STF - Plenário
ADI 5.545-RJ
Ação Direta de Inconstitucionalidade
Relator: Luiz Fux
Julgamento: 13/04/2023
Publicação: 20/04/2023
STF - Plenário
ADI 5.545-RJ
Tese Jurídica
É inconstitucional a lei estadual que preveja o arquivamento de materiais genéticos de nascituros e parturientes, em unidades de saúde, com o fim de realizar exames de DNA comparativo em caso de dúvida.
Nossos Comentários
Resumo Oficial
É inconstitucional — por violar os direitos à intimidade e à privacidade (CF/1988, art. 5º, X), bem como os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, na dimensão da proibição do excesso — norma estadual que determina a hospitais, casas de saúde e maternidades a coleta compulsória de material genético de mães e bebês na sala de parto e o subsequente armazenamento à disposição da Justiça para o fim de evitar a troca de recém-nascidos nas unidades de saúde.
A lei estadual impugnada, a pretexto de proteger o direito à filiação biológica, viola o direito à privacidade de pessoas em estado de extrema vulnerabilidade, uma vez que há coleta e armazenamento de material genético sem prévio consentimento. Nesse contexto, infringe a autonomia da vontade da parturiente ao se valer de instrumento coercitivo desproporcional para a tutela de interesse eminentemente privado do destinatário da norma, além de comprometer a autodeterminação informativa dos titulares desses dados, pois os impede de decidir sobre sua divulgação e utilização.
Os dados genéticos são classificados como sensíveis, de modo que, mesmo que houvesse consentimento da parturiente, o direito à privacidade ainda estaria violado, visto que o texto da lei impugnada é vago em relação ao tratamento dos dados genéticos armazenados, o que constitui severo risco à integridade digital dos indivíduos.
A ausência de previsão quanto à destinação dos dados, bem como aos mecanismos para sistematizar a coleta, a guarda eficaz e a sua posterior exclusão, permite a utilização do material coletado para quaisquer interesses, como a mercantilização e o perfilamento dos dados, o que pode ocasionar uma série de violações a direitos fundamentais, como, por exemplo, a discriminação genética de pessoas com doenças congênitas.
Além disso, há medidas mais efetivas e menos custosas e interventivas na esfera privada dos indivíduos para se evitar a troca de bebês nas unidades de saúde. Exemplos disso são o uso de pulseiras numeradas na mãe e no filho, o uso de grampo umbilical, a identificação da gestante no momento da admissão, em conjunto com a posterior identificação do recém-nascido no momento do nascimento, e a possibilidade da permanência do pai no momento do nascimento do filho. De qualquer forma, o mais adequado é que o material genético seja coletado a partir do instante em que ocorrer a dúvida sobre possível troca.
Com base nesses entendimentos, o Plenário, por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 1º, parte final, e 2º, III, ambos da Lei 3.990/2002 do Estado do Rio de Janeiro.
O Estado do Rio de Janeiro aprovou a Lei estadual 3.990/2002 que obriga hospitais e maternidades a coletar material genético de mães e bebês, no momento do parto. Esse material seria coletado para permitir a comparação do material genético, em caso de eventual dúvida sobre a filiação, como no caso de troca de bebês na maternidade.
A PGR, então, ajuizou ADI questionando essa previsão, sob argumento de que ela representava violação ao direito fundamental à privacidade e à intimidade.
Segundo o STF, essa lei, apesar de ter um objetivo bastante nobre, criou uma solução desproporcional, e portanto inconstitucional, para lidar com esse problema da troca de bebês na maternidade.
O direito à proteção da família e da criança, assim como o direito à privacidade e intimidade, é uma direito fundamental. Como no caso há embate de direitos fundamentais, devemos apelar à regra da proprocionalidade (sentido amplo), que se baseia no atendimento dos seguintes pressupostos:
O STF entendeu que o meio, apesar de em tese adequado, não é necessário nem proporcional. O Estado não pode, sob argumento de proteção à filiação biológica, violar de forma desproporcional o direito à privacidade de pessoas, sem seu prévio consentimento.