No exercício do seu poder de autotutela, poderá a Administração Pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas.
Com base nesse entendimento, o Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, ao apreciar o Tema 839 da repercussão geral, deu provimento a recurso extraordinário para reformar o acordão impugnado e denegar a segurança ao impetrante, ora recorrido (Informativo 955).
No caso, por meio da Portaria MJ 1.960/2012, o Ministro da Justiça anulou a anistia concedida a ex-cabo da Aeronáutica, dispensado do serviço, na década de 1960, por força da Portaria 1.104/1964-GM3. Judicializada a questão, o acórdão recorrido concedeu a segurança para declarar a decadência do ato da Administração que anulou portaria anistiadora.
A decisão impugnada assentou que o conceito de autoridade administrativa, a que alude o § 2º do art. 54 da 9.784/1999, não poderia ser estendido a todo e qualquer agente público, sob pena de tornar inaplicável a regra geral contida no caput, em favor da decadência. Desse modo, deveriam ser consideradas como exercício do direito de anular o ato administrativo apenas as medidas concretas de impugnação à validade do ato, tomadas pelo Ministro de Estado da Justiça, autoridade que, assessorada pela Comissão de Anistia, tem competência exclusiva para decidir as questões relacionadas à concessão ou revogação das anistias políticas, nos termos do art. 1º, § 2º, III, da Lei 9.784/1999 c/c os arts. 10 e 12, caput, da Lei 10.559/2002. Assim, as notas AGU/JD-10/2003 e AGU/JD-1/2006 não se enquadrariam na definição de medida de autoridade administrativa no sentido sob exame, haja vista sua natureza de pareceres jurídicos, de caráter facultativo, formulados pelos órgãos consultivos, com trâmites internos, genéricos, os quais não se dirigem, especificamente, a quaisquer dos anistiados.
O Plenário afirmou que, por ser matéria de ordem pública, em regra, o prazo decadencial não sofre interrupção ou suspensão. Porém, excepcionalmente, o ordenamento jurídico admite a suspensão do prazo decadencial. É o caso do disposto na parte final do caput do art. 54 da Lei 9.784/1999, que autoriza a anulação do ato administrativo consumado em situações de manifesta má-fé ou de absoluta contrariedade à Constituição Federal.
O art. 54, § 2º, da Lei 9.784/1999, por sua vez, dispõe que a adoção pela Administração Pública de qualquer medida a questionar o ato se mostra bastante a afastar a decadência.
O colegiado frisou que, ao contrário do assentado no acórdão impugnado, as Notas Técnicas da AGU/JD-10/2003 e AGU/JD-1/2006 revelam as iniciativas da Administração Pública no sentido da necessidade de revisão do ato anistiador, constituindo, assim, causa obstativa da alegada decadência.
Ressaltou que a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça editou súmula administrativa reconhecendo indiscriminadamente que todos os cabos da Aeronáutica que houvessem sido licenciados pela implementação do tempo de serviço militar (oito anos) seriam anistiados por ato de natureza exclusivamente política, sendo este o fundamento bastante para o enquadramento na situação do art. 8º do ADCT.
Essa interpretação dada pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça conferiu uma presunção de motivação para os atos da Administração Federal consumados com fundamento na Portaria 1.104/1964, implicando em números impressionantes de anistiados na Aeronáutica.
Em procedimento de revisão pelo Grupo de Trabalho Interministerial, instituído pela Portaria Interministerial 134/2011, observou-se a manifesta ausência de fato indicativo de ocorrência de punição ou perseguição por motivação política ao recorrido, em conformidade com o exigido no art. 17 da Lei 10.559/2002.
No âmbito do Ministério da Justiça, o ato administrativo, que anulou a Portaria Ministerial 2340/2003 que declarou o recorrido anistiado, foi motivado por sua inadequação à condição de militar anistiado por ato de natureza política, pois seu licenciamento das Forças Armadas se deu em decorrência do implemento do tempo legal de serviço militar (Portaria 1.104/1964-GM3).
A Corte concluiu que o ato de concessão das anistias malfere a ordem constitucional, pois não se amolda ao figurino do art. 8º do ADCT, que não agasalha os militares licenciados pelo decurso do tempo, situação que não se reveste de motivação estritamente política.
