STJ - Terceira Seção
REsp 2.027.794-MS
Recurso Especial
Outros Processos nesta Decisão
REsp 2.029.515-MS • REsp 2.026.129-MS
Julgamento: 12/06/2024
STJ - Terceira Seção
REsp 2.027.794-MS
Tese Jurídica Simplificada
A aplicação da agravante prevista no Código Penal que tutela, em sua parte final, a violência contra mulher, pode ser aplicada em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha para o crime de lesão corporal qualificada pela violência doméstica sem que isso configure bis in idem.
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Tese Jurídica Oficial
A aplicação da agravante do art. 61, inc. II, alínea f, do Código Penal, em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/2006), não configura bis in idem.
Resumo Oficial
Não há bis in idem na aplicação da agravante genérica prevista na alínea f do inc. II do art. 61 do Código Penal, inserida pela Lei n. 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), em relação ao crime previsto no art. 129, § 9º, do mesmo Código, vez que a agravante objetiva uma sanção punitiva maior quando a conduta criminosa é praticada "com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica".
Já as elementares do crime de lesão corporal, tipificado no art. 129, § 9º, do Código Penal, traz a figura da lesão corporal praticada no espaço doméstico, de coabitação ou de hospitalidade, contra qualquer pessoa independente do gênero, bastando ser ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem o agente conviva ou tenha convivido, ou seja, as elementares do tipo penal não fazem referência ao gênero feminino da vítima, enquanto o que justifica a agravante é essa condição de caráter pessoal (gênero feminino - mulher).
O caput do art. 61 do Código Penal estabelece que as circunstâncias agravantes genéricas sempre devem ser observadas na dosimetria da pena, desde que não constituem ou qualificam o crime.
A circunstância que agrava a pena é a prática do crime de violência doméstica contra a mulher, enquanto a circunstância elementar do tipo penal do art. 129, § 9º, do Código Penal, não faz nenhuma referência ao gênero feminino, ou seja, a melhor interpretação - segundo o art. 5° da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - é aquela que atende a função social da Lei, e, por isso, deve-se punir mais a lesão corporal contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, se a vítima for mulher (gênero feminino), haja vista a necessária aplicação da agravante genérica do art. 61, inc. II, alínea f, do Código Penal.
Contexto
Para compreender o julgado, é importante relembrar o sistema trifásico de fixação da pena:
No caso concreto, discutiu-se se a agravante prevista no artigo 61, inciso II, alínea f, do Código Penal (CP) poderia ser aplicada em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha para o crime previsto no artigo 129, § 9º, do Código Penal ou se isso configuraria bis in idem.
O artigo 129, § 9º do CP trata da forma qualificada de lesão corporal pela violência doméstica.
Vejamos:
Em outras palavras, quando a lesão corporal é praticada com violência doméstica, a pena base do crime é superior (qualificada) em relação ao tipo do artigo 129, caput, do CP.
Além do tipo qualificado pela violência doméstica (que é causa a ser observada na 1ª fase da dosimetria da pena), há também a agravante prevista no art. 61, inc. II, alínea f, do CP (que é causa a ser observada na 2ª fase da dosimetria da pena).
Essa agravante dispõe da violência doméstica contra a mulher na parte final:
É importante destacar que ambos os dispositivos mencionados foram modificados pela Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006).
Pergunta-se: a pessoa que comete o crime de lesão corporal qualificada pela violência doméstica previsto no CP, pode ter a pena agravada conforme disposição da Lei Maria da Penha inserida no art. 61, inc. II, alínea f, do CP?
Julgamento
Para a Terceira Seção do STJ, a agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea f, do Código Penal pode ser aplicada em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha no art. 129, § 9º, do mesmo Código sem que isso configure bis in idem.
A Corte destacou que não há bis in idem na aplicação da agravante genérica prevista na alínea f do inc. II do art. 61 do Código Penal, inserida pela Lei Maria da Penha, em relação ao crime previsto no art. 129, § 9º, do mesmo Código porque os objetivos são diversos:
Assim, como a agravante leva em consideração o gênero, enquanto a lesão corporal qualificada não o faz, ambas podem ser aplicadas em conjunto, pois os elementos da agravante (gênero, principalmente) não constituem e nem qualificam o crime.
Portanto, em resumo, a aplicação da agravante prevista no Código Penal que tutela, em sua parte final, a violência contra mulher, pode ser aplicada em conjunto com as disposições da Lei Maria da Penha sem que isso configure bis in idem.