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STJ - Terceira Turma

REsp 2.031.816-RJ

Recurso Especial

Relator: Nancy Andrighi

Julgamento: 14/03/2023

Publicação: 22/03/2023

STJ - Terceira Turma

REsp 2.031.816-RJ

Tese Jurídica

O shopping center e o estacionamento vinculado a ele podem ser responsabilizados por roubo à mão armada ocorrido na cancela para ingresso no estabelecimento comercial, em via pública.

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Nossos Comentários

Para saber se determinado caso fortuito é passível de ser imputado ao fornecedor, gerando dever de indenizar, é necessário analisar o risco da atividade.

  • Caso Fortuito Interno: fato relacionado aos riscos da atividade desenvolvida pelo fornecedor. Exemplo: Roubo em agência bancária. Nesses casos, subsiste o dever de indenizar por parte do fornecedor.
  • Caso Fortuito Externo: Não guarda qualquer relação com a atividade desenvolvida pelo fornecedor. É uma situação completamente imprevisível, não decorrendo do risco da atividade. Ex.: assalto em ônibus. É uma causa que exclui a responsabilidade do fornecedor, e portanto não há dever de indenizar. 

Há autores, ainda, que advogam a possibilidade de certa “compensação de culpas”. Ou seja, se houver concorrência da culpa entre consumidor e fornecedor, a indenização será devida (Flávio Tartuce).

É relativamente pacificado no STJ que os shoppings centers não respondem pelo roubo à mão armada em estacionamento gratuito, externo e de livre acesso (comentário em vídeo aqui) porque, apesar de ser uma comodidade oferecida ao cliente, o estabelecimento não firma compromisso de efetivamente proteger os veículos.

No entanto, o caso em questão é diferente. O roubo à mão armada ocorreu na cancela para apresentar ingresso no estabelecimento comercial, em via pública. Nesse caso, o risco do ato ilícito foi incrementado pelo estabelecimento, que exigiu a parada dos veículos nessa via e não proporcionou a segurança necessária ao consumidor. Por isso, segundo o STJ, é possível responsabilizar o estabelecimento e o estacionamento conveniado.

Resumo Oficial

Pragmaticamente, incide o regramento consumerista no percurso relacionado com a prestação do serviço e, notadamente, quando o fornecedor dele se vale no interesse de atrair o consumidor. Assim, na hipótese de se exigir do consumidor determinada conduta para que usufrua do serviço prestado pela fornecedora, colocando-o em vulnerabilidade não só jurídica, mas sobretudo fática, ainda que momentaneamente, se houver falha na prestação do serviço, será o fornecedor obrigado a indenizá-lo.

Nessa linha de raciocínio, quando o consumidor, com a finalidade de ingressar no estacionamento de shopping center, tem de reduzir a velocidade ou até mesmo parar seu veículo e se submeter à cancela - barreira física imposta pelo fornecedor e em seu benefício - incide a proteção consumerista, ainda que o consumidor não tenha ultrapassado referido obstáculo e mesmo que este esteja localizado na via pública.

Nessa hipótese, o consumidor se encontra, de fato, na área de prestação do serviço oferecido pelo estabelecimento comercial. Por conseguinte, também nessa área incidem os deveres inerentes às relações consumeristas e ao fornecimento de segurança indispensável que se espera dos estacionamentos de shoppings centers.

Esta Corte analisou situação parecida, na qual o consumidor que se encontrava dentro de estacionamento de shopping center, ao parar na cancela para sair do referido estabelecimento, foi surpreendido pela abordagem de indivíduos com arma de fogo que tentaram subtrair seus pertences (REsp 1.269.691/PB, Quarta Turma, DJe 5/3/2014).

Da mesma maneira como sucede com a saída, o consumidor também está sujeito a tal vulnerabilidade ao ingressar no estabelecimento. É necessário que aquele, a fim de utilizar o serviço oferecido pela recorrente, permaneça - ainda que por pouco tempo - desprotegido ao esperar a emissão do ticket e o levantamento da cancela.

Inclusive, a única razão para que o consumidor permaneça desprotegido, aguardando a abertura da cancela, é, justamente, para ingressar no estabelecimento do fornecedor. Logo, não pode o shopping center buscar afastar sua responsabilidade por aquilo que criou para se beneficiar e que também lhe incumbe proteger, sob pena de violar até mesmo o comando da boa-fé objetiva e o princípio da proteção contratual do consumidor.

Em síntese, o shopping center e o estacionamento vinculado podem ser responsabilizados por defeitos na prestação do serviço não só quando o consumidor se encontra efetivamente dentro da área assegurada, mas também quando se submete à cancela para ingressar no estabelecimento comercial.

No que tange especificamente à responsabilidade de shoppings centers, este Superior Tribunal de Justiça, "conferindo interpretação extensiva à Súmula n. 130/STJ, entende que estabelecimentos comerciais, tais como grandes shoppings centers e hipermercados, ao oferecerem estacionamento, ainda que gratuito, respondem pelos assaltos à mão armada praticados contra os clientes quando, apesar de o estacionamento não ser inerente à natureza do serviço prestado, gera legítima expectativa de segurança ao cliente em troca dos benefícios financeiros indiretos decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores" (EREsp 1.431.606/SP, Segunda Seção, DJe 2/5/2019) - com exceção da hipótese em que o estacionamento representa "mera comodidade, sendo área aberta, gratuita e de livre acesso por todos".

Com efeito, não cabe dúvida de que a empresa que agrega ao seu negócio um serviço visando à comodidade e à segurança do cliente deve responder por eventuais defeitos ou deficiências na sua prestação. Afinal, serviços dessa natureza não têm outro objetivo senão atrair um número maior de consumidores ao estabelecimento, incrementando o movimento e, por via de consequência, o lucro, devendo o fornecedor, portanto, suportar os ônus respectivos.

Nos termos expostos, pode-se concluir que o shopping center que oferece estacionamento responde por roubo perpetrado por terceiro à mão armada ocorrido na cancela para ingresso no estabelecimento, uma vez que gerou no consumidor expectativa legítima de segurança em troca dos benefícios financeiros que percebera indiretamente.

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