STJ - Sexta Turma
RHC 153.480-SP
Recurso Ordinário em Habeas Corpus
Relator: Laurita Vaz
Julgamento: 24/05/2022
Publicação: 31/05/2022
STJ - Sexta Turma
RHC 153.480-SP
Tese Jurídica
Admite-se, excepcionalmente, a aplicação do princípio da insignificância a crime praticado em prejuízo da administração pública quando for ínfima a lesão ao bem jurídico tutelado.
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Resumo Oficial
Hipótese na qual o paciente, após adquirir, em nome de seus filhos, três bilhetes estudantis de transporte público integrado pelo preço unitário de R$ 2,15 (dois reais e quinze centavos) - metade do valor integral (R$ 4,30 - quatro reais e trinta centavos) - utilizou-se deles para vender acesso irregular à Estação do metrô, por R$ 4,00 (quatro reais). Conforme a denúncia, um dos bilhetes foi usado regularmente duas vezes, e os outros dois foram utilizados indevidamente uma vez, cada. Isso resultou em vantagem financeira ao paciente de R$ 3,70 (três reais e setenta centavos), e prejuízo financeiro à Empresa de Transporte Público de R$ 4,30 (quatro reais e trinta centavos).
As particularidades da espécie impõem o reconhecimento do princípio da insignificância. Tanto a vantagem patrimonial obtida, quanto o prejuízo ocasionado à Empresa de Transporte Público, foram inferiores a 0,5% do salário mínimo que vigia no ano de 2019, quando dos fatos. No mais, não há a indicação de circunstância subjetiva que eventualmente pudesse impedir a aplicação do princípio da bagatela, pois inexistem notícias do envolvimento do paciente em outros delitos, além de ser relevante seu relato em Delegacia de que passava por dificuldades em sustentar financeiramente sua família.
No Supremo Tribunal Federal não prevalece a orientação de que o cometimento de conduta em prejuízo da Administração Pública impede, aprioristicamente, a incidência do princípio da bagatela - o que deve ser avaliado segundo as peculiaridades do caso concreto.
Conforme já decidiu esta Corte, em determinadas hipóteses, nas quais for ínfima a lesão ao bem jurídico tutelado - como na espécie -, admite-se afastar a aplicação do entendimento sedimentado na Súmula n. 599/STJ, pois "a subsidiariedade do direito penal não permite tornar o processo criminal instrumento de repressão moral, de condutas típicas que não produzam efetivo dano" (HC 245.457/MG, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 03/03/2016, DJe 10/03/2016).
Princípio da Insignificância
O princípio da insignificância, também chamado de "bagatela" preceitua que não deverá ser punido o ato formalmente típico que não represente uma lesão sigificante ao bem jurídico tutelado pelo ordenamento brasileiro.
Esse princípio consiste em um excludente da tipicidade material, segundo o entendimento da doutrina. Isso porque a tipicidade, que é o enquadramento legal do ato praticado pelo agente ao tipo descrito na norma penal, pode ser dividido em duas partes:
Como saber se aquela conduta lesou ou não o bem jurídico protegido pela norma? A jurisprudência delineou alguns requisitos que devem estar presentes no caso concreto, para que possa se considerar o ato insignificante, conhecido pelo mnemônico "M.A.R.I".
Percebam que esses critérios estabelecidos pela doutrina são bastante subjetivos e de difícil delineamento. Dessa forma, o que é ou não é passível de insignificância é melhor definido na prática dos tribunais superiores.
Crimes contra a administração são passíveis de insignificância? O entendimento majoritário é de que não seriam, me regra. pois o bem jurídico é difuso, cuja lesão se torna um atentado ao bem comum e à coeltividade - moralidade administrativa.
No entanto, nesse julgado, o STJ admitiu, de forma absolutamente excepcional, a aplicação do princípio da insignificância a crime praticado em prejuízo da administração pública quando for ínfima a lesão ao bem jurídico tutelado.