Primeira Tese
Toda pessoa que sofra prisão em flagrante — qualquer que tenha sido a motivação ou a natureza do ato criminoso, mesmo que se trate de delito hediondo — deve ser obrigatoriamente conduzida, “sem demora”, à presença da autoridade judiciária competente, para que esta, ouvido o custodiado “sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão” e examinados os aspectos de legalidade formal e material do auto de prisão em flagrante, possa: (i) relaxar a prisão, se constatar a ilegalidade do flagrante, (ii) conceder liberdade provisória, se estiverem ausentes as situações referidas no art. 312 do Código de Processo Penal (CPP) ou se incidirem, na espécie, quaisquer das excludentes de ilicitude previstas no art. 23 do Código Penal (CP), ou, ainda, (iii) converter o flagrante em prisão preventiva, se presentes os requisitos dos arts. 312 e 313 (3) do CPP.
A audiência de custódia (ou de apresentação) constitui direito público subjetivo, de caráter fundamental, assegurado por convenções internacionais de direitos humanos a que o Estado brasileiro aderiu, já incorporadas ao direito positivo interno (Convenção Americana de Direitos Humanos e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos). Traduz prerrogativa não suprimível assegurada a qualquer pessoa. Sua imprescindibilidade tem o beneplácito do magistério jurisprudencial (ADPF 347 MC) e do ordenamento positivo doméstico [Lei 13.964/2019 e Resolução 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)].
A ausência da realização da audiência de custódia qualifica-se como causa geradora da ilegalidade da própria prisão em flagrante, com o consequente relaxamento da privação cautelar da liberdade. Ressalvada motivação idônea, o magistrado que deixar de promovê-la se sujeita à tríplice responsabilidade [CPP, art. 310, § 3º].
Segunda Tese
No contexto da audiência de custódia, é legítima a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva somente se e quando houver pedido expresso e inequívoco por parte do Ministério Público, da autoridade policial ou, se for o caso, do querelante ou do assistente do Parquet.
A reforma introduzida pela Lei 13.964/2019 (“Lei Anticrime”) modificou a disciplina referente às medidas de índole cautelar. Ao suprimir a expressão “de ofício” que constava do art. 282, §§ 2º e 4º, e do art. 311 do CPP, a lei vedou, de forma absoluta, a decretação da prisão preventiva sem prévio requerimento. Foi suprimida a possibilidade de o magistrado ordenar, sponte sua, a imposição de prisão preventiva.
Assim, não é possível a decretação ex officio de prisão preventiva em qualquer situação (em juízo ou no curso de investigação penal), inclusive no contexto de audiência de custódia. Tornou-se inviável a conversão de ofício, mesmo na hipótese a que se refere o art. 310, II, do CPP.
Independentemente da gravidade em abstrato do crime, não se presume a configuração dos pressupostos e dos fundamentos referidos no art. 312 do CPP, que hão de ser adequada e motivadamente comprovados em cada situação ocorrente. Mostra-se inconcebível que se infira do auto de prisão em flagrante, ato de natureza meramente descritiva, a existência de representação tácita ou implícita da autoridade policial a fim de convertê-la em prisão preventiva.
Em matéria processual penal, inexiste, em nosso ordenamento jurídico, o poder geral de cautela dos juízes, notadamente em tema de privação e/ou restrição da liberdade das pessoas. Consequentemente, é vedada a adoção de provimento cautelares inominados ou atípicos — em detrimento de investigado, acusado ou réu —, em face dos postulados constitucionais de tipicidade processual e da legalidade estrita.
Trata-se, na espécie, de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça que indeferiu o pedido cautelar lá formulado em sede de ação constitucional de mesma natureza. No caso, magistrado de primeira instância afirmou não vislumbrar como realizar audiência de custódia dos pacientes, haja vista a situação de pandemia do novo coronavírus (Covid-19). Além disso, registrou que a audiência seria realizada em momento oportuno e converteu de ofício as prisões em flagrante em preventivas.
A Segunda Turma não conheceu da impetração, mas concedeu, de ofício, a ordem de habeas corpus para invalidar, por ilegal, a conversão ex officio das prisões em flagrante dos ora pacientes em prisões preventivas, confirmando, em consequência, o provimento cautelar anteriormente deferido.
