A norma do art. 36, III, "b", da Lei n. 8.112/1990 não pode ser aplicada de maneira subsidiária aos membros do Ministério Público da União.
O art. 36, III, "b", da Lei n. 8.112/1990 disciplina a possibilidade de o servidor público federal ser removido a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração, por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial.
A pretensão de aplicação subsidiária da referida norma aos membros do Ministério Público da União se assenta no argumento de que o disposto no art. 287, caput, da LC n. 75/1993 assegura que "aplicam-se subsidiariamente aos membros do Ministério Público da União as disposições gerais referentes aos servidores públicos, respeitadas, quando for o caso, as normas especiais contidas nesta lei complementar".
Todavia, a partir da leitura do próprio art. 287, caput, da LC n. 75/1993, tem-se que a aplicação do Estatuto dos Servidores Públicos Federais em relação aos membros do Ministério Público somente pode ocorrer quando a legislação desta última carreira mencionada não preveja instituto próprio para solucionar a questão jurídica controvertida.
A LC n. 75/1993, posterior à Lei n. 8.112/1990 (que se pretende aplicar subsidiariamente), poderia ter criado o direito à remoção nessas hipóteses, mas optou por tratar da questão mediante instituto próprio (a licença), devendo prevalecer tal previsão especial.
Além disso, o número de agentes de poder que gozam de inamovibilidade (a exemplo dos membros do MP e os magistrados) é sempre inferior ao de servidores que compõem as carreiras de apoio, fora o fato de que aqueles necessariamente desempenham as atribuições de chefia e gestão.
Assim, os impactos de uma remoção de ofício em relação aos promotores, procuradores e magistrados são muito maiores em termos logísticos do que aqueles gerados pela remoção de ofício de um servidor, a justificar a diferença de tratamento legal: para os primeiros reservou-se o direito do gozo de licença; para os segundos o direito à remoção em si.
Ainda, se se entender que o art. 36 da Lei n. 8.112/1990 pode ser aplicado subsidiariamente, nos casos em que o procurador tiver como cônjuge servidor e esse for removido de ofício (art. 36, III, "a"), o primeiro também terá direito à remoção, ampliando-se bastante as hipóteses de remoção de membro de poder, em detrimento da organização do serviço público e da criteriosa lista de antiguidade.
É lícito concluir que a omissão na lei própria do MPU a respeito da remoção para tratamento de saúde de familiar não se tratou de omissão atécnica do legislador, mas caso de silêncio eloquente/opção nesse aspecto.
Entretanto, colhe-se do caso concreto que a recorrida se encontra removida para tratar filho menor (com autismo) desde 2016, constando ainda do acórdão recorrido que foi produzida vasta e incontroversa prova no sentido de que: (a) o infante deve permanecer no local onde iniciou as terapias relacionadas ao autismo e manter seu convívio familiar, social, terapêutico e escolar, o mais estruturado possível, sem alterações significativas; (b) quaisquer variações no ambiente de vivência do menor, mesmo que mínimas, reverberam sobejamente na progressão/regressão da doença, dada a sua sensibilidade psicológica; (c) a cidade de lotação originária da autora não dispõe de quadro de profissionais que pudessem atender às necessidades da criança; (d) ficou evidenciada a extrema importância da presença da mãe junto à criança para que essa apresente desenvolvimento saudável, bem como os impactos negativos, com comprometimento de sintomas e do processo de desenvolvimento, em caso de ausência da genitora; e (e) poderia haver prejuízos à criança em caso de mudança de domicílio, com afastamento de outros familiares, pois o filho da recorrida estaria saindo do "seu mundo autista, para ele intocável e só dele, para algo diferente e estranho onde o processo de socialização será afetado de forma brutal, acarretando prejuízo na possível melhora de seus sintomas e um prognóstico reservado".
Todo esse contexto demonstra que, a despeito de a tese jurídica defendida pela União ser a correta, no caso concreto, a restauração da estrita legalidade, com a mudança da autora e do filho (pessoa com deficiência) para a lotação de origem ocasionaria muito mais danos sociais que a manutenção da situação consolidada (teoria do fato consumado/consolidado).
Esta Corte entende que em demandas envolvendo interesse de criança, como no caso, a solução da controvérsia deve sempre observar o princípio do melhor interesse do menor, introduzido em nosso sistema jurídico como corolário da doutrina da proteção integral, consagrada pelo art. 227 da Constituição Federal, o qual deve orientar a atuação tanto do legislador quanto do aplicador da norma jurídica, vinculando-se o ordenamento infraconstitucional aos seus contornos (STJ, HC 776.461/SC, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 29/11/2022, DJe 1º/12/2022).
