AgRg no HC 766.654-SP

STJ Quinta Turma

Agravo Regimental no Habeas Corpus

Relator: Reynaldo Soares da Fonseca

Julgamento: 13/09/2022

Publicação: 19/09/2022

Tese Jurídica

Havendo controvérsia entre as declarações dos policiais e do flagranteado, e inexistindo a comprovação de que a autorização do morador foi livre e sem vício de consentimento, impõe-se o reconhecimento da ilegalidade da busca domiciliar.

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Nossos Comentários

Busca e apreensão

A busca e apreensão é um procedimento que visa à garantia das provas no processo penal. É comum que o agente, quando se depara com as investigações, tente se livrar de provas que levem à materialidade do fato ou a sua autoria. Dessa forma, a Lei prescreveu um procedimento que permite o acautelamento dessas provas, mediante a possibilidade de "revistar" o domicílio e também a pessoa do suspeito ou investigado.  

A busca e apreensão é um gênero que comporta duas espécies:

  1. Busca pessoal: É a busca realizada diretamente na pessoa e em seus pertences. A busca realizada no veículo é equiparada à busca pessoal.    
  2. Busca domiciliar: É a busca realizada no domicílio da pessoa. Em regra, necessita de mandado judicial para sua autorização, em decorrência do que preceitua a CF, o art. 5º, XI, sobre a inviolabildiade do domicílio.

Art. 5º (...)

XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial;

Portanto, é possível entrar na casa de outra pessoa sem o seu consentimento nas seguintes situações:

Durante o dia Durante a noite
  • Em caso de flagrante delito ou desastre;
  • Para prestar socorro;
  • Por determinação judicial
  • Em caso de flagrante delito ou desastre;
  • Para prestar socorro

Denúncia anônima poderá fundamentar a busca? Depende. A denúncia anônima, por si só, não é capaz de fundamentar a busca, pois não tem o condão de fundamentar a suspeita do estado flagrancial. A suspeita que fundamenta a busca é aquela fundada em provas, ou ao menos indícios suficientes da atividade criminosa.  

No caso que analisamos, a fundada suspeita foi motivada por uma prova testemunhal do próprio policial que realizou o flagrante. Além disso, essa prova entrou em dissonância com o que a parte alegou, de que o ingresso não teve seu consentimento. O STJ entendeu que, nesses casos, havendo controvérsia entre as declarações dos policiais e do flagranteado, e inexistindo a comprovação de que a autorização do morador foi livre e sem vício de consentimento, impõe-se o reconhecimento da ilegalidade da busca domiciliar.


O ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões que sinalizem a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio.

Deve-se frisar, ainda, que "a mera denúncia anônima, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime, não legitima o ingresso de policiais no domicílio indicado, estando, ausente, assim, nessas situações, justa causa para a medida" (HC 512.418/RJ, Relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 3/12/2019).

Relevante ponderar, também, que a Sexta Turma deste Tribunal, nos autos do HC 598.051/SP, da Relatoria do Ministro Rogerio Schietti Cruz, julgado em 2/3/2021, proclamou nova e criteriosa abordagem sobre o controle do alegado consentimento do morador para o ingresso em seu domicílio por agentes estatais.

No caso, a abordagem do acusado se deu em virtude de denúncia anônima, sem que nada de ilícito fosse encontrado em sua posse, e, na sequência, ingressou-se em sua residência, com autorização da sua esposa. Contudo, além da ausência de justa causa para a busca pessoal e para o ingresso no domicílio, o consentimento de sua esposa não foi prestado livremente, circunstâncias que tornam ilícito o ingresso no domicílio, bem como as provas obtidas com a diligência.

Com efeito, "não se admite que a autoridade policial, apenas com base em delação anônima, sem a produção de elementos capazes de evidenciar fundadas suspeitas da prática delitiva, viole o direito constitucional à inviolabilidade do domicílio, conduzindo à ilicitude da prova colhida, bem como dela derivadas, nos termos do art. 157 do Código de Processo Penal (RHC 105.138/MS, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe 10/4/2019)" (AgRg no HC 698.199/RS, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 20/6/2022).

Ademais, "havendo controvérsia entre as declarações dos policiais e do flagranteado e inexistindo a comprovação de que a autorização do morador foi livre e sem vício de consentimento, impõe-se o reconhecimento da ilegalidade da busca domiciliar e consequentemente de toda a prova dela decorrente (fruits of the poisonous tree)" (AgRg no HC 703.991/RS, Relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 16/5/2022).

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