Cinge-se a controvérsia acerca da necessidade ou não de citação para contestar pedido de aplicação de medidas protetivas da Lei n. 11.340/2006, Lei Maria da Penha, bem como da incidência ou não dos efeitos da revelia.
De início, não figura viável incluir as medidas protetivas de urgência como espécies de tutela inibitória. Ao contrário da última, as medidas previstas na Lei Maria da Penha são concedidas em caráter provisório, a título precário, visto que se baseiam não em juízo de certeza da prática ou da ameaça da prática do ato ilícito pelo agressor, mas em juízo de probabilidade, fundado em elementos indiciários colhidos em fase procedimental preliminar. Dessa forma, as medidas devem ser, por sua natureza, revogáveis e reversíveis, quando constatada a superveniente ausência dos motivos autorizadores de sua aplicação.
Quanto à distinção entre tutelas antecipadas ou tutelas cautelares, o objeto destas medidas não coincide com o objeto da tutela jurisdicional final. Não se pretende precipuamente, por meio da decretação dessas medidas, antecipar os efeitos da sentença ou antecipar a fruição do bem jurídico desejado pelo autor da demanda, que apenas seria obtido ao final do processo de conhecimento, em caso de procedência da pretensão deduzida em juízo. Ao se decretar uma medida protetiva, visa-se, antes de tudo, proteger a vida e a incolumidade física e psíquica da vítima e, com isso, de uma forma mais ampla, acautelar a ordem pública, uma das finalidades das cautelares previstas no Código de Processo Penal.
Quanto à distinção entre a natureza cível e a natureza criminal das medidas protetivas, a jurisprudência desta Corte Superior, há muito, posiciona-se no sentido de que aquelas previstas no art. 22, incisos I, II e III, da Lei n. 11.340/2006 são de natureza criminal, enquanto as dispostas nos demais incisos desse dispositivo têm natureza cível.
Isso porque, em primeiro lugar, as medidas previstas nos três primeiros incisos do art. 22 implicam, de um lado, relevante restrição à liberdade de ir e vir do acusado, enquanto buscam, de outro vértice, preservar os direitos fundamentais à vida e à integridade física e psíquica da suposta vítima. O status elevado dos direitos em contraste, dos mais caros à Constituição e ao Estado Democrático de Direito, justifica uma tutela de ordem penal, tanto para o acusado, pois sua liberdade não pode vir a ser restringida de forma temerária e sem a observância de requisitos mínimos, quanto para a ofendida, que busca na esfera penal uma tutela célere e efetiva de seus direitos.
Um segundo aspecto, a reforçar este entendimento, refere-se à possibilidade de decretação de prisão preventiva do suposto agressor para "assegurar a execução das medidas protetivas de urgência", nos crimes que envolvem violência doméstica e familiar, a teor do inciso III do art. 313 do CPP.
Ou seja, eventual renitência do acusado em descumprir as medidas impostas pelo juiz, especialmente aquelas que determinam seu afastamento da vítima e a proibição de com ela manter contato, podem fundamentar a decretação de prisão provisória do suposto agressor. Se tais medidas fossem consideradas de natureza cível, a possibilidade de decretação de prisão ficaria prejudicada, ante a impossibilidade de se criar, por lei, nova hipótese de prisão civil, para além da expressa previsão constitucional relativa ao devedor de alimentos (art. 5º, inciso LXVII, da CF).
Assim, se o próprio diploma processual penal passou a prever expressamente a possibilidade de decretação de prisão preventiva ao acusado que descumpre medida protetiva anteriormente imposta, pode-se concluir que o legislador considerou ter natureza penal a cautelar em questão, pois de outra forma não se poderia cogitar de hipótese de privação temporária da liberdade do renitente.
Ademais, as medidas protetivas dos incisos I, II e III do art. 22 da Lei n. 11.340/2006, remetem ao paralelismo existente entre estas e as medidas alternativas à prisão dos incisos II e III do art. 319 do CPP. Dessa forma, tanto a proibição de acessar ou frequentar determinados lugares para evitar a prática de novas infrações penais, quanto a proibição de manter contato com pessoa determinada têm grande semelhança com as medidas de proibição de aproximar-se da vítima e de com ela manter contato, previstas na lei protetiva à mulher.