O art. 36, III, "b", da Lei n. 8.112/1990 disciplina a possibilidade de o servidor público federal ser removido a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração, por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial.
A pretensão de aplicação subsidiária da referida norma aos membros do Ministério Público da União se assenta no argumento de que o disposto no art. 287, caput, da LC n. 75/1993 assegura que "aplicam-se subsidiariamente aos membros do Ministério Público da União as disposições gerais referentes aos servidores públicos, respeitadas, quando for o caso, as normas especiais contidas nesta lei complementar".
Todavia, a partir da leitura do próprio art. 287, caput, da LC n. 75/1993, tem-se que a aplicação do Estatuto dos Servidores Públicos Federais em relação aos membros do Ministério Público somente pode ocorrer quando a legislação desta última carreira mencionada não preveja instituto próprio para solucionar a questão jurídica controvertida.
A LC n. 75/1993, posterior à Lei n. 8.112/1990 (que se pretende aplicar subsidiariamente), poderia ter criado o direito à remoção nessas hipóteses, mas optou por tratar da questão mediante instituto próprio (a licença), devendo prevalecer tal previsão especial.
Além disso, o número de agentes de poder que gozam de inamovibilidade (a exemplo dos membros do MP e os magistrados) é sempre inferior ao de servidores que compõem as carreiras de apoio, fora o fato de que aqueles necessariamente desempenham as atribuições de chefia e gestão.
Assim, os impactos de uma remoção de ofício em relação aos promotores, procuradores e magistrados são muito maiores em termos logísticos do que aqueles gerados pela remoção de ofício de um servidor, a justificar a diferença de tratamento legal: para os primeiros reservou-se o direito do gozo de licença; para os segundos o direito à remoção em si.
Ainda, se se entender que o art. 36 da Lei n. 8.112/1990 pode ser aplicado subsidiariamente, nos casos em que o procurador tiver como cônjuge servidor e esse for removido de ofício (art. 36, III, "a"), o primeiro também terá direito à remoção, ampliando-se bastante as hipóteses de remoção de membro de poder, em detrimento da organização do serviço público e da criteriosa lista de antiguidade.
É lícito concluir que a omissão na lei própria do MPU a respeito da remoção para tratamento de saúde de familiar não se tratou de omissão atécnica do legislador, mas caso de silêncio eloquente/opção nesse aspecto.
Entretanto, colhe-se do caso concreto que a recorrida se encontra removida para tratar filho menor (com autismo) desde 2016, constando ainda do acórdão recorrido que foi produzida vasta e incontroversa prova no sentido de que: (a) o infante deve permanecer no local onde iniciou as terapias relacionadas ao autismo e manter seu convívio familiar, social, terapêutico e escolar, o mais estruturado possível, sem alterações significativas; (b) quaisquer variações no ambiente de vivência do menor, mesmo que mínimas, reverberam sobejamente na progressão/regressão da doença, dada a sua sensibilidade psicológica; (c) a cidade de lotação originária da autora não dispõe de quadro de profissionais que pudessem atender às necessidades da criança; (d) ficou evidenciada a extrema importância da presença da mãe junto à criança para que essa apresente desenvolvimento saudável, bem como os impactos negativos, com comprometimento de sintomas e do processo de desenvolvimento, em caso de ausência da genitora; e (e) poderia haver prejuízos à criança em caso de mudança de domicílio, com afastamento de outros familiares, pois o filho da recorrida estaria saindo do "seu mundo autista, para ele intocável e só dele, para algo diferente e estranho onde o processo de socialização será afetado de forma brutal, acarretando prejuízo na possível melhora de seus sintomas e um prognóstico reservado".
Todo esse contexto demonstra que, a despeito de a tese jurídica defendida pela União ser a correta, no caso concreto, a restauração da estrita legalidade, com a mudança da autora e do filho (pessoa com deficiência) para a lotação de origem ocasionaria muito mais danos sociais que a manutenção da situação consolidada (teoria do fato consumado/consolidado).
Esta Corte entende que em demandas envolvendo interesse de criança, como no caso, a solução da controvérsia deve sempre observar o princípio do melhor interesse do menor, introduzido em nosso sistema jurídico como corolário da doutrina da proteção integral, consagrada pelo art. 227 da Constituição Federal, o qual deve orientar a atuação tanto do legislador quanto do aplicador da norma jurídica, vinculando-se o ordenamento infraconstitucional aos seus contornos (STJ, HC 776.461/SC, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 29/11/2022, DJe 1º/12/2022).