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STJ - Primeira Turma

REsp 2.090.730-RJ

Recurso Especial

Relator: Paulo Sérgio Domingues

Julgamento: 08/10/2024

Publicação: 14/10/2024

STJ - Primeira Turma

REsp 2.090.730-RJ

Tese Jurídica Simplificada

O presidente de uma sociedade privada, na qual subsidiária de uma empresa estatal detenha participação acionária relevante, não exerce "função pública de direção" para os fins da Lei 13.254/2016 (RERCT).

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Tese Jurídica Oficial

Presidente de sociedade por ações de capital fechado, na qual subsidiária de sociedade de economia mista federal detenha participação acionária relevante (embora não majoritária), não exerce "função pública de direção", contida na Lei n. 13.254/2016, que instituiu o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT).

Resumo Oficial

A controvérsia consiste em definir se o conceito de "função pública de direção", contido no preceito legal do art. 11 da Lei n. 13.254/2016, que instituiu o Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT), abrange o exercício de presidência de sociedade por ações de capital fechado, na qual subsidiária de sociedade de economia mista federal detenha participação acionária relevante, embora não majoritária.

Destaca-se, de início, que o conceito de "função pública" não é inequívoco. Por um lado, tem-se aquilo que se pode chamar de função pública em sentido estrito, o que corresponde ao plexo de atribuições de direção, chefia ou assessoramento que são cometidas por lei a servidores públicos ocupantes de cargo efetivo na administração. Trata-se das "funções de confiança" a que se refere o art. 37, V, da Constituição Federal, e que, na esfera federal, são pormenorizadamente reguladas por dispositivos da Lei n. 8.112/1990, que as denomina também como "função gratificada" (art. 93, § 6º) ou "função comissionada" (artigos 60-D e 127).

Sob outro prisma, tem-se o conceito de função pública em sentido amplo, definido pela doutrina como "qualquer atividade do Estado que vise diretamente à satisfação de uma necessidade ou conveniência pública". Em sentido lato, vê-se que o exercício de função pública não é exclusivo de servidor público (exercente de cargo, emprego ou função em sentido estrito), podendo a função pública ser cometida a indistintos agentes públicos, os quais a doutrina define como "os sujeitos que servem ao Poder Público como instrumentos expressivos de sua vontade ou ação, ainda quando o façam apenas ocasional ou episodicamente".

Não parece haver dúvidas de que presidente de sociedade anônima, eleito por assembleia de acionistas disciplinada nos termos da Lei n. 6.404/1976, não ocupa cargo efetivo na administração pública direta ou indireta, colocando-se, portanto, completamente à margem do conceito de "função pública" em seu sentido estrito, tal como acima conceituado.

Mais complexo se torna o exame da matéria quando compreendida a expressão "função pública de direção" contida no art. 11 da Lei n. 13.254/2016 em seu sentido amplo, hipótese que demanda, então, investigar-se a natureza jurídica de uma sociedade por ações de capital fechado, formada a partir de parceria estratégica firmada por empresas privadas e por subsidiária de sociedade de economia mista federal que detém participação acionária relevante, embora não majoritária, como, por exemplo, o Banco do Brasil.

O Tribunal de Contas da União, em levantamento realizado com o objetivo de conhecer o processo de trabalho de parcerias estratégicas do Banco do Brasil S/A e suas subsidiárias, reconheceu a "parceria estratégica" como sendo a "associação de longo prazo entre duas ou mais empresas que buscam, sem prejuízo de suas estratégias individuais, complementariedade para incrementar os seus negócios, reduzir custos, compartilhar riscos e benefícios, ampliar sua capilaridade e/ou alavancar capacitações, visando ser mais competitivas no mercado" (TCU, Relatório de Levantamento 018.149/2020-0, Plenário, Acórdão 3.230/2020, Rel. Ministro Bruno Dantas, j. 02/12/2020).

Segundo informação constante no acórdão do Tribunal de Contas da União, no caso de o parceiro público deter 49,99% da participação acionária da companhia, tal fato confere para a sociedade por ações de capital fechado então, o status de "sociedade privada", ou seja, "entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio próprio e cuja maioria do capital votante não pertença direta ou indiretamente à União, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município" (Decreto n. 8.945/2016, art. 2º, VI).

A natureza de sociedade privada, afirmada no mencionado decreto regulamentador da Lei n. 13.303/2016 (estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias), dispensa a edição de lei específica para que o parceiro público participe dela, bastando, para tanto, autorização conferida pelo conselho de administração decorrente da constatação de que a participação está em linha com o plano de negócios do ente estatal (Lei n. 13.303/2016, art. 2º, § 3º). Além disso, embora possua "sócio" minoritário público, não se exige da sociedade privada obediência ao regime de aquisição de bens e serviços por licitação, ou mesmo observância de concurso público para a contratação de pessoal, embora a lei imponha ao parceiro público minoritário que adote, no exercício do dever de fiscalização da companhia privada, práticas de governança e controle proporcionais à relevância, à materialidade e aos riscos do negócio (art. 1º, § 7º, caput).

Essas características essenciais da sociedade privada formada a partir de uma parceria estratégica entre empresas privadas e sociedade anônima controlada pelo Estado (parceiro minoritário) conduzem à conclusão de que, respeitado o critério legal previsto no art. 4º do Decreto-Lei n. 200/1967 ("A Administração Federal compreende: I - A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios. II - A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria: a) Autarquias; b) Empresas Públicas; c) Sociedades de Economia Mista. d) fundações públicas"), não há como se considerar a sociedade privada como sendo integrante da administração pública direta ou indireta.

O administrador da sociedade privada, por sua vez, não atua com vistas à satisfação de interesses públicos, mas sim ao atendimento dos interesses da companhia que administra, submetendo-se, com exclusividade, aos controles e responsabilidades previstos na Lei n. 6.404/1976, que rege toda e qualquer sociedade por ações, inclusive aquelas nas quais presente a participação societária minoritária por ente estatal. Dessa forma, ele não pode ser rotulado como agente público, mas sim privado, e não exerce função pública de direção, ainda quando tomada essa figura jurídica por seu sentido mais amplo.

Sendo assim, considerando-se a ratio decidendi da ADI 5.586/DF, os conceitos de função pública e agente público tal como doutrinariamente estabelecidos, bem como o arranjo societário que deu origem à sociedade privada parceira de ente público, conclui-se que o presidente desse tipo de sociedade não exerce "função pública de direção" tal como prevista no art. 11 da Lei n. 13.254/2016. Não incide, por conseguinte, o referido preceito legal a tal sociedade privada, de modo que esta não pode ser privada dos benefícios fiscais e tributários instituídos pelo RERCT.

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