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STJ - Primeira Seção

REsp 1.878.849-TO

Recurso Especial

Repetitivo

Relator: Manoel Erhardt

Julgamento: 24/02/2022

Publicação: 02/03/2022

STJ - Primeira Seção

REsp 1.878.849-TO

Tese Jurídica Simplificada

É ilegal deixar de conceder a progressão funcional de servidor público quando atendidos todos os requisitos legais, ainda que superados os limites orçamentários dispostos na LRF, referentes a gastos com pessoal. Isso porque a progressão é direito subjetivo do servidor público, que decorre de determinação legal.

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Contexto e controvérsia

O servidor público pode crescer dentro da carreira pública por meio da progressão funcional, que ocorre quando passa para o grau imediatamente superior dentro da mesma classe ou categoria que ocupa.

No caso concreto, um policial civil do Tocantins impetrou mandado de segurança sob o argumento de que deveria ser reenquadrado na carreira, uma vez que tinha preenchido os requisitos legais para a progressão funcional.

O secretário estadual de Administração alegou que a progressão geraria aumento da despesa permanente com pessoal sem a correspondente dotação orçamentária, causando o estouro do limite previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o que levou à impetração do MS pelo servidor.

É possível conceder a progressão funcional ainda que superados os limites orçamentários previstos na LRF?

Julgamento

Segundo o STJ, é ilegal deixar de conceder a progressão funcional de servidor público quando atendidos todos os requisitos legais, ainda que superados os limites orçamentários dispostos na LRF, referentes a gastos com pessoal. Isso porque a progressão é direito subjetivo do servidor público, que decorre de determinação legal. Trata-se de uma exceção prevista no inciso I do parágrafo único do art. 22 da LC 101/2000:

Subseção II

Do Controle da Despesa Total com Pessoal

Art. 22. A verificação do cumprimento dos limites estabelecidos nos arts. 19 e 20 será realizada ao final de cada quadrimestre.

Parágrafo único. Se a despesa total com pessoal exceder a 95% (noventa e cinco por cento) do limite, são vedados ao Poder ou órgão referido no art. 20 que houver incorrido no excesso:

I - concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, salvo os derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, ressalvada a revisão prevista no inciso X do art. 37 da Constituição;

Segundo esse dispositivo, é necessário que se verifique se a despesa de cada Poder ou órgão com pessoal se mantém inferior a 95% do seu limite. Ultrapassado tal limite, há um conjunto de proibições que deve ser observado exclusivamente pelo Poder ou pelo órgão que houver incorrido no excesso.

A lei em questão não proíbe a progressão funcional do servidor público que atender aos requisitos legais para sua concessão, caso ultrapassado o limite orçamentário previsto na LRF, referente a gastos com pessoal. Havendo comprovado excesso, se global ou específico, as condutas que são lícitas ao entes federativos estão expressamente dispostas na lei. Ou seja, existem comandos claros e taxativos sobre contenção de gasto com pessoal, sem menção à progressão funcional, que é direito subjetivo do servidor público quando plenamente cumpridos os requisitos legais. 

O aumento de vencimento na progressão funcional - vencimento em sentido amplo englobando todas as verbas remuneratórias - não pode ser confundido com concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, já que esse aumento é inerente à movimentação do servidor na carreira e não inova o ordenamento jurídico em razão de ter sido instituído em lei prévia, sendo direcionado apenas aos grupos de servidores públicos que possuem os requisitos para a progressão.

Já conceder vantagem, aumento, reajuste ou adequar a remuneração a qualquer título envolve aumento real dos vencimentos em sentido amplo, de forma irrestrita à categoria dos servidores públicos, sem distinção, e deriva de lei específica para tal fim. Assim, a proibição do art. 22, I, da LC 101/2002 é voltada a essa hipótese legal.

A própria LRF, ao proibir a concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título por parte dos órgãos que tenham incorrido em excesso de despesa com pessoal, ressalva os direitos derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, exceção em que se inclui a progressão funcional.

O ato administrativo do órgão superior da categoria que concede a progressão funcional é simples, e por isso não depende de homologação ou da manifestação de vontade de outro órgão. Além disso, o ato produz seus efeitos imediatamente, sem necessidade de ratificação ou chancela por parte da Secretaria de Administração. É um ato vinculado, sem qualquer discricionariedade da Administração Pública para sua concessão.

Condicionar a progressão funcional a situações alheias aos critérios previstos em lei pode, de maneira indireta, transformar seu direito subjetivo em ato discricionário da Administração, violando os princípios da legalidade, da impessoalidade e da moralidade.

A jurisprudência do STJ entende que os limites de despesa com pessoal previstos na LRF não podem servir de justificativa para o não cumprimento de direitos subjetivo do servidor público, como é o caso, que trata sobre o recebimento de vantagens asseguradas por lei.

A CF (art. 169, §3º) traz, em ordem de relevância, as medidas a serem tomadas pelo administrador caso o orçamento público ultrapasse os limites da LRF. São elas:

  • a redução de cargos em comissão e funções de confiança;
  • a exoneração de servidores não estáveis; e
  • a exoneração de servidores estáveis

Assim, não é razoável a suspensão de benefícios de servidores públicos estáveis sem que haja a prévia adoção de medidas de contenção de despesas.

Por fim, o Poder Público também não pode alegar crise financeira e o descumprimento dos limites globais e/ou específicos referentes às despesas com servidores públicos nos termos dos arts. 19 e 20 da LC 101/2000 de forma genérica, somente para legitimar o não cumprimento de leis e suprimir direitos subjetivos de servidores públicos.

