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STJ - Quinta Turma

REsp 1.972.098-SC

Recurso Especial

Relator: Ribeiro Dantas

Julgamento: 14/06/2022

Publicação: 20/06/2022

STJ - Quinta Turma

REsp 1.972.098-SC

Tese Jurídica Simplificada

O réu que confessa tem direito à atenuação da pena ainda que a confissão não tenha sido usada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença.

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Confissão e impacto na pena

Sabe-se que o ato de confessar é aquele em que o acusado ou suspeito de determinado crime admite para a autoridade competente, de maneira voluntária, consciente, expressa e pessoal, um determinado fato ou conduta praticada por ele. É um ato solene e público no qual fica reduzido a termo (registrado) algum fato criminoso.

De acordo com o art. 65, III, "d" do Código Penal, a confissão espontânea é uma atenuante da pena. 

A súmula 545 do STJ dispõe que:

"quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal".

O julgado em questão trata sobre a interpretação dessa súmula. 

Conforme julgados de diversos juízos criminais e até do próprio STJ, entende-se que quando o juiz não mencionar a confissão entre os fundamentos da sentença, a referida atenuante não deve incidir na pena final do réu.

Contudo, tal entendimento foi revertido.

Novo entendimento

Na visão do Ministro Relator Ribeiro Dantas, a Súmula 545 do STJ foi editada com a intenção de proteger o réu, fazendo incidir a atenuante mesmo nos casos de confissão qualificada, parcial, extrajudicial, retratada, etc.

O art. 65, III, "d", do CP, não exige, para sua incidência, que a confissão do réu tenha sido usada na sentença como uma das razões da condenação. O direito subjetivo à atenuação da pena surge quando o réu confessa (momento constitutivo), e não quando o juiz cita sua confissão na fundamentação da sentença condenatória (momento meramente declaratório).

Condicionar a diminuição da pena à citação expressa da confissão na sentença viola o princípio da legalidade, principalmente porque o direito subjetivo e preexistente do réu não pode ficar disponível ao arbítrio do julgador. Se a lei determinasse que a sentença condenatória deveria mencionar a confissão, haveria um pressuposto adicional que mudaria o momento constitutivo do direito subjetivo do réu. 

Do mesmo modo, caso o art. 65, III, "d" do CP, impusesse à confissão outros pressupostos, não previstos para as demais atenuantes, ou exigisse que a confissão produzisse certos efeitos práticos sobre a investigação criminal, o acusado que não cumprisse com todos os requisitos legais não teria a legítima expectativa à redução da pena.

Tal restrição também ofende os princípios da isonomia e da individualização da pena, por permitir que réus em situações processuais idênticas recebem respostas diferentes do Judiciário, caso a sentença condenatória de um deles tenha como um de seus fundamentos a confissão e a outra não.

A atenuante da confissão, ao contrário da colaboração e da delação premiadas, não se fundamenta nos efeitos ou facilidades eventualmente trazidas para a apuração do crime, mas sim no senso de responsabilidade pessoal do acusado.

Consequentemente, a existência de outras provas da culpabilidade do acusado, e mesmo eventual prisão em flagrante, não autorizam o julgador a recusar a atenuação da pena, especialmente porque a confissão corrobora as demais provas.

É necessário proteger a confiança depositada de boa-fé pelo acusado na legislação penal, tutelando sua legítima expectativa induzida pela própria lei quanto à atenuação da pena.

Por esses motivos, é possível concluir que o réu que confessa tem direito à atenuação da pena ainda que a confissão não tenha sido usada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença.

Tese Jurídica Oficial

O réu fará jus à atenuante do art. 65, III, 'd', do CP quando houver admitido a autoria do crime perante a autoridade, independentemente de a confissão ser utilizada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença condenatória, e mesmo que seja ela parcial, qualificada, extrajudicial ou retratada.

Resumo Oficial

Trata-se de proposta do Ministério Público para interpretação a contrario sensu da Súmula 545/STJ para concluir que, quando a confissão não for utilizada como um dos fundamentos da sentença condenatória, o réu, mesmo tendo confessado, não fará jus à atenuante respectiva.

Contudo, tal compreensão, embora esteja presente em alguns julgados recentes desta Corte Superior, não encontra amparo em nenhum dos precedentes geradores da Súmula 545/STJ. Estes precedentes instituíram para o réu a garantia de que a atenuante incide mesmo nos casos de confissão qualificada, parcial, extrajudicial, retratada, etc. Nenhum deles, porém, ordenou a exclusão da atenuante quando a confissão não for empregada na motivação da sentença, até porque esse tema não foi apreciado quando da formação do enunciado sumular.

Nesse sentido, o art. 65, III, "d", do CP não exige, para sua incidência, que a confissão do réu tenha sido empregada na sentença como uma das razões da condenação. Com efeito, o direito subjetivo à atenuação da pena surge quando o réu confessa (momento constitutivo), e não quando o juiz cita sua confissão na fundamentação da sentença condenatória (momento meramente declaratório).

Ademais, viola o princípio da legalidade condicionar a atenuação da pena à citação expressa da confissão na sentença como razão decisória, mormente porque o direito subjetivo e preexistente do réu não pode ficar disponível ao arbítrio do julgador. Afinal, se a lei condicionasse a atenuação da pena à menção da confissão na sentença condenatória, haveria um pressuposto adicional que mudaria o momento constitutivo do direito subjetivo do réu. Da mesma forma, caso o art. 65, III, "d", do CP impusesse à confissão pressupostos adicionais, não previstos para as demais atenuantes, ou exigisse que a confissão produzisse certos efeitos práticos sobre a investigação criminal, não haveria que se falar em legítima expectativa à redução da pena por parte do acusado que não cumprisse todos os requisitos legais.

Essa restrição ofende também os princípios da isonomia e da individualização da pena, por permitir que réus em situações processuais idênticas recebam respostas divergentes do Judiciário, caso a sentença condenatória de um deles elenque a confissão como um dos pilares da condenação e a outra não o faça.

Ao contrário da colaboração e da delação premiadas, a atenuante da confissão não se fundamenta nos efeitos ou facilidades que a admissão dos fatos pelo réu eventualmente traga para a apuração do crime (dimensão prática), mas sim no senso de responsabilidade pessoal do acusado, que é característica de sua personalidade, na forma do art. 67 do CP (dimensão psíquico-moral).

Consequentemente, a existência de outras provas da culpabilidade do acusado, e mesmo eventual prisão em flagrante, não autorizam o julgador a recusar a atenuação da pena, em especial porque a confissão, enquanto espécie sui generis de prova, corrobora objetivamente as demais.

O sistema jurídico precisa proteger a confiança depositada de boa-fé pelo acusado na legislação penal, tutelando sua expectativa legítima e induzida pela própria lei quanto à atenuação da pena. A decisão pela confissão, afinal, é ponderada pelo réu considerando o trade-off entre a diminuição de suas chances de absolvição e a expectativa de redução da reprimenda.

É contraditória e viola a boa-fé objetiva a postura do Estado em garantir a atenuação da pena pela confissão, na via legislativa, a fim de estimular que acusados confessem; para depois desconsiderá-la no processo judicial, valendo-se de requisitos não previstos em lei.

Por tudo isso, o réu fará jus à atenuante do art. 65, III, "d", do CP quando houver confessado a autoria do crime perante a autoridade, independentemente de a confissão ser utilizada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença condenatória.

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