ADPF 347-DF

STF Plenário

Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental

Relator: Luís Roberto Barroso

Julgamento: 18/12/2024

Tese Jurídica

O plano “Pena Justa”, que busca enfrentar as violações sistemáticas de direitos fundamentais nas prisões do País, foi homologado pelo STF com algumas ressalvas que visam ao seu aprimoramento.

Nossos Comentários

Contexto

O caso em exame trata da homologação do plano "Pena Justa" em um processo estrutural no âmbito da ADPF 347.

O STF reconheceu, no julgamento de mérito da ação, a existência de um estado de coisas inconstitucional no sistema prisional brasileiro. Em razão disso, determinou que a União, em cooperação com o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Penitenciário do Conselho Nacional de Justiça (DMF/CNJ), apresentasse um plano nacional para superar a crise, visando à homologação pelo Tribunal. 

A questão central em discussão é se o plano "Pena Justa" atende às exigências, diretrizes e finalidades estabelecidas no julgamento de mérito da ADPF 347 e, portanto, se deve ser homologado.

Julgamento

A decisão sobre a homologação do plano Pena Justa envolveu diversos critérios e considerações:

  • Critérios para avaliação de planos de ação em processos estruturais: O Judiciário, ao intervir em políticas públicas, deve evitar determinar medidas pontuais, estabelecendo, em vez disso, finalidades e metas para que o Executivo apresente um plano de ação. A análise judicial do plano deve considerar sua razoabilidade, verificando se contém:
    • Diagnóstico do problema;
    • Objetivos e metas;
    • Ações e cronograma de atuação;
    • Matriz de responsabilidade;
    • Matriz de riscos;
    • Previsão de recursos orçamentários, humanos e tecnológicos;
    • Mecanismos de monitoramento, avaliação e publicidade.
  • Avaliação do plano Pena Justa: O plano foi elaborado ao longo de um ano, a partir do diálogo entre diferentes atores, sob a coordenação da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen/MJSP) e do DMF/CNJ. O Comitê Interinstitucional do Sistema Prisional Brasileiro foi instituído para assegurar o cumprimento eficiente da decisão do STF e promover uma coordenação eficaz entre as partes envolvidas. O plano está dividido em quatro eixos, os quais contêm medidas, metas e indicadores de monitoramento e avaliação, além de detalhamento dos atores estratégicos para a implementação:
    • Controle da entrada e das vagas do sistema prisional;
    • Qualidade da ambiência, dos serviços prestados e da estrutura prisional;
    • Processo de saída da prisão e da reintegração social;
    • Políticas de não repetição do estado de coisas inconstitucional no sistema prisional.
  • Ressalvas e acréscimos às medidas previstas no plano: Durante a homologação de plano apresentado em processo estrutural, o STF entende que o magistrado pode considerar eventuais riscos decorrentes de sua implementação, buscando mitigá-los, ou identificar pontos de omissão. Nesse sentido, alguns ministros apresentaram ressalvas e sugestões. O Ministro Flávio Dino, por exemplo, ressaltou que a publicização de dados sobre o uso de armamento letal e não letal nos estabelecimentos prisionais pode causar insegurança. O Ministro Alexandre de Moraes mencionou que o Tribunal ainda irá julgar a ADI 7.389, que impugna a Resolução CNJ nº 487/2023, a qual veda o ingresso de pessoas com transtornos mentais em hospitais de custódia e estabelecimentos prisionais.
  • Compensação penal: A possibilidade de "compensação penal", por meio da qual poderia haver "contagem diferenciada de todo o período de pena cumprido em situação degradante nas unidades prisionais" foi incluída no plano, a exigir a edição de lei que a preveja.

Apesar das discussões e divergências sobre pontos específicos, o plano "Pena Justa" foi homologado com ressalvas e acréscimos. O DMF/CNJ deverá monitorar o cumprimento das metas e indicadores do plano, encaminhando relatórios semestrais ao STF. A Corte segue como instância máxima de supervisão, podendo ser acionado em caso de descumprimento das medidas.

Além disso, o STF tomou decisões específicas sobre algumas medidas propostas:

  • Vencidos os Ministros André Mendonça, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Luiz Fux e Nunes Marques, foi homologada a medida relativa à vedação do ingresso de pessoas com transtorno mental em hospital de custódia, nos termos do voto do Ministro Relator.
  • Por maioria, o Tribunal deixou de homologar a medida referente à obrigação de instalação de câmeras corporais em policiais penais.
  • Por maioria, o Tribunal deixou de homologar as medidas relativas à “compensação penal” por condições degradantes e à “remição ficta” por ausência de oferta de trabalho e estudo.

O plano “Pena Justa” tem como impactos esperados (i) o enfrentamento do racismo institucional e o respeito à legalidade no sistema penal; (ii) o fortalecimento de alternativas penais e a reversão do hiperencarceramento; (iii) a melhoria da gestão e da vida das pessoas no sistema prisional, assegurando seus direitos e condições de trabalho dignas para os servidores; (iv) a construção de políticas públicas sustentáveis que garantam a execução da pena; (v) a adequada proteção dos bens jurídicos; e (vi) a redução da influência de organizações criminosas nas prisões.

Para alcançar esses objetivos, o plano foi estruturado em quatro eixos principais: (i) o controle da entrada e das vagas do sistema prisional; (ii) a qualidade da ambiência, dos serviços prestados e da estrutura prisional; (iii) o processo de saída da prisão e da reintegração social; e (iv) as políticas de não repetição do estado de coisas inconstitucional no sistema prisional. Cada um deles contém medidas, metas e indicadores de monitoramento e avaliação, além de detalhamento dos atores estratégicos para a implementação. Isso, porque a homologação do plano nacional é apenas o ponto de partida, e a implementação e o monitoramento contínuo serão essenciais para a efetividade das medidas.

Nesse contexto, embora não seja papel do Judiciário elaborar a política destinada a corrigir a situação fática contestada em um processo estrutural, é legítimo que, ao homologar o plano apresentado, o magistrado leve em consideração eventuais riscos decorrentes da sua implementação e busque mitigá-los, ou, ainda, identifique pontos de omissão.

Com base nesses e em outros entendimentos, o Plenário, por unanimidade, homologou — no bojo da presente ADPF, cujo mérito foi julgado em 04.10.2023 (vide Informativo 1.111) — o plano “Pena Justa”, que deve ter sua implementação iniciada, e determinou, entre outras medidas, que os estados e o Distrito Federal, em diálogo cooperativo com as autoridades responsáveis pelo plano nacional, comecem a elaboração de seus planos de ação.

Por fim, em relação às medidas específicas, o Plenário, por maioria: (i) homologou a medida relativa à vedação do ingresso de pessoas com transtorno mental em hospital de custódia; (ii) deixou de homologar a medida referente à obrigação de instalação de câmeras corporais em policiais penais; e (iii) deixou de homologar as medidas relativas à “compensação penal” por condições degradantes e à “remição ficta” por ausência de oferta de trabalho e estudo.

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