Primeira Tese
Toda pessoa que sofra prisão em flagrante — qualquer que tenha sido a motivação ou a natureza do ato criminoso, mesmo que se trate de delito hediondo — deve ser obrigatoriamente conduzida, “sem demora”, à presença da autoridade judiciária competente, para que esta, ouvido o custodiado “sobre as circunstâncias em que se realizou sua prisão” e examinados os aspectos de legalidade formal e material do auto de prisão em flagrante, possa: (i) relaxar a prisão, se constatar a ilegalidade do flagrante, (ii) conceder liberdade provisória, se estiverem ausentes as situações referidas no art. 312 do Código de Processo Penal (CPP) ou se incidirem, na espécie, quaisquer das excludentes de ilicitude previstas no art. 23 do Código Penal (CP), ou, ainda, (iii) converter o flagrante em prisão preventiva, se presentes os requisitos dos arts. 312 e 313 (3) do CPP.
A audiência de custódia (ou de apresentação) constitui direito público subjetivo, de caráter fundamental, assegurado por convenções internacionais de direitos humanos a que o Estado brasileiro aderiu, já incorporadas ao direito positivo interno (Convenção Americana de Direitos Humanos e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos). Traduz prerrogativa não suprimível assegurada a qualquer pessoa. Sua imprescindibilidade tem o beneplácito do magistério jurisprudencial (ADPF 347 MC) e do ordenamento positivo doméstico [Lei 13.964/2019 e Resolução 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)].
A ausência da realização da audiência de custódia qualifica-se como causa geradora da ilegalidade da própria prisão em flagrante, com o consequente relaxamento da privação cautelar da liberdade. Ressalvada motivação idônea, o magistrado que deixar de promovê-la se sujeita à tríplice responsabilidade [CPP, art. 310, § 3º].
Segunda Tese
No contexto da audiência de custódia, é legítima a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva somente se e quando houver pedido expresso e inequívoco por parte do Ministério Público, da autoridade policial ou, se for o caso, do querelante ou do assistente do Parquet.
A reforma introduzida pela Lei 13.964/2019 (“Lei Anticrime”) modificou a disciplina referente às medidas de índole cautelar. Ao suprimir a expressão “de ofício” que constava do art. 282, §§ 2º e 4º, e do art. 311 do CPP, a lei vedou, de forma absoluta, a decretação da prisão preventiva sem prévio requerimento. Foi suprimida a possibilidade de o magistrado ordenar, sponte sua, a imposição de prisão preventiva.
Assim, não é possível a decretação ex officio de prisão preventiva em qualquer situação (em juízo ou no curso de investigação penal), inclusive no contexto de audiência de custódia. Tornou-se inviável a conversão de ofício, mesmo na hipótese a que se refere o art. 310, II, do CPP.
Independentemente da gravidade em abstrato do crime, não se presume a configuração dos pressupostos e dos fundamentos referidos no art. 312 do CPP, que hão de ser adequada e motivadamente comprovados em cada situação ocorrente. Mostra-se inconcebível que se infira do auto de prisão em flagrante, ato de natureza meramente descritiva, a existência de representação tácita ou implícita da autoridade policial a fim de convertê-la em prisão preventiva.
Em matéria processual penal, inexiste, em nosso ordenamento jurídico, o poder geral de cautela dos juízes, notadamente em tema de privação e/ou restrição da liberdade das pessoas. Consequentemente, é vedada a adoção de provimento cautelares inominados ou atípicos — em detrimento de investigado, acusado ou réu —, em face dos postulados constitucionais de tipicidade processual e da legalidade estrita.
Trata-se, na espécie, de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de ministro do Superior Tribunal de Justiça que indeferiu o pedido cautelar lá formulado em sede de ação constitucional de mesma natureza. No caso, magistrado de primeira instância afirmou não vislumbrar como realizar audiência de custódia dos pacientes, haja vista a situação de pandemia do novo coronavírus (Covid-19). Além disso, registrou que a audiência seria realizada em momento oportuno e converteu de ofício as prisões em flagrante em preventivas.
A Segunda Turma não conheceu da impetração, mas concedeu, de ofício, a ordem de habeas corpus para invalidar, por ilegal, a conversão ex officio das prisões em flagrante dos ora pacientes em prisões preventivas, confirmando, em consequência, o provimento cautelar anteriormente deferido.