Destacou que anistia prevista no art. 8º do ADCT não alcança os militares expulsos com base em legislação disciplinar ordinária, ainda que em virtude de atos praticados por motivação política. Esse é o teor da orientação que restou consubstanciada no Enunciado 674 da Súmula da jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal (STF). Embora o verbete se refira às situações de expulsão, sua razão de decidir alcança, igualmente, os militares que foram licenciados das Força Armadas por implemento do tempo de serviço.
Registrou que a jurisprudência desta Corte é no sentido de que o poder-dever de autotutela autoriza a Administração a proceder a revisão da condição de anistiado político, não havendo que se falar em desrespeito ao princípio da segurança jurídica ou a direito líquido e certo.
No mais, nem mesmo o decurso do lapso temporal de cinco anos é causa impeditiva bastante para inibir a Administração Pública de revisar determinado ato, haja vista que a ressalva da parte final do caput do art. 54 da Lei 9.784/1999 autoriza sua anulação a qualquer tempo, uma vez demonstrada a má-fé do beneficiário, no âmbito do procedimento administrativo, assegurado o devido processo.
Ademais, situações de flagrante inconstitucionalidade não devem ser consolidadas pelo transcurso do prazo decadencial previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999, sob pena de subversão das determinações insertas na Constituição Federal. Desse modo, não pode haver usucapião de constitucionalidade, pois a obrigatoriedade da Constituição deriva de sua vigência. Não é possível entender, portanto, que o tempo derrogue a força obrigatória de seus preceitos por causa de ações omissivas ou comissivas de autoridades públicas.
De outro lado, o STF também já assentou em julgados que a Portaria 1.104/1964, por si, não constitui ato de exceção, sendo necessária a comprovação, caso a caso, da ocorrência de motivação político-ideológica para o ato de exclusão das Forças Armadas e consequente concessão de anistia política.
Portanto, o ato administrativo que declarou o recorrido anistiado político não é passível de convalidação pelo tempo, dada a sua manifesta inconstitucionalidade, uma vez que viola frontalmente o art. 8º do ADCT.
Vencidos os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Celso de Mello, que negaram provimento ao recurso extraordinário.
Asseveraram que o conteúdo do art. 54 da Lei 9.784/1999 estabelece apenas duas causas de interrupção do transcurso do prazo decadencial, que, no caso concreto, seriam a de má-fé do impetrante ao requerer o reconhecimento da condição de anistiado político; ou a existência de medida de autoridade administrativa apta a configurar impugnação à validade do ato.
Entretanto, o motivo para a anulação do ato de concessão da anistia política foi a mudança na interpretação do Ministério da Justiça acerca da natureza da Portaria 1.104/1964, e não eventual conduta maliciosa imputável ao impetrante.
Logo, se não se cogita de má-fé no requerimento de reconhecimento da condição de anistiado político, a causa interruptiva contida na parte final do caput do art. 54 da Lei 9.784/1999 não se aplica ao caso.
Além disso, reputaram não ser possível que nota de caráter opinativo seja considerada como medida de impugnação ao ato administrativo posteriormente anulado.
Para a divergência, o caso em tela não se enquadra, tampouco, na hipótese de flagrante inconstitucionalidade a excepcionar, nos termos da jurisprudência dessa Casa, o transcurso do prazo decadencial.
Da farta documentação trazida aos autos, depreende-se que houve, no âmbito administrativo, intensos debates, de 2003 a 2011, acerca da efetiva natureza da Portaria 1.104/1964. Desse modo, considerar uma flagrante inconstitucionalidade diante de tanto debate seria reconhecer, prima facie, uma inconstitucionalidade que, prima facie, não foi reconhecida.
Vencidos, quanto à fixação da tese, os ministros Rosa Weber e Marco Aurélio.
A ministra Rosa Weber pontuou que não examinou o mérito da questão, pois primeiro seria necessário ultrapassar a decadência, matéria prejudicial.
O ministro Marco Aurélio asseverou que não é possível, em recurso extraordinário, julgar-se, pela primeira vez, determinado conflito que não foi colocado junto à instância de origem.
