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STJ - Corte Especial

REsp 1.610.844-BA

Recurso Especial

Relator: Luis Felipe Salomão

Julgamento: 15/06/2022

Publicação: 20/06/2022

STJ - Corte Especial

REsp 1.610.844-BA

Tese Jurídica Simplificada

  • Na conta bancária conjunta solidária, presume-se, em regra, a repartição dos valores em partes iguais entre os correntistas quando não houver prova em sentido contrário. Se um dos correntistas for titular de patrimônio maior do que a quantia presumida, deverá comprovar esse fato.
  • A penhora de saldo existente em conta conjunta solidária deverá abranger somente a quantia pertencente ao devedor executado, devendo ser preservada a cota-parte dos outros titulares.

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Contexto

Observe o seguinte caso hipotético:

João, Maria e Helena são titulares de uma conta corrente conjunta no banco W. João, por sua vez, acumulou dívidas com a empresa Y, ensejando o início de um processo de execução contra ele. Na demanda, foi determinada a penhora de todo o saldo presente na conta bancária conjunta de que João fazia parte. 

Nesse contexto, surge a seguinte controvérsia: é possível a penhora integral de valores depositados em conta bancária conjunta na hipótese de apenas um dos titulares ser alvo de processo executivo?

Simplificando: a penhora determinada contra um devedor pode alcançar todo o saldo da conta bancária conjunta mantida por ele?

Julgamento

Existe divergência entre as Turmas da Primeira Seção e da Segunda Seção do STJ sobre o tema que envolve, basicamente, a interpretação do art. 265 do CC, segundo o qual "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes".

Primeira Seção Segunda Seção
Ainda que só um dos titulares da conta conjunta seja responsável pela dívida executada, a penhora deve atingir a integralidade do saldo depositado se não houver prova da titularidade exclusiva ou parcial dos valores, pois presume-se que os outros correntistas pactuaram a falta de exclusividade da disponibilidade desses valores. No caso de execução movida por pessoa (física ou jurídica) distinta do banco que mantém a conta bancária coletiva, os cotitulares podem comprovar os valores que integram o patrimônio de cada um. Não havendo provas nesse sentido, presume-se a divisão do saldo em partes iguais, razão pela qual a penhora não poderá atingir todo o saldo da conta, mas apenas a cota-parte do correntista executado.

Em regra, somente os bens que integram o patrimônio do devedor estão sujeitas à constrição para pagamento da dívida. 

Tratando-se de conta conjunta solidária, como é o caso, há solidariedade ativa e passiva na relação jurídica estabelecida entre os cotitulares e o banco que mantém a conta, o que decorre diretamente das obrigações previstas na contrato de conta-corrente, conforme dispõe o referido art. 265 do CC.

Por outro lado, se não houver disposição legal ou contratual atribuindo a responsabilidade solidária pelo pagamento da dívida executada, a obrigação assumida por um dos correntistas perante terceiros não poderá repercutir na esfera patrimonial dos outros titulares da conta.

Nesse sentido, existem julgados do STJ no sentido de que os cotitulares da conta conjunta solidária não são devedores solidários nem sequer perante terceiros portadores de cheques sem fundo emitidos somente por um dos correntistas.

Assim, de acordo com a jurisprudência da Corte (REsp 819.327-SP) o saldo mantido nesse tipo de conta caracteriza bem divisível, atraindo as regras referentes ao condomínio. Por esse motivo, se presume a repartição dos valores em partes iguais entre os correntistas quando não houver prova em sentido contrário, segundo dispõe o art. 1.315 do CC:

Art. 1.315. O condômino é obrigado, na proporção de sua parte, a concorrer para as despesas de conservação ou divisão da coisa, e a suportar os ônus a que estiver sujeita.

Parágrafo único. Presumem-se iguais as partes ideais dos condôminos.

Consequentemente, com base no princípio da responsabilidade patrimonial do devedor (arts. 789 e 790, CPC), a penhora eletrônica de saldo existente em conta conjunta solidária deverá abranger somente a quantia pertencente ao devedor executado, devendo ser preservada a cota-parte dos outros titulares.

Por força da presunção da divisão igualitária do saldo constante da conta coletiva solidária, se um dos correntistas for titular de patrimônio maior do que a quantia presumida, deverá comprovar esse fato. No nosso exemplo, se a conta conjunta tiver saldo de R$ 30 mil, presume-se que cada um dos correntistas é titular de R$ 10 mil, mas se Helena aportou a quantia de R$ 15 mil, deverá comprovar que o fez. 

Desse modo, quando há prova de titularidade exclusiva dos valores depositados por um correntista não devedor, é impositiva a desconstituição da penhora.

Em resumo:

  • Na conta bancária conjunta solidária, presume-se, em regra, a repartição dos valores em partes iguais entre os correntistas quando não houver prova em sentido contrário. Se um dos correntistas for titular de patrimônio maior do que a quantia presumida, deverá comprovar esse fato.
  • A penhora de saldo existente em conta conjunta solidária deverá abranger somente a quantia pertencente ao devedor executado, devendo ser preservada a cota-parte dos outros titulares.

Tese Jurídica Oficial

Primeira Tese

É presumido, em regra, o rateio em partes iguais do numerário mantido em conta corrente conjunta solidária quando inexistente previsão legal ou contratual de responsabilidade solidária dos correntistas pelo pagamento de dívida imputada a um deles.