D'outro vértice, particularmente no que tange à disciplina das medidas protetivas, denota-se não haver previsão de procedimento específico para concessão da tutela cautelar, restringindo-se a lei a determinar, em seu art. 18, que caberá ao juiz, a requerimento do Ministério Público ou da ofendida, no prazo de 48 horas, decidir sobre as medidas protetivas, entre outras providências. Dessa feita, não cabe a instauração de um processo, com citação do requerido para ciência e contestação, sob pena de decretação de sua revelia, nos moldes do estabelecido na lei processual civil.
Aplicável, sim, o regramento do Código Processual Penal que, em caso de risco à efetividade da medida, determina a intimação do suposto agressor após a decretação da cautelar, facultando-lhe a possibilidade de manifestar-se nos autos a qualquer tempo, sem a aplicação dos efeitos da revelia. O parágrafo único do art. 21 também reforça a não adoção do regramento previsto no CPC, porquanto determina que "a ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor", nada mencionando sobre citação.
Reconhecer a natureza penal das medidas cautelares dos incisos I, II e III do art. 22 da Lei Maria da Penha traz uma dúplice proteção: de um lado, protege a vítima, pois concede a ela um meio célere e efetivo de tutela de sua vida e de sua integridade física e psicológica, pleiteada diretamente à autoridade policial, e reforçada pela possibilidade de decretação da prisão preventiva do suposto autor do delito; de outro lado, protege o acusado, porquanto concede a ele a possibilidade de se defender da medida a qualquer tempo, sem risco de serem a ele aplicados os efeitos das revelia.
Portanto, deve-se aplicar às medidas protetivas de urgência o regramento previsto pelo Código de Processo Penal no que tange às medidas cautelares. Dessa forma, não cabe falar em instauração de processo próprio, com citação do requerido, tampouco com a possibilidade de decretação de sua revelia em caso de não apresentação de contestação no prazo de cinco dias. Aplicada a cautelar inaudita altera pars, para garantia de sua eficácia, o acusado será intimado de sua decretação, facultando-lhe, a qualquer tempo, a apresentação de razões contrárias à manutenção da medida.
Cinge-se a controvérsia acerca da necessidade ou não de citação para contestar pedido de aplicação de medidas protetivas da Lei n. 11.340/2006, Lei Maria da Penha, bem como da incidência ou não dos efeitos da revelia.
De início, não figura viável incluir as medidas protetivas de urgência como espécies de tutela inibitória. Ao contrário da última, as medidas previstas na Lei Maria da Penha são concedidas em caráter provisório, a título precário, visto que se baseiam não em juízo de certeza da prática ou da ameaça da prática do ato ilícito pelo agressor, mas em juízo de probabilidade, fundado em elementos indiciários colhidos em fase procedimental preliminar. Dessa forma, as medidas devem ser, por sua natureza, revogáveis e reversíveis, quando constatada a superveniente ausência dos motivos autorizadores de sua aplicação.
Quanto à distinção entre tutelas antecipadas ou tutelas cautelares, o objeto destas medidas não coincide com o objeto da tutela jurisdicional final. Não se pretende precipuamente, por meio da decretação dessas medidas, antecipar os efeitos da sentença ou antecipar a fruição do bem jurídico desejado pelo autor da demanda, que apenas seria obtido ao final do processo de conhecimento, em caso de procedência da pretensão deduzida em juízo. Ao se decretar uma medida protetiva, visa-se, antes de tudo, proteger a vida e a incolumidade física e psíquica da vítima e, com isso, de uma forma mais ampla, acautelar a ordem pública, uma das finalidades das cautelares previstas no Código de Processo Penal.
Quanto à distinção entre a natureza cível e a natureza criminal das medidas protetivas, a jurisprudência desta Corte Superior, há muito, posiciona-se no sentido de que aquelas previstas no art. 22, incisos I, II e III, da Lei n. 11.340/2006 são de natureza criminal, enquanto as dispostas nos demais incisos desse dispositivo têm natureza cível.