No exercício do seu poder de autotutela, poderá a Administração Pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas.
Com base nesse entendimento, o Plenário, em conclusão de julgamento e por maioria, ao apreciar o Tema 839 da repercussão geral, deu provimento a recurso extraordinário para reformar o acordão impugnado e denegar a segurança ao impetrante, ora recorrido (Informativo 955).
No caso, por meio da Portaria MJ 1.960/2012, o Ministro da Justiça anulou a anistia concedida a ex-cabo da Aeronáutica, dispensado do serviço, na década de 1960, por força da Portaria 1.104/1964-GM3. Judicializada a questão, o acórdão recorrido concedeu a segurança para declarar a decadência do ato da Administração que anulou portaria anistiadora.
A decisão impugnada assentou que o conceito de autoridade administrativa, a que alude o § 2º do art. 54 da 9.784/1999, não poderia ser estendido a todo e qualquer agente público, sob pena de tornar inaplicável a regra geral contida no caput, em favor da decadência. Desse modo, deveriam ser consideradas como exercício do direito de anular o ato administrativo apenas as medidas concretas de impugnação à validade do ato, tomadas pelo Ministro de Estado da Justiça, autoridade que, assessorada pela Comissão de Anistia, tem competência exclusiva para decidir as questões relacionadas à concessão ou revogação das anistias políticas, nos termos do art. 1º, § 2º, III, da Lei 9.784/1999 c/c os arts. 10 e 12, caput, da Lei 10.559/2002. Assim, as notas AGU/JD-10/2003 e AGU/JD-1/2006 não se enquadrariam na definição de medida de autoridade administrativa no sentido sob exame, haja vista sua natureza de pareceres jurídicos, de caráter facultativo, formulados pelos órgãos consultivos, com trâmites internos, genéricos, os quais não se dirigem, especificamente, a quaisquer dos anistiados.
O Plenário afirmou que, por ser matéria de ordem pública, em regra, o prazo decadencial não sofre interrupção ou suspensão. Porém, excepcionalmente, o ordenamento jurídico admite a suspensão do prazo decadencial. É o caso do disposto na parte final do caput do art. 54 da Lei 9.784/1999, que autoriza a anulação do ato administrativo consumado em situações de manifesta má-fé ou de absoluta contrariedade à Constituição Federal.
O art. 54, § 2º, da Lei 9.784/1999, por sua vez, dispõe que a adoção pela Administração Pública de qualquer medida a questionar o ato se mostra bastante a afastar a decadência.
O colegiado frisou que, ao contrário do assentado no acórdão impugnado, as Notas Técnicas da AGU/JD-10/2003 e AGU/JD-1/2006 revelam as iniciativas da Administração Pública no sentido da necessidade de revisão do ato anistiador, constituindo, assim, causa obstativa da alegada decadência.
Ressaltou que a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça editou súmula administrativa reconhecendo indiscriminadamente que todos os cabos da Aeronáutica que houvessem sido licenciados pela implementação do tempo de serviço militar (oito anos) seriam anistiados por ato de natureza exclusivamente política, sendo este o fundamento bastante para o enquadramento na situação do art. 8º do ADCT.
Essa interpretação dada pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça conferiu uma presunção de motivação para os atos da Administração Federal consumados com fundamento na Portaria 1.104/1964, implicando em números impressionantes de anistiados na Aeronáutica.
Em procedimento de revisão pelo Grupo de Trabalho Interministerial, instituído pela Portaria Interministerial 134/2011, observou-se a manifesta ausência de fato indicativo de ocorrência de punição ou perseguição por motivação política ao recorrido, em conformidade com o exigido no art. 17 da Lei 10.559/2002.
No âmbito do Ministério da Justiça, o ato administrativo, que anulou a Portaria Ministerial 2340/2003 que declarou o recorrido anistiado, foi motivado por sua inadequação à condição de militar anistiado por ato de natureza política, pois seu licenciamento das Forças Armadas se deu em decorrência do implemento do tempo legal de serviço militar (Portaria 1.104/1964-GM3).
A Corte concluiu que o ato de concessão das anistias malfere a ordem constitucional, pois não se amolda ao figurino do art. 8º do ADCT, que não agasalha os militares licenciados pelo decurso do tempo, situação que não se reveste de motivação estritamente política.
