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STJ - Terceira Seção

CC 193.005-MG

Conflito de Competência

Relator: Laurita Vaz

Julgamento: 08/02/2023

Publicação: 15/02/2023

STJ - Terceira Seção

CC 193.005-MG

Tese Jurídica

Havendo sentença prolatada quanto ao delito conexo, a competência para julgamento do delito remanescente deve ser aferida isoladamente.

Nossos Comentários

Conexão e Continência

CONEXÃO é um vínculo entre duas ou mais infrações penais, que se relacionam de alguma maneira específica.

Art. 76.  A competência será determinada pela conexão:
I - se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras;
II - se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas;
III - quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração.

A conexão pode ser classificada conforme as suas diversas hipóteses elencadas no dispositivo: intersubjetiva, objetiva e instrumental. 

Conexão Intersubjetiva: envolve obrigatoriamente várias pessoas e vários delitos (a continência por cumulação subjetiva envolve várias pessoas, mas apenas um único crime). 

  1. Conexão Intersubjetiva por Simultaneidade: se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas. Por exemplo, torcedores que cometem crime de dano no estádio, assim como quando cai caminhão de bebida alcoólica na estrada e várias pessoas realizam o saque.
  2. Conexão Intersubjetiva por Concurso: ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar. É hipótese de concurso de agentes em que há a prática de duas ou mais infrações. Por exemplo, associação criminosa (art. 288) responsável por vários delitos de roubo.
  3. Conexão Intersubjetiva por Reciprocidade: por várias pessoas, umas contra as outras. É comum que se aponte a rixa como exemplo, mas ela é errada, porque é necessário que haja duas ou mais infrações. O principal exemplo, na verdade, está nas diversas lesões corporais em briga de torcida.

Conexão Objetiva, Lógica, Material ou Teleológica: se, no mesmo caso, houverem sido umas praticadas para facilitar ou ocultar as outras, ou para conseguir impunidade ou vantagem em relação a qualquer delas. Por exemplo, o crime de lavagem de capitais e a infração penal antecedente.

Conexão Probatória ou Instrumental: quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração. Por exemplo, roubo e receptação.

CONTINÊNCIA

Enquanto a conexão importa em mais de uma infração penal, a continência, em seu inciso I, ocorre quando duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração, ou seja, há um único crime e mais de uma pessoa (concurso de pessoas).

REGRAS

1) Até quando é possível reunir os processos? 

Súmula 235, STJ: A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado.

Obs.: Entende-se por “julgado” a sentença, mesmo que recorrível (não transitada em julgado). Em outros termos, uma mera decisão, ainda que não transitada em julgado, não importará em reunião dos feitos.

2) A competência do Tribunal do Júri prevalece em relação às demais, ou seja, a reunião de processos por conexão ou continência se dará prioritariamente perante o Júri. Por exemplo, um crime de homicídio cometido em conexão com a ocultação de cadáver será de competência do Júri.

3) E no caso de competência por crime eleitoral? Prevalece na doutrina que o correto seria dividir os processos, separando entre as Justiças, mas é necessário se atentar ao entendimento do STF da enorme força atrativa da Justiça Eleitoral. Por exemplo, uma calúnia eleitoral seguida de um homicídio. Assim, crimes eleitorais e crimes militares, por não serem da jurisdição comum, não são atraídos ao Júri.

4) Se forem jurisdições de mesma categoria, é necessário seguir uma ordem predefinida no art. 78, II, CPP. São jurisdições sem qualquer hierarquia, por exemplo, o juiz criminal de Ribeirão Preto e o juiz criminal de Cravinhos. A preferência será para o local em que ocorreu:

  • O crime mais grave, ou seja, o crime com maior pena máxima.
  • Se os crimes possuem a mesma gravidade, prevalecerá o local em que ocorrer mais infrações.
  • Se nada disso for suficiente, a prevenção definirá a competência.

Se as jurisdições forem de categorias diversas, prevalece o de maior graduação. Por exemplo, o Tribunal irá prevalecer em relação ao juiz de primeiro grau. Por fim, a jurisdição especial prevalece em relação à comum. 

O Caso

Depois de toda essa explicação, vamos ao caso. 

O Ministério Público do Estado de Minas Gerais ofereceu denúncia pela prática dos crimes do art. 38, caput (destruir ou danificar floresta considerada de preservação permanente), e do art. 55, caput (executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem autorização da autoridade competente), da Lei de Crimes Ambientais (L. 9.605/1998), em concurso material. 

O Juízo Estadual recebeu a denúncia, mas declinou a competência para a Justiça Federal, em razão de os atos ilícitos imputados terem sido cometidos em território da União.

O Juízo Federal, após receber os autos, extinguiu a ação penal, com relação ao crime do art. 55, por reconhecer a litispendência em relação a uma ação penal que já tramitou naquele juízo, na qual, inclusive já houvera a prolação de sentença condenatória. Em relação ao delito do art. 38, afirmou que o ilícito não ocorreu em área pertencente ou protegida pela União. Por isso, suscitou o conflito para que houvesse retorno dos autos ao Juízo Estadual.

O STJ, quando julgou esse conflito, entendeu que como houve sentença prolatada com relação ao delito do 55, que é conexo ao do art. 38, a competência para julgamento do delito remanescente deve ser aferida isoladamente. Isto é: se o delito do art. 55 já foi julgado, cabe analisar a competência para julgamento do delito do art. 35, por si só. 

Resumo Oficial

No caso, o Ministério Público do Estado de Minas Gerais ofereceu denúncia pela prática dos crimes do art. 38, caput, e do art. 55, caput, da Lei n. 9.605/1998, em concurso material.

O Juízo Federal, após receber os autos em razão da declinação de competência do Juízo Estadual, extinguiu a ação penal, no tocante ao crime do art. 55, caput, da Lei n. 9.605/1998, referente à conduta de extração de areia e cascalho, por reconhecer a litispendência em relação a ação penal que tramitara naquele juízo, na qual, inclusive já houvera a prolação de sentença condenatória. Em relação ao delito do art. 38, caput, também da Lei n. 9.605/1998, afirmou que o ilícito não ocorreu em área pertencente ou protegida pela União, motivo pelo qual suscitou o conflito.

Sobre o tema, a Súmula n. 235 do Superior Tribunal de Justiça dispõe que "[a] conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado." Embora o enunciado tenha origem em feitos de natureza cível, é pacífico o entendimento de que a sua orientação também é aplicável aos processos penais.

Portanto, havendo sentença prolatada quanto ao delito conexo, a competência para julgamento do delito remanescente deve ser aferida isoladamente, ou seja, apenas em razão dos fatos que se amoldam ao art. 38, caput, da Lei n. 9.605/1998.

Para que haja competência da Justiça Federal, a prática do referido delito deve ter ocorrido em detrimento de bens, serviços ou interesse da União, nos termos do art. 109, inciso IV, da Constituição Federal.

O Rio das Mortes tem o seu curso integralmente no estado de Minas Gerais. Por essa razão, é de propriedade do referido estado, nos termos do art. 20, III, c/c o art. 26, I, da Constituição Federal.

Assim, o crime do art. 38, caput, da Lei n. 9.605/1998, praticado na área de preservação permanente, em suas margens, não atingiu o patrimônio, serviços ou interesse da União, cabendo à Justiça Estadual o seu julgamento.

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