Isso porque, em primeiro lugar, as medidas previstas nos três primeiros incisos do art. 22 implicam, de um lado, relevante restrição à liberdade de ir e vir do acusado, enquanto buscam, de outro vértice, preservar os direitos fundamentais à vida e à integridade física e psíquica da suposta vítima. O status elevado dos direitos em contraste, dos mais caros à Constituição e ao Estado Democrático de Direito, justifica uma tutela de ordem penal, tanto para o acusado, pois sua liberdade não pode vir a ser restringida de forma temerária e sem a observância de requisitos mínimos, quanto para a ofendida, que busca na esfera penal uma tutela célere e efetiva de seus direitos.
Um segundo aspecto, a reforçar este entendimento, refere-se à possibilidade de decretação de prisão preventiva do suposto agressor para "assegurar a execução das medidas protetivas de urgência", nos crimes que envolvem violência doméstica e familiar, a teor do inciso III do art. 313 do CPP.
Ou seja, eventual renitência do acusado em descumprir as medidas impostas pelo juiz, especialmente aquelas que determinam seu afastamento da vítima e a proibição de com ela manter contato, podem fundamentar a decretação de prisão provisória do suposto agressor. Se tais medidas fossem consideradas de natureza cível, a possibilidade de decretação de prisão ficaria prejudicada, ante a impossibilidade de se criar, por lei, nova hipótese de prisão civil, para além da expressa previsão constitucional relativa ao devedor de alimentos (art. 5º, inciso LXVII, da CF).
Assim, se o próprio diploma processual penal passou a prever expressamente a possibilidade de decretação de prisão preventiva ao acusado que descumpre medida protetiva anteriormente imposta, pode-se concluir que o legislador considerou ter natureza penal a cautelar em questão, pois de outra forma não se poderia cogitar de hipótese de privação temporária da liberdade do renitente.
Ademais, as medidas protetivas dos incisos I, II e III do art. 22 da Lei n. 11.340/2006, remetem ao paralelismo existente entre estas e as medidas alternativas à prisão dos incisos II e III do art. 319 do CPP. Dessa forma, tanto a proibição de acessar ou frequentar determinados lugares para evitar a prática de novas infrações penais, quanto a proibição de manter contato com pessoa determinada têm grande semelhança com as medidas de proibição de aproximar-se da vítima e de com ela manter contato, previstas na lei protetiva à mulher.
D'outro vértice, particularmente no que tange à disciplina das medidas protetivas, denota-se não haver previsão de procedimento específico para concessão da tutela cautelar, restringindo-se a lei a determinar, em seu art. 18, que caberá ao juiz, a requerimento do Ministério Público ou da ofendida, no prazo de 48 horas, decidir sobre as medidas protetivas, entre outras providências. Dessa feita, não cabe a instauração de um processo, com citação do requerido para ciência e contestação, sob pena de decretação de sua revelia, nos moldes do estabelecido na lei processual civil.
Aplicável, sim, o regramento do Código Processual Penal que, em caso de risco à efetividade da medida, determina a intimação do suposto agressor após a decretação da cautelar, facultando-lhe a possibilidade de manifestar-se nos autos a qualquer tempo, sem a aplicação dos efeitos da revelia. O parágrafo único do art. 21 também reforça a não adoção do regramento previsto no CPC, porquanto determina que "a ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor", nada mencionando sobre citação.
Reconhecer a natureza penal das medidas cautelares dos incisos I, II e III do art. 22 da Lei Maria da Penha traz uma dúplice proteção: de um lado, protege a vítima, pois concede a ela um meio célere e efetivo de tutela de sua vida e de sua integridade física e psicológica, pleiteada diretamente à autoridade policial, e reforçada pela possibilidade de decretação da prisão preventiva do suposto autor do delito; de outro lado, protege o acusado, porquanto concede a ele a possibilidade de se defender da medida a qualquer tempo, sem risco de serem a ele aplicados os efeitos das revelia.
Portanto, deve-se aplicar às medidas protetivas de urgência o regramento previsto pelo Código de Processo Penal no que tange às medidas cautelares. Dessa forma, não cabe falar em instauração de processo próprio, com citação do requerido, tampouco com a possibilidade de decretação de sua revelia em caso de não apresentação de contestação no prazo de cinco dias. Aplicada a cautelar inaudita altera pars, para garantia de sua eficácia, o acusado será intimado de sua decretação, facultando-lhe, a qualquer tempo, a apresentação de razões contrárias à manutenção da medida.