Destacou que anistia prevista no art. 8º do ADCT não alcança os militares expulsos com base em legislação disciplinar ordinária, ainda que em virtude de atos praticados por motivação política. Esse é o teor da orientação que restou consubstanciada no Enunciado 674 da Súmula da jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal (STF). Embora o verbete se refira às situações de expulsão, sua razão de decidir alcança, igualmente, os militares que foram licenciados das Força Armadas por implemento do tempo de serviço.
Registrou que a jurisprudência desta Corte é no sentido de que o poder-dever de autotutela autoriza a Administração a proceder a revisão da condição de anistiado político, não havendo que se falar em desrespeito ao princípio da segurança jurídica ou a direito líquido e certo.
No mais, nem mesmo o decurso do lapso temporal de cinco anos é causa impeditiva bastante para inibir a Administração Pública de revisar determinado ato, haja vista que a ressalva da parte final do caput do art. 54 da Lei 9.784/1999 autoriza sua anulação a qualquer tempo, uma vez demonstrada a má-fé do beneficiário, no âmbito do procedimento administrativo, assegurado o devido processo.
Ademais, situações de flagrante inconstitucionalidade não devem ser consolidadas pelo transcurso do prazo decadencial previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999, sob pena de subversão das determinações insertas na Constituição Federal. Desse modo, não pode haver usucapião de constitucionalidade, pois a obrigatoriedade da Constituição deriva de sua vigência. Não é possível entender, portanto, que o tempo derrogue a força obrigatória de seus preceitos por causa de ações omissivas ou comissivas de autoridades públicas.
De outro lado, o STF também já assentou em julgados que a Portaria 1.104/1964, por si, não constitui ato de exceção, sendo necessária a comprovação, caso a caso, da ocorrência de motivação político-ideológica para o ato de exclusão das Forças Armadas e consequente concessão de anistia política.
Portanto, o ato administrativo que declarou o recorrido anistiado político não é passível de convalidação pelo tempo, dada a sua manifesta inconstitucionalidade, uma vez que viola frontalmente o art. 8º do ADCT.
Vencidos os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Celso de Mello, que negaram provimento ao recurso extraordinário.
Asseveraram que o conteúdo do art. 54 da Lei 9.784/1999 estabelece apenas duas causas de interrupção do transcurso do prazo decadencial, que, no caso concreto, seriam a de má-fé do impetrante ao requerer o reconhecimento da condição de anistiado político; ou a existência de medida de autoridade administrativa apta a configurar impugnação à validade do ato.
Entretanto, o motivo para a anulação do ato de concessão da anistia política foi a mudança na interpretação do Ministério da Justiça acerca da natureza da Portaria 1.104/1964, e não eventual conduta maliciosa imputável ao impetrante.
Logo, se não se cogita de má-fé no requerimento de reconhecimento da condição de anistiado político, a causa interruptiva contida na parte final do caput do art. 54 da Lei 9.784/1999 não se aplica ao caso.
Além disso, reputaram não ser possível que nota de caráter opinativo seja considerada como medida de impugnação ao ato administrativo posteriormente anulado.
Para a divergência, o caso em tela não se enquadra, tampouco, na hipótese de flagrante inconstitucionalidade a excepcionar, nos termos da jurisprudência dessa Casa, o transcurso do prazo decadencial.
Da farta documentação trazida aos autos, depreende-se que houve, no âmbito administrativo, intensos debates, de 2003 a 2011, acerca da efetiva natureza da Portaria 1.104/1964. Desse modo, considerar uma flagrante inconstitucionalidade diante de tanto debate seria reconhecer, prima facie, uma inconstitucionalidade que, prima facie, não foi reconhecida.
Vencidos, quanto à fixação da tese, os ministros Rosa Weber e Marco Aurélio.
A ministra Rosa Weber pontuou que não examinou o mérito da questão, pois primeiro seria necessário ultrapassar a decadência, matéria prejudicial.
O ministro Marco Aurélio asseverou que não é possível, em recurso extraordinário, julgar-se, pela primeira vez, determinado conflito que não foi colocado junto à instância de origem.