Em resumo, é ilegal deixar de conceder a progressão funcional de servidor público quando atendidos todos os requisitos legais, ainda que superados os limites orçamentários dispostos na LRF, referentes a gastos com pessoal. Isso porque a progressão é direito subjetivo do servidor público, que decorre de determinação legal.

Tese Jurídica Oficial

É ilegal o ato de não concessão de progressão funcional de servidor público, quando atendidos todos os requisitos legais, a despeito de superados os limites orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, referentes a gastos com pessoal de ente público, tendo em vista que a progressão é direito subjetivo do servidor público, decorrente de determinação legal, estando compreendida na exceção prevista no inciso I do parágrafo único do art. 22 da Lei Complementar n. 101/2000.

Resumo Oficial

A Lei Complementar n. 101/2000 determina que seja verificado se a despesa de cada Poder ou órgão com pessoal - limite específico - se mantém inferior a 95% do seu limite; isso porque, em caso de excesso, há um conjunto de vedações que deve ser observado exclusivamente pelo Poder ou pelo órgão que houver incorrido no excesso, como visto no art. 22 da LC n. 101/2000.

O mesmo diploma legal não prevê vedação à progressão funcional do servidor público que atender aos requisitos legais para sua concessão, em caso de superação dos limites orçamentários previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, referentes a gastos com pessoal de ente público. Nos casos em que há comprovado excesso, se global ou específico, as condutas que são lícitas aos entes federativos estão expressamente delineadas. Ou seja, há comandos normativos claros e específicos de mecanismos de contenção de gasto com pessoal, os quais são taxativos, não havendo previsão legal de vedação à progressão funcional, que é direito subjetivo do servidor público quando os requisitos legais forem atendidos em sua plenitude.

O aumento de vencimento em questão não pode ser confundido com concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, uma vez que o incremento no vencimento decorrente da progressão funcional horizontal ou vertical - aqui dito vencimento em sentido amplo englobando todas as rubricas remuneratórias - é inerente à movimentação do servidor na carreira e não inova o ordenamento jurídico em razão de ter sido instituído em lei prévia, sendo direcionado apenas aos grupos de servidores públicos que possuem os requisitos para sua materialização e incorporação ao seu patrimônio jurídico quando presentes condições específicas definidas em lei.

Já conceder vantagem, aumento, reajuste ou adequar a remuneração a qualquer título engloba aumento real dos vencimentos em sentido amplo, de forma irrestrita à categoria de servidores públicos, sem distinção, e deriva de lei específica para tal fim. Portanto, a vedação presente no art. 22, inciso I, da LC n. 101/2002 se dirige a essa hipótese legal.

A própria Lei de Responsabilidade Fiscal, ao vedar, no art. 21, parágrafo único, inciso I, àqueles órgãos que tenham incorrido em excesso de despesas com pessoal, a concessão de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a qualquer título, ressalva, de logo, os direitos derivados de sentença judicial ou de determinação legal ou contratual, exceção em que se inclui a progressão funcional.

O ato administrativo do órgão superior da categoria que concede a progressão funcional é simples, e por isso não depende de homologação ou da manifestação de vontade de outro órgão. Ademais, o ato produzirá seus efeitos imediatamente, sem necessidade de ratificação ou chancela por parte da Secretaria de Administração. Trata-se, também, de ato vinculado sobre o qual não há nenhuma discricionariedade da Administração Pública para sua concessão quando presentes todos os elementos legais da progressão.

Condicionar a progressão funcional do servidor público a situações alheias aos critérios previstos por lei poderá, por via transversa, transformar seu direito subjetivo em ato discricionário da Administração, ocasionando violação aos princípios caros à Administração Pública, como os da legalidade, da impessoalidade e da moralidade.

A jurisprudência desta Corte Superior firmou-se no sentido de que os limites previstos nas normas da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), no que tange às despesas com pessoal do ente público, não podem servir de justificativa para o não cumprimento de direitos subjetivos do servidor público, como é o recebimento de vantagens asseguradas por lei.

A Carta Magna de 1988 enumerou, em ordem de relevância, as providências a serem adotadas pelo administrador na hipótese de o orçamento do órgão público ultrapassar os limites estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal, quais sejam, a redução de cargos em comissão e funções de confiança, a exoneração de servidores não estáveis e a exoneração de servidores estáveis (art. 169, § 3º, da CF/1988). Não se mostra razoável a suspensão de benefícios de servidores públicos estáveis sem a prévia adoção de medidas de contenção de despesas, como a diminuição de funcionários comissionados ou de funções comissionadas pela Administração.

Não pode, outrossim, o Poder Público alegar crise financeira e o descumprimento dos limites globais e/ou específicos referentes às despesas com servidores públicos nos termos dos arts. 19 e 20 da LC n. 101/2000 de forma genérica, apenas para legitimar o não cumprimento de leis existentes, válidas e eficazes, e suprimir direitos subjetivos de servidores públicos.

Assim, diante da expressa previsão legal acerca da progressão funcional e comprovado de plano o cumprimento dos requisitos para sua obtenção, está demonstrado o direito líquido e certo do servidor público, devendo ser a ele garantida a progressão funcional horizontal e vertical, a despeito de o ente federativo ter superado o limite orçamentário referente a gasto com pessoal, previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal, tendo em vista não haver previsão expressa de vedação de progressão funcional na LC n. 101/2000.

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