STF - Plenário
ADI 7.042-DF
Ação Direta de Inconstitucionalidade
Relator: Alexandre de Moraes
Julgamento: 31/08/2022
Publicação: 13/09/2022
STF - Plenário
ADI 7.042-DF
Tese Jurídica
Os entes públicos que sofreram prejuízos em razão de atos de improbidade também estão autorizados, de forma concorrente com o Ministério Público (MP), a propor ação e a celebrar acordos de não persecução civil em relação a esses atos.
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Resumo Oficial
A CF/1988 prevê, de modo expresso, a privatividade da legitimidade do MP apenas para a propositura da ação penal pública, eis que afasta tal característica com relação às ações de natureza cível, não impedindo, para as mesmas hipóteses elencadas, a legitimação de terceiros.
Além disso, nas ações de improbidade administrativa, a atuação do MP é extraordinária na defesa do patrimônio público em sentido amplo. Já a atuação da pessoa jurídica lesada ─ que foi quem sofreu os efeitos gravosos dos atos ímprobos ─ é ordinária, pois objetiva a proteção, em seu próprio nome, daquilo que lhe é inerente: seu patrimônio.
A Constituição consagrou, como vetores básicos da Administração Pública, o respeito à legalidade, impessoalidade e moralidade (CF/1988, art. 37, caput), além do combate à corrupção e à improbidade administrativa. Dessa forma, a supressão da prerrogativa das pessoas jurídicas lesadas fere a lógica constitucional de proteção ao patrimônio público, e representa grave limitação ao amplo acesso à jurisdição.
No tocante ao polo passivo, não deve existir obrigatoriedade de defesa judicial do agente público que cometeu ato de improbidade por parte da Advocacia Pública, pois a sua predestinação constitucional, enquanto função essencial à Justiça, identifica-se com a representação judicial e extrajudicial dos entes públicos. Contudo, permite-se essa atuação em caráter extraordinário e desde que norma local assim disponha.
Com base nesses entendimentos, o Plenário, por maioria, em julgamento conjunto, julgou parcialmente procedentes as ações para
(a) declarar a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do caput e dos §§ 6º-A e 10-C do art. 17, assim como do caput e dos §§ 5º e 7º do art. 17-B, ambos da Lei 8.429/1992, na redação dada pela Lei 14.230/2021, de modo a restabelecer a existência de legitimidade ativa concorrente e disjuntiva entre o Ministério Público e as pessoas jurídicas interessadas para a propositura da ação por ato de improbidade administrativa e para a celebração de acordos de não persecução civil;
(b) declarar a inconstitucionalidade parcial, com redução de texto, do § 20 do art. 17 da Lei 8.429/1992, incluído pela Lei 14.230/2021, no sentido de que não existe “obrigatoriedade de defesa judicial”; havendo, porém, a possibilidade dos órgãos da Advocacia Pública autorizarem a realização dessa representação judicial, por parte da assessoria jurídica que emitiu o parecer atestando a legalidade prévia dos atos administrativos praticados pelo administrador público, nos termos autorizados por lei específica; e
(c) declarar a inconstitucionalidade do art. 3º da Lei 14.230/2021. Por via de consequência, o Tribunal também declarou a constitucionalidade
1. do § 14 do art. 17 da Lei 8.429/1992, incluído pela Lei 14.230/2021; e
2. do art. 4º, X, da Lei 14.230/2021.
Vencidos, parcialmente, os ministros Nunes Marques, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, nos termos de seus votos.
Nova Lei de Improbidade Administrativa
Recentemente, a Lei de Improbidade Administrativa (LIA) foi alvo de intensas alterações legislativas promovidas pela Lei 14.230/2021. A Lei 8.429/92, acrescida pelas alterações da referida lei de 2021, passou a ser conhecida como a "Nova Lei de Improbidade Administrativa".
Vejamos algumas mudanças principais.
1. FIM DA MODALIDADE CULPOSA
Com a mudança da lei, foram extintas as modalidades culposas de Improbidade Administrativa.
Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.
Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.
Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei.
Parágrafo único. (Revogado).
§ 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais.
(...)
2. EXCLUSÃO DO TERCEIRO QUE SE BENEFICIE DA PRÁTICA DE IMPROBIDADE
Como a conduta deve ser dolosa, o terceiro que não concorre para a prática, mas somente se beneficia, está excluído da incidência da LIA.
Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.
3. SANÇÕES
As sanções também foram alteradas. Como sabemos, a LIA prevê três tipos de ilícitos ensejadores de Improbidade:
- Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio
- Ressarcimento integral do dano, quando houver
- Perda da função pública
- Suspensão dos direitos políticos de 8 a 10 anos;
- Multa civil de até 3x o valor do acréscimo patrimonial
- Proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de 10 anos.
- Ressarcimento integral do dano
- Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio (se tiver)
- Perda da função pública
- Suspensão dos direitos políticos de 5 a 8 anos;
- Multa civil de até 2 vezes o valor do dano
- Proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios pelo prazo de 5 anos;
- Ressarcimento integral do dano, se houver;
- Perda da função pública
- Suspensão dos direitos políticos de 3 a 5 anos
- Multa civil de até 100 vezes o valor da remuneração percebida pelo agente
- Proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios pelo prazo de 3 anos.
- Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente;
- Perda da função pública;
- Suspensão dos direitos políticos até 14 anos;
- Multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial;
- Proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios por até 14 anos.
- Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente (se tiver)
- Perda da função pública;
- Suspensão dos direitos políticos até 12 anos;
- Multa civil equivalente ao valor do dano;
- Proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios por até 12 anos;
- Multa civil de até 24 vezes o valor da remuneração percebida pelo agente;
- Proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios por até 4 anos.
4. PRESCRIÇÃO
Outra importante mudança da LIA foi a referente à prescrição. Vejamos o comparativo entre os dois diplomas.
Perceba que a LIA atual está bem mais branda do que a redação original de 1992. Além da previsão de punição somente para atos dolosos, também podemos perceber que inexistem patamares mínimos às punições. Ex.: Se antes a punição para enriquecimento ilícito era proibição de contratar com o poder público por 10 anos, agora o indivíduo poderá ser proibido por "até" 14 anos (ou seja, menos que isso).
Julgamento
Chegou ao STF uma ação direta de inconstitucionalidade que questionava a exclusividade da legitimidade conferida ao Ministério Público para a proposição de Ação de Improbidade administrativa conferida pelas alterações da Lei 14.230/21.
O STF declarou que, de fato, essa exclusividade é inconstitucional, pelos seguintes motivos:
OFENSA AOS PRINCÍPIOS (L.I.M.P.E)
A Constituição consagrou, como princípios da Administração Pública, o respeito à legalidade, impessoalidade e moralidade (CF/1988, art. 37, caput), além do combate à corrupção e à improbidade administrativa. A restrição da legitimidade ativa do ente lesado na proposição de ação de improbidade vai na contramão desse princípio.
LEGITIMIDADE ORDINÁRIA E EXTRAORDINÁRIA
A legitimidade do MP é extraordinária, pois assume a titularidade dessa ação em nome de terceiros, em razão de sua função institucional de fiscal da lei e da ordem jurídica (custus legis).
Por outro lado, o ente lesado pelo ato ímprobo é legitimado ordinário, pois é ele quem sofre com o dano gerado por quem lesou seu patrimônio. Dessa forma, não tem como impedir que o lesado ordinário, o maior interessado na ação, que ingresse em juízo para recuperar seu prejuízo.