Segunda Tese

Não será possível a penhora da integralidade do saldo existente em conta conjunta solidária no âmbito de execução movida por pessoa (física ou jurídica) distinta da instituição financeira mantenedora, sendo franqueada aos cotitulares e ao exequente a oportunidade de demonstrar os valores que integram o patrimônio de cada um, a fim de afastar a presunção relativa de rateio.

Resumo Oficial

A controvérsia está em definir a possibilidade ou não de penhora integral de valores depositados em conta bancária conjunta, na hipótese de apenas um dos titulares ser sujeito passivo de processo executivo movido por pessoa - física ou jurídica - distinta da instituição financeira mantenedora da conta corrente.

Há divergência atual entre julgados das Turmas de Direito Privado e de Direito Público sobre o tema que envolve, basicamente, a interpretação da norma inserta no artigo 265 do Código Civil, segundo o qual "a solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes".

Com efeito, os precedentes das Turmas da Primeira Seção assentam que, ainda que só um dos titulares da conta conjunta seja responsável pela dívida executada, a penhora deve atingir a integralidade do saldo depositado se não houver prova da titularidade exclusiva ou parcial dos valores, ante a presunção de que os co-correntistas pactuaram a ausência de exclusividade da disponibilidade do numerário.

Por sua vez, os acórdãos das Turmas da Segunda Seção adotam a exegese de que, em se tratando de execução movida por pessoa (física ou jurídica) distinta da instituição financeira mantenedora da conta bancária coletiva, deve ser franqueada aos cotitulares a comprovação dos valores que integram o patrimônio de cada um, sendo certo que, na ausência de provas nesse sentido, presume-se a divisão do saldo em partes iguais, razão pela qual a penhora não poderá atingir a integralidade do numerário, mas apenas a cota-parte do correntista executado.

O exercício do aludido poder-dever do juiz - no âmbito da execução forçada direta - encontra limite político no princípio da responsabilidade patrimonial, enunciado nos arts. 591 e 592 do CPC/1973 (reproduzidos nos arts. 789 e 790 de CPC/2015), que versam sobre a sujeição dos bens do "devedor obrigado" (responsabilidade primária) e do "terceiro não obrigado" (responsabilidade secundária) à demanda executória.

Depreende-se que, em regra, somente os bens integrantes do patrimônio do devedor - a um só tempo obrigado e responsável - estão sujeitos à excussão destinada a obter soma em dinheiro apta ao adimplemento da prestação (pecuniária ou de dar coisa) encartada em título judicial ou extrajudicial.

A conta-corrente configura instrumento contratual que viabiliza outras operações bancárias, a exemplo do depósito, do empréstimo e da abertura de crédito. Tal contrato bancário alberga duas espécies: (i) a conta-corrente individual ou unipessoal, que possui um único titular, detentor do poder de movimentá-la, o qual pode ser outorgado a procurador devidamente constituído; e (ii) a conta-corrente conjunta ou coletiva, na qual há mais de um titular com poder de movimentação da conta.

Em se tratando de "conta conjunta solidária", sobressai a solidariedade ativa e passiva na relação jurídica estabelecida entre os cotitulares e a instituição financeira mantenedora, o que decorre diretamente das obrigações encartadas no contrato de conta-corrente, em consonância com a regra estabelecida no art. 265 do CC/2002.

Por outro lado, a obrigação pecuniária assumida por um dos correntistas perante terceiros não poderá repercutir na esfera patrimonial do cotitular da "conta conjunta solidária", caso inexistente disposição legal ou contratual atribuindo responsabilidade solidária pelo pagamento da dívida executada.

Nessa perspectiva, há julgados desta Corte que, com base na Lei n. 7.357/1985, entendem que os cotitulares da aludida espécie de conta conjunta não ostentam a condição de devedores solidários nem sequer perante terceiros portadores de cheques emitidos, sem provisão de fundos, somente por um dos correntistas.

Nessa ordem de ideias, infere-se que o saldo mantido na chamada "conta conjunta solidária" caracteriza bem divisível, cuja cotitularidade, nos termos de precedentes desta Corte, atrai as regras atinentes ao condomínio, motivo pelo qual se presume a repartição do numerário em partes iguais entre os correntistas quando não houver elemento probatório a indicar o contrário, consoante disposto no parágrafo único do art. 1.315 do CC/2022 (REsp n. 819.327/SP, relator Ministro Humberto Gomes de Barros, Terceira Turma, DJ de 08/05/2006).

Consequentemente, à luz do princípio da responsabilidade patrimonial do devedor - enunciado nos arts. 591 e 592 do CPC/1973 (reproduzidos nos arts. 789 e 790 do CPC/2015) -, a penhora eletrônica de saldo existente em "conta conjunta solidária" não poderá abranger proporção maior que o numerário pertencente ao devedor executado, devendo ser preservada a cota-parte dos demais correntistas.

Sob tal ótica, por força da presunção do rateio igualitário do saldo constante da "conta coletiva solidária", caberá ao "cotitular não devedor" comprovar que o montante que integra o seu patrimônio exclusivo ultrapassa o quantum presumido. De outro lado, poderá o exequente demonstrar que o devedor executado é quem detém a propriedade exclusiva - ou em maior proporção - dos valores depositados na conta conjunta.

Desse modo, quando existente prova de titularidade exclusiva dos valores depositados por aquele que não figura no polo passivo da execução de obrigação pecuniária não solidária, afigurar-se-á impositiva a desconstituição da penhora.

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