a pedido dela.

Quem concede? Em regra, quem concede é o juiz, em até 48 horas. No entanto, essas medidas podem ser promovidas pela autoridade policial, em algumas situações de extrema urgência, como é o caso do afastamento do lar (art. 12-C, LMP).   

Qual o prazo? Não existe um prazo certo prescrito em lei. O juiz, no entanto, normalmente estabelece um prazo para rever a medida, pois como são medidas de urgência, só podem se manter enquanto persistir o risco.

O Caso

Nesse julgado, o STJ determinou que independentemente da extinção de punibilidade do autor, a vítima de violência doméstica sempre deverá ser ouvida para que se verifique a necessidade de prorrogação/concessão das medidas protetivas.

Mas se houve extinção da punibilidade, por exemplo por conta de prescrição, como admitir a prorrogação da medida? Ora, a Lei Maria da Penha é um conjunto de regras que objetiva a proteção da mulher que vive em situação de violência. Não seria razoável admitir que o advento de causa extintiva da punibilidade ocasionasse a revogação automática da medida protetiva de urgência, porque é possível que essa mulher ainda esteja em situação de perigo.

Por isso, a Corte determinou que mesmo nesses casos de extinção da punibilidade, é indispensável que haja a prévia oitiva da vítima para avaliação da cessação efetiva da situação de risco à sua integridade física, moral, psicológica, sexual e patrimonial. 

Resumo Oficial

A jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que, extinta a punibilidade, não subsistem mais os fatores para a manutenção/concessão de medidas protetivas, sob pena de eternização da restrição de direitos individuais.

Nesse sentido, as duas Turmas de Direito Penal desta Corte vem decidindo que, embora a lei penal/processual não prevê um prazo de duração da medida protetiva, tal fato não permite a eternização da restrição a direitos individuais, devendo a questão ser examinada à luz dos princípios da proporcionalidade e da adequação.

Se não há prazo legal para a propositura de ação (normalmente criminal, pela competência ordinária para o processo da violência doméstica), tampouco se pode admitir eterna restrição de direitos por medida temporária e de urgência. Assim, concernente ao tema, a Sexta Turma já entendeu que "[...] Dado o lapso temporal transcorrido entre o deferimento das medidas protetivas no ano de 2016 até o presente momento, havendo, inclusive, o reconhecimento da extinção da punibilidade do agente, em relação aos fatos descritos no boletim de ocorrência, deve ser mantida a decisão recorrida que revogou medidas protetivas, indevidamente eternizadas pela não propositura da ação de conhecimento, sendo despiciendo o retorno dos autos para avaliação da manutenção da medida protetiva (AgRg no REsp 1.769.759/SP, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 14/5/2019).

Todavia, nos termos do Parecer Jurídico emanado pelo Consórcio Lei Maria da Penha, "a revogação de medidas protetivas de urgência exige a prévia oitiva da vítima para avaliação da cessação efetiva da situação de risco à sua integridade física, moral, psicológica, sexual e patrimonial. Tanto mais que assinala o Protocolo para o Julgamento com Perspectiva de Gênero, 'as peculiares características das dinâmicas violentas, que, em regra, ocorrem no seio do lar ou na clandestinidade, determinam a concessão de especial valor à palavra da vítima' (CNJ, 2021, p. 85). [...], enquanto existir risco ao direito da mulher de viver sem violência, as restrições à liberdade de locomoção do apontado agente são justificadas e legítimas. O direito de alguém de não sofrer violência não é menos valioso do que o direito de alguém de ter liberdade de contato ou aproximação. Na ponderação dos valores não pode ser aniquilado o direito à segurança e à proteção da vítima".

Assim, antes do encerramento da cautelar protetiva, a defesa deve ser ouvida, notadamente para que a situação fática seja devidamente apresentada ao Juízo competente, que, diante da relevância da palavra da vítima, verifique a necessidade de prorrogação/concessão das medidas, independentemente da extinção de punibilidade